Gênero no Patriarcado Fóssil: novo padrão de carbono das mulheres diz “empoderá-las”

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A WOCAN lançou o Women’s Carbon Standard, ou Padrão de Carvão para as Mulheres, promovendo “lavagem de gênero” em um mecanismo que desde o início foi uma falsa solução, e que prejudica os direitos das mulheres, aumenta sua exposição aos impactos das alterações climáticas e agrava a injustiça.

Outro padrão foi lançado em um mercado morto que, desde o início, foi uma falsa solução. Indústrias poluentes e consultorias foram as principais beneficiárias desse mercado de carbono, e sua existência promoveu a ilusão de que a mudança climática poderia ser interrompida compensando-se as emissões ou as mudando de lugar, em vez de reduzi-las. Em 24 de abril de 2013, a Women Organizing for Change in Agriculture & Natural Resource Management (WOCAN) lançou o Padrão de Carvão para as Mulheres. Com patrocínio de até “alguns milhões de dólares” do Banco Asiático de Desenvolvimento (ADB), a diretora da WOCAN, Jeannette Gurung, descreve o padrão como “um selo de certificação único, que cria uma referência para apoiar projetos de compensação de carbono ou energias renováveis que promovam o empoderamento das mulheres e o desenvolvimento sustentável”. A partir da informação disponível sobre o padrão, não fica claro quanto desses “alguns milhões de dólares” chegou aos grupos de mulheres e quanto foi para as mãos de consultores. De acordo com as informações disponíveis, o padrão certificaria os benefícios da crescente participação de mulheres na compensação de carbono e no desenvolvimento de projetos de energia renovável, e apoiaria projetos que criassem maiores benefícios econômicos diretos ou indiretos para mulheres.

No entanto, surge a pergunta: como esse padrão poderia fazer mais do que levar a cabo uma “lavagem de gênero” em um mecanismo que, por seu perfil, prejudica os direitos das mulheres, aumenta a exposição delas aos impactos das alterações climáticas e agrava a injustiça, ao permitir que aqueles que historicamente têm emitido mais gases do efeito estufa e, portanto, são os principais responsáveis pela mudança climática, emitam ainda mais? Onde está o empoderamento para as mulheres que vivem em comunidades rurais no Sul global, a quem se pede que reduzam suas parcas emissões da queima de lenha para cozinhar, de modo que compradores ricos e esbanjadores nos mercados de carbono empresariais e voluntários possam, com a consciência limpa, continuar expelindo enormes emissões?

As causas subjacentes da perda de poder por parte de mulheres rurais que permanecem presas à pobreza estrutural continuam sem ser questionadas e a ligação entre o mercado de carbono e o desenvolvimento que passa ao largo delas, mas pelo qual pagam o preço de vidas pobres, permanece sem solução segundo esse padrão. O padrão de carbono para as mulheres também não fará coisa alguma para enfrentar os impactos nocivos da grande maioria dos projetos de compensação de carbono sobre a vida dessas mulheres, pois só será aplicável aos “projetos adequados ao mecanismo” – o que significa os poucos projetos de pequeno porte que, por exemplo, vendem fogões a famílias empobrecidas ou apoiam a instalação de biodigestores. É altamente discutível se um padrão de certificação voluntária pode não apenas resolver os problemas que surgiram, mesmo com esses projetos supostamente benéficos (ver a publicação de Mausam, 2010, com estudos de caso sobre a Índia), mas também transformar esses projetos em “empoderamento das mulheres”. E mesmo que isso realmente proporcionasse alguma receita adicional a um seleto número de mulheres com acesso ao projeto, a que custo viria esse dinheiro?

A declaração lançada em resposta ao padrão diz: “Nós [...] rejeitamos o Padrão de Carbono para as Mulheres”, “projetos de compensação de carbono que tenham sérias implicações de gênero”, “metodologias para mulheres e crianças” e a promoção e a certificação de projetos de comércio e compensação de carbono de qualquer espécie, que se apresentem na forma de empoderamento e liderança das mulheres, ou o bem-estar de nossas famílias e de nossos filhos. O comércio de carbono viola nosso direito à vida ao vender licenças para que os poluidores poluam e ao piorar a mudança climática. Projetos de compensação de carbono resultaram em concentração de terras, abusos dos direitos humanos, violação dos direitos de mulheres, crianças e povos indígenas, desalojamento forçado, guardas armados, prisões, perseguição e criminalização de ativistas. Defendemos a vida e os direitos humanos, e exigimos justiça climática imediatamente!”

Em 2011, a Gender CC-Women for Climate Justice, uma rede global de mulheres, ativistas de gênero e especialistas de todas as regiões do mundo, que trabalham por justiça de gênero e climática, emitiu uma declaração em resposta aos esforços da ONU para incluir florestas no mercado de carbono por meio do REDD. Sobre a questão de gênero e os mercados de carbono, a Gender CC diz que: “Por mais importante que seja integrar o tema de gênero aos mercados de carbono e REDD+, estes ainda são falsas soluções que podem levar a uma disputa venenosa por recursos e gerar perigo, desalojamento e enfraquecimento”. Temos que nos perguntar se é possível alcançar políticas de gênero significativamente plurais (gender mainstreaming) e empoderamento das mulheres no contexto de um mecanismo que, por natureza, aumenta o risco de mudança climática descontrolada, com impactos que afetarão particularmente as mulheres.

A declaração “Carbon Trading, CDM and REDD: New Forms of Violence against Women NOT Women’s Empowerment!” , organisada pela No REDD+ / Global Alliance of Indigenous Peoples and Local Communities on Climate Change against REDD and for Life está disponível em http://wrm.org.uy/temas/REDD/noredd-esp.pdf(espanhol) e
http://wrm.org.uy/subjects/REDD/noredd-english.pdf (inglês) para assinar.

Artigo baseado em:
WOCAN Women’s Carbon Standard: Leveraging Carbon Finance for Women’s Empowermenthttp://wocan.org/sites/drupal.wocan.org/files/WOCAN%20Women's%20Carbon%20-1.pdf ehttp://www.womenscarbon.org/sites/default/files/womens-carbon-standard.pdf; “Still A Frozen Pie: GenderCC - Women for Climate Justice on the Bangkok Intersessional Meeting 2011,” nota à imprensa da GenderCC, 7 de abril de 2011, http://www.gendercc.net/network/gendercc-news/news-details/browse/1/article/still-a-frozen-pie-gendercc-on-the-bangkok-intersessional-meeting-2011/169.html?no_cache=1