Equador: o governo enfrenta um desafio no Parque Nacional Yasuni

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Há dois dias, quando o presidente Rafael Correa afirmou que os ambientalistas queríamos voltar à época das cavernas ao pretendermos uma moratória petroleira, não fazia mais que repetir o que, durante anos, têm dito aqueles que moldaram e ainda mantêm o país dependente que temos… O problema foi que desta vez a declaração foi feita enquanto a imprensa internacional dava um grito de alerta pelo aquecimento global… se queimarmos mais petróleo, acabaremos nas cavernas!!

Além de ser um comentário tipicamente desenvolvimentista, convida a lembrar o mito da caverna de Platão.

Conforme o mito, os seres humanos vivemos encadeados dentro de uma caverna, sentados de costas para a entrada pela qual entra a luz. As sombras representam a única realidade que vemos. Não percebemos as cadeias e também não queremos nem podemos agir contra nossas percepções.

Mas Platão diz que alguém, alguma vez, se conscientiza de estar encadeado, se liberta, vira e sai da caverna. A luz é tão forte que se sente ofuscado e somente aos poucos se acostuma e pode ver as coisas verdadeiras…

O projeto Ishinpingo-Tiputini-Tambococha (ITT), como sombra agigantada no meio da escuridão, é anunciado com o mesmo entusiasmo que outros grandes projetos malsucedidos. Falam de 4.000 empregos, um investimento de 5 bilhões de dólares, a oportunidade para sair da pobreza… mas se alguém repara nos impactos ambientais, a resposta é que “serão minimizados”.

Por que é um projeto que provoca rebuliço?

O projeto ITT está localizado no Parque Nacional Yasuni. Conforme estudos científicos, o Parque Yasuni (criado em 1979) é a região de maior diversidade biológica do mundo. Faz parte do refúgio do Pleistoceno Napo. E também é território do povo Huaorani e zona de tránsito, pesca e caça dos Taromenane e Tagaeri, povos que vivem em isolamento voluntário e que para viver necessitam seu território livre de intervenções externas.

Trata-se de um projeto que confronta duas visões do mundo, duas realidades. Desde a sombra projeta imagens de crescimento. Mas à luz da experiência petroleira equatoriana, será um novo desastre ambiental e social para as comunidades locais.

Com reservas provadas de quase 1 bilhão de barris de cru pesado, o governo pretende manter os ritmos de exploração e exportação de cru. Por um lado, está interessado um consórcio formado pela Petrobrás (Brasil), Enap (Chile), Petroecuador e Pdvsa (Venezuela), que pretende consolidar na prática uma aliança em função de propostas de integração, independentemente do custo acima de tudo ambiental. Por outro, está interessada a empresa SINOPEC, de origem chinesa, que pretende ter uma presença cada vez maior na região, e apresenta ofertas econômicas altas à custa de sua total ignorância em assuntos ambientais.

Mas é impossível ignorar que o projeto está dentro do Parque Nacional- uma zona de alta sensibilidade ambiental- e que é sabido que provocará níveis de poluição maiores dos já existentes nas zonas já intervindas, por tratar-se de cru pesado e estar associado a grandes quantias de águas tóxicas, em uma relação de 80-20 (80 de águas tóxicas por 20 de cru).

O projeto provocará sem dúvidas uma deterioração geral da zona, graves impactos sobre a vida dos povos locais, extinção de culturas.

Diante deste cenário, apresentou-se a proposta de analisar a possibilidade de pôr à venda o cru do subsolo com o intuito de nunca vir a ser extraído. Disseram que o custo de cada barril no subsolo seria de uns 5 dólares. Ouvi muitas pessoas dizerem que gostariam de ter 20 barris, ou 10 ou 1 e saber que nunca serão extraídos…

Considera-se que assim é possível cumprir o triplo objetivo de conservar a biodiversidade, enfrentar o aquecimento global e proteger os direitos dos povos em isolamento voluntário.

O presidente Rafael Correa, em um tom quase desafiador, encomendou ao Ministro da Energia, Alberto Acosta e à Ministra das Relações Exteriores, Maria Fernanda Espinosa
“substituir os recursos que o país deixará de receber e que poderiam ser investidos em programas de saúde, educação e infra- estrutura”. E salientou, “Se tal substituição ocorrer, não haverá licitação”.

O Equador subscreveu convênios internacionais tais como o de proteção da biodiversidade e a Convenção- Quadro da Mundança Climática; o Convênio 169 da OIT; o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; a Declaração Universal de Direitos Humanos; a Convenção Americana sobre os Direitos e Deveres do Homem; a Convenção para a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio, que protegem os povos e seus territórios e que propõem a salvaguarda do planeta.

Os argumentos em favor do mecanismo de vender o petróleo para que não seja extraído existem; porém, haverá vontade política não apenas nacional como também internacional para enfrentar o assunto?

Será um projeto tratado à sombra de um Equador encadeado ou pelo contrário será tratado à luz de uma nova visão de país na qual o ambiente não seja um requisito a ser superado, e sim o alicerce para a subsistência da nação?

Por Esperanza Martínez, correio electrônico: tegantai@oilwatch.org.ec, Oilwatch, www.oilwatch.org.ec