A expansão das plantações de dendezeiros como política de Estado na América Central

Aspectos históricos, ambientais, trabalhistas e econômicos estão presentes no fenômeno da expansão das plantações de monoculturas de dendê na América Central. Estratégias de produção terceirizada, isenções fiscais, apoio a acordos de livre comércio, concentração de subsídios estatais e estratégias de responsabilidade corporativa são comuns nas empresas de dendê. Há até coincidência entre programas experimentais e planos-piloto, como foi o caso dos anos 50 e 60, no Vale do Aguán, em Honduras, e do Oceano Pacífico, na Costa Rica.

Na América Central, as áreas de dendezeiros registradas oficialmente ultrapassam os 370.000 hectares, e esse número está aumentando devido a uma expansão agressiva, fruto da demanda por óleo de dendê no mundo: 51% do óleo vegetal consumido no mundo são provenientes do dendê. As exportações da América Central, especificamente, são destinadas ao México, aos Estados Unidos e à União Europeia (1).

O óleo de dendê talvez seja uma das indústrias de mais rápido crescimento, ao mesmo tempo em que é integrada regionalmente como agronegócio. Mas talvez seja o cultivo menos estudado em seus impactos sociais e ambientais, ainda imensuráveis.

Na Guatemala, existem 130.000 hectares de plantações de dendezeiros. Nos departamentos onde existem monoculturas, há relatos de deslocamento de comunidades e povos indígenas (2). É o caso do Sul de Petén, Izabal, Alta Verapaz, Quiché, Q'eqchi, Escuintla, Suchitepéquez, Quetzaltenengo, San Marcos e Retalhuleu – em sua maioria, comunidades rurais e de pesca. Cerca de 4% da área total de terras agrícolas são ocupados por essa monocultura.

Em Honduras, a monocultura do dendê é uma das mais importantes causas de desmatamento e perda de territórios por parte das comunidades garífunas e misquitas. Honduras tem um agronegócio agressivo, ligado a poderes políticos, militares e do narcotráfico. Oficialmente, são 165.000 hectares, mas esse número é pouco documentado e está se expandindo graças a políticas e incentivos governamentais.

A concentração aparente em Honduras não é tão acentuada, pois a produção de dendê não é uma atividade exclusiva de grandes produtores e empresas transnacionais: 16 mil dos 18 mil produtores são pequenos (50 dos 165 mil hectares). Observe-se que o número de hectares registrados com o cultivo de dendê no país é informado pelas próprias empresas, de forma que é considerado subestimado. Principalmente depois do Golpe de Estado de 2009, quando a expansão do dendê, a militarização e a violência contra os camponeses vêm se consolidando de forma mais agressiva. Essa situação ficou especialmente clara no Vale do Aguán, em função do grande número de assassinatos e desaparecimentos dentro das plantações. No centro dessa controvérsia relacionada aos crimes está a DINANT, empresa de propriedade da família Facussé e maior produtora de óleo de dendê do país (3).

Por sua vez, o censo agrícola de 2014 da Costa Rica relata 66.419,7 hectares semeados com dendezeiros, distribuídos em 2.169 fazendas, e 67% dessa área estão em apenas 8,6% das propriedades. Essa produção está ligada principalmente à indústria de alimentos e cosméticos, embora o governo tenha feito tentativas para incentivar a produção de óleo de dendê para biodiesel. Segundo dados da Câmara Nacional de Produtores de Palma (CANAPALMA), 50% da área plantada com dendê na Costa Rica são de propriedade de 3% dos produtores.

A introdução do óleo de dendê de forma intensiva na Costa Rica aconteceu na década de 1980, embora haja relatos de experimentação desde os anos 50. O esgotamento dos solos e a contaminação com metais pesados causada pelo uso excessivo de fungicidas à base de sulfato de cobre em plantações de banana fez com que milhares de hectares de terras se tornassem tóxicos para as musáceas (família das bananas) e outros cultivos intolerantes à presença desses elementos no solo.

Isso causou um declínio na produção de banana na região. Portanto, a United Fruit Company (principal operação transacional agroexportadora da época) migrou suas plantações e infraestruturas relacionadas à indústria da banana para o plantio de dendê, de forma agressiva, desde o Pacífico Sul até o Caribe. Essa mudança foi gerada não apenas porque o Caribe oferecia melhores condições de umidade, que beneficiam o cultivo de dendê, mas também porque esse cultivo tolera altos teores de metais pesados no solo, como o cobre.

Em 1973, a United Fruit Company tinha cerca de 11.000 trabalhadores contratados na indústria bananeira da Zona Sul. Após a migração para o dendê, ela empregava 4.000 trabalhadores agrícolas no final dos anos 80. Enquanto as plantações de banana empregavam, em média, um trabalhador por hectare, esse mesmo trabalhador dá conta de dez hectares de dendê. Isso pode explicar o desemprego gerado desde a década de 80 em grande parte do Pacífico Sul costarriquenho, como resultado dessa mudança produtiva.

Para alguns autores, a transacional United Fruit Company/United Brands proporcionou aos pequenos produtores locais uma alternativa produtiva, crédito e tecnologia de ponta. No entanto, ela também controlava a entrada aos segmentos mais rentáveis da cadeia de produção do óleo, através de material genético, industrialização, transporte e comercialização. O estado teve um papel central na configuração das relações de poder por meio de sua participação na construção de infraestrutura de processamento do óleo, deixando nas mãos da transnacional a parte mais lucrativa do negócio (comercialização), que depois assumiria o nome de Chiquita Brands.

É no fomento ao setor cooperativo que as instituições do Estado têm maior influência quando se fala de dendê na Costa Rica. Com um primeiro empréstimo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), de 31 milhões de dólares, outro da instituição financeira para o desenvolvimento do governo do Reino Unido (CDC, na sigla em inglês), de 13 milhões de dólares, e uma contribuição de 4 milhões por parte do Estado, inicia-se a operação de uma Unidade Executora do Projeto de Desenvolvimento Agroindustrial de Coto Sur. Essa unidade incentiva não só o plantio de dendê por pequenos e médios produtores, mas também a construção de uma planta de processamento para extrair óleo.

Atualmente, a Cooperativa de Pequenos Produtores de Palma (COOPEAGROPAL) deve mais de 1,5 bilhão de colones (aproximadamente 2,72 milhões de dólares) ao governo da Costa Rica, em função de um empréstimo do Banco Nacional, contraído para instalar uma planta de extração de óleo. Isso é excepcional, pois a Costa Rica optou pelo desfinanciamento da pequena agricultura para apostar no investimento agroindustrial público-privado. Assim se começa uma indústria marcada por desigualdades e interesses econômicos muito fortes.

A Palma Tica S.A. controla o processamento e a comercialização de 80% do óleo cru e se estima que a empresa tenha 40% do número total de hectares semeados com dendê no país, ou cerca de 24.800 hectares. A isso se devem somar em torno de 19.200 hectares que pertencem a produtores independentes financiados por crédito hipotecário da Palma Tica, que reivindica a totalidade da produção por 14 anos como parte do pagamento. Por outro lado, a COOPEAGROPAL maneja os restantes 31% da área plantada e vende cerca de 20% da produção.

A Palma Tica S.A. é uma das quatro maiores empresas do Grupo Numar, transnacional que opera na América Central e no Panamá, especializando-se na produção, na distribuição e na comercialização de alimentos processados. Em 1995, a transnacional Chiquita Brands vendeu o Grupo Numar por 100 milhões de dólares, a oito empresas da Costa Rica, uma do Panamá e outra de Belize. Posteriormente, em 2013, a Chiquita Brands comprou essa empresa novamente.

Através de sua subsidiária Agricultural Services and Development (ASD), o Grupo Numar controla toda a oferta de germoplasma, tanto para produtores independentes quanto para a Palma Tica S.A. e a COOPEAGROPAL. De acordo com a mesma empresa, a ASD exportou mais de 300 milhões de sementes a praticamente todos os países produtores de dendê no mundo. Na América Latina, cerca de 65% da área plantada com a monocultura do dendê foram desenvolvidos com variedades da ASD. No mundo, as plantações comerciais que usaram suas variedades representam mais de 11% da área total plantada, demonstrando a influência regional e global da transnacional na expansão dessa monocultura.

Atualmente, tanto Costa Rica quanto Guatemala e Honduras têm políticas de “biocombustíveis”, ou melhor, agroenergia, que intensificaram e estimularam a expansão do dendê. Um exemplo disso são as declarações da Federação Nacional de Palmeros de Honduras (Fenapalmah) que afirmaram que, em setembro de 2015, sete em cada dez plantas de extração de óleo estavam produzindo energia de biomassa.

A região da América Central como um todo sofre uma série de processos de suposta integração econômica e financeira: sistemas de interconexão elétrica, acordos regionais de livre comércio, políticas aduaneiras conjuntas e projetos de infraestrutura são alguns de seus eixos. Nesse sentido, a produção de óleo de dendê não pode ser vista apenas como um projeto regional, e sim como uma corrida de “integração econômica” ancorada na produção de bens para exportação. Os povos e as comunidades expulsos dos territórios ocupados por essa expansão são os mais afetados.

Os processos de expansão da monocultura em nível regional são orquestrados independentemente de fronteiras ou governos. Para compreender esse fenômeno em nível regional, é necessário vê-lo em seu conjunto e tratá-lo como um grande projeto empresarial fora das proporções nacionais de cada um dos países da América Central.

Henry Picado, agrobici@gmail.com
Red de Coordinación en Biodiversidad, http://redbiodiversidadcr.codigosur.net/

(1) Mapa “Monocultivo de Palma Aceitera en América Latina”, Otros Mundos AC, GeoComunes http://wrm.org.uy/es/files/2016/10/Mapa-Palma-Otros-Mundos-y-Geocomunes.jpeg
(2) Guatemala: la palma africana promueve un nuevo desplazamiento de comunidades rurales – http://wrm.org.uy/es/articulos-del-boletin-wrm/seccion2/guatemala-la-palma-africana-promueve-un-nuevo-desplazamiento-de-comunidades-rurales/
Guatemala: Isla Chicales – tierras estatales deben ser manejadas por las comunidades – http://wrm.org.uy/es/articulos-del-boletin-wrm/seccion1/guatemala-isla-chicales-tierras-estatales-deben-ser-manejadas-por-las-comunidades/
(3) Bajo Aguán: Grito por la Tierra – http://wrm.org.uy/es/videos/bajo-aguan-grito-por-la-tierra/
Honduras: mujeres en lucha por la tierra en un marco de violencia y asesinatos – http://wrm.org.uy/es/articulos-del-boletin-wrm/seccion1/honduras-mujeres-en-lucha-por-la-tierra-en-un-marco-de-violencia-y-asesinatos/