O assunto do projeto de crédito de carbono para a RESEX Tapajós Arapiuns surgiu pela primeira vez em julho de 2014 em reunião do Conselho Deliberativo da Unidade de Conservação, e posteriormente o tema voltou a ser abordado em reuniões deste Conselho. Apesar disso, uma boa parte da população da RESEX só começou a se inteirar desta discussão no início de 2015, a partir da preocupação que alguns conselheiros demonstraram quanto à falta de entendimento e complexidade do tema, solicitando mais esclarecimentos, conforme consta em ata de reunião do conselho realizada na Comunidade Vila Franca. A informação que se tinha na época era que o ICMBio tinha a intenção de desenvolver um projeto piloto denominado “Carbono Florestal” nesta RESEX.
Por este motivo, a comunidade Surucuá realizou uma oficina no 28 de março de 2015 para entender sobre metodologias de projetos de REDD. A oficina foi organizada pelas lideranças da comunidade que estavam preocupados em entender a questão. Participaram também comunitários de Pajurá, Paricatuba, Vila de Amorim, Muratuba, Aldeia São Pedro, Retiro e Mangal. Como palestrantes, participaram integrantes de movimentos sociais vindos da cidade de Santarém, para auxiliar na discussão. Nesse encontro, os comunitários apontaram algumas necessidades e demandas para ampliação desta discussão entre os demais moradores da RESEX, entre elas solicitar a realização de outras oficinas com o mesmo conteúdo em outras comunidades, solicitar a participação e o envolvimento da diretoria da Organização das associações da reserva extrativista Tapajós-Arapiuns (TAPAJOARA) nestes encontros e montar estratégias para garantir a participação dos moradores da Resex em processo transparente de consultas públicas.
Depois disso, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (STTR) de Santarém realizou no 08 de junho de 2015 uma oficina com as principais lideranças da RESEX para esclarecimentos. A oficina foi mediada pela Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional - FASE Amazônia - e a Professora Marcela Vecchione, do grupo “Carta de Belém”, com apoio da Organização de Direitos Humanos – Terra de Direitos. Na oportunidade foram esclarecidas as principais duvidas que pairavam sobre as populações habitantes da RESEX. No mesmo encontro, o representante da comunidade indígena Aningalzinho apresentou ao Presidente do STTR de Santarém um abaixo assinado em que a comunidade não concorda com o projeto de carbono florestal para a RESEX.
A partir daí foi criado um grupo alternativo de discussões para contrapor a proposta. O grupo foi formado por representantes do STTR-Santarém, Terra de Direitos, FASE, Pastorais Sociais, Comissão Pastoral da Terra (CPT), TAPAJOARA, Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), Centro de Apoio a Projetos de Ação Comunitária (CEAPAC) e Lideranças da RESEX. Paralelo a isso, o movimento indígena também discutia o assunto sobre a mesma ótica e com grande preocupação, pois neste momento já haviam recebido algumas notícias e alertas sobre outros projetos já implantados em terras indígenas que apresentaram alguns desafios com relação à autonomia destes povos.
No 04 de agosto de 2015 o ICMBio realizou uma reunião em que chamou todas as organizações do grupo, as organizações com atuação na RESEX, e o Ministério Público Federal (MPF). Na ocasião foi sugerido pelo MPF que se fizesse um recomeço das discussões com intensa participação dos moradores da RESEX e todos concordaram. Na reunião apontou-se a necessidade de que o projeto cumprisse todos os protocolos internacionais previstos, que devem respeitar os direitos constitucionais, estatutários e consuetudinários associados à propriedade de terras, a designação oficial em terras ocupadas, a representação de comunidades locais e uso de recursos naturais de povos indígenas e pequenos proprietários, além do cumprimento pleno da Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas da Organização das Nações Unidas e da Convenção nº. 169 da Organização Internacional do Trabalho.
No dia 11 do mesmo mês (agosto) foi realizado uma reunião na sede do STTR em Santarém, coordenada pelo ICMBio e a empresa responsável pela elaboração do projeto, a Biofilica, uma empresa brasileira, que segundo seu site na internet é “focada na comercialização dos serviços ambientais”. A estratégia foi convencer os presentes da necessidade da implantação do projeto para viabilização financeira da implementação de programas e subprogramas do Plano de Manejo da RESEX.
No dia 13 de agosto o movimento indígena ocupou a sede do ICMBio em Santarém com várias reinvindicações, a principal delas era o cancelamento do projeto de carbono. Como resultado imediato deste movimento e depois de muitas negociações, o ICMBio Nacional suspendeu temporariamente as discussões, até que esclarecimentos fossem feitos. Atualmente, os movimentos continuam mobilizados e discordando da implantação do projeto, por acreditarem que projetos desse tipo não apontam caminhos para a efetiva solução da crise ambiental mundial e ainda podem ferir a autonomia e segurança territorial das comunidades tradicionais que habitam e coexistem de maneira harmoniosa nos locais mais preservados do planeta, e que apontam outra forma de desenvolvimento humano possível, fora da ótica mercadológica e financeira.
Guillermo Antonio Cardona Grisales, gcardonasj.mao@gmail.com
Angelo Ricardo Sousa Chaves, achaves.natural@gmail.com