Luta e resistência das comunidades de mangue na América Latina

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Em junho de 2013, em Monterrico, Guatemala, delegados de Brasil, Cuba, México, El Salvador, Honduras, Peru, Venezuela e Guatemala celebraram a VI Reunião do Conselho Diretor da Redmanglar Internacional para a Defesa dos Territórios Marinhos Costeiros e da Vida Comunitária.

Como resultado da reunião, a “Declaração de Monterrico” faz uma avaliação dos países da região, apontando a dominação que sobre elas exerce “um modelo de capitalismo extrativista e voraz, sustentado com a cumplicidade dos governos que ajustam os marcos jurídicos nacionais e o internacional. Através de suas instituições e sua infraestrutura, esses governos também incentivam a privatização e a concentração do território e dos ecossistemas costeiros para facilitar o empreendimento de grandes investimentos na extração de minerais, energia eólica, hidrelétrica e matérias primas necessárias para alimentar um sistema altamente consumista”.

O coletivo se pronunciou contra “todas as práticas que, disfarçadas de ecológicas, estão acompanhando financeiramente este modelo, como a certificação da criação de camarões, o programa REDD+ e o mercado de “créditos de carbono”, já que eles “prejudicam os direitos dos povos ancestrais do mangue, que foram espoliados e desalojados de seus territórios e meios de vida, pondo em risco sua sobrevivência”.

A declaração também denuncia que a concessão de áreas de pesca tradicional à aquicultura industrial, a impunidade com que a pesca de arrastão opera na maioria dos países, sobre-explorando os pesqueiros, e o dano ambiental que os grandes monocultivos de cana de açúcar e dendê estão provocando nas bacias costeiras constituem “um claro processo de genocídio ambiental dos pequenos pescadores artesanais em todo o continente”.

Panorama da região

Os representantes das comunidades costeiras ofereceram uma perspectiva da situação atual de seus manguezais:

GUATEMALA

A Coordenadora Guatemalteca pela Defesa dos Manguezais e da Vida denuncia os casos de destruição do mangue da zona costeira da Guatemala – muitos dos quais acontecem diante da vista das autoridades governamentais – bem como a concentração dos territórios e meios de vida das comunidades costeiras, e saúda os processos de defesa local nas comunidades de Santa Odilia, Isla Chicales, San Antonio Los Encuentros, Tulate, Iztapa e Champerico.

CUBA

A delegação destaca que foi possível estudar os perigos, as vulnerabilidades e os riscos que afetam a zona costeira e fazer a avaliação dos efeitos da elevação do nível do mar nesses ambientes. Os resultados são utilizados para melhorar os processos de ordenamento territorial da zona costeira.

MÉXICO

A partir do governo, promovem-se grandes projetos e concessões para a mineração, a indústria petroleira, os monocultivos, os parques eólicos, as represas hidrelétricas e o turismo em massa, os quais ameaçam os ecossistemas costeiros e o território dos povos originais.

O representante no encontro afirmou: “Estamos convencidos de que, diante dos efeitos da mudança climática e sua importância para a soberania alimentar de nossos povos, o mangue deve ser elevado à categoria de ecossistema prioritário para conservação. Nós nos manifestamos contra as reformas da lei agrária que tentam facilitar a privatização e a desaparição da propriedade social através do domínio pleno das terras”.

EL SALVADOR

A busca do lucro por parte de grandes empresas nacionais e transnacionais invadiu e saqueou os territórios, como é o caso da Baía de Jiquilisco, Usulután, na qual estão sendo concentradas terras e se desenvolvem projetos de infraestrutura para abrir caminho ao investimento em megaturismo, impulsionado por mecanismos como a Corporación Cuenta del Milenio, fundo doado pelos Estados Unidos (conhecida em El Salvador como FOMILENIO).

HONDURAS

Os delegados de Honduras denunciaram a sobre-exploração, o avanço de monocultivos como a cana de açúcar e a criação de camarões como algumas das causas da destruição acelerada do Golfo de Fonseca e todos os seus recursos.

Também reivindicaram uma revisão da nova lei de mineração, que ameaça destruir milhares de hectares de áreas naturais protegidas e a vida dos povos que as habitam, e exigiram retirar da agenda legislativa a proposta da indústria do camarão, que lhe permite transferir, hipotecar e vender as concessões.

PERU

As organizações integrantes do CONDEM-Peru demandaram, entre outras coisas, que se interrompa a expansão das indústrias do camarão e do petróleo, em função de seus impactos sobre os manguezais.

As famílias vinculadas a atividades extrativistas nos manguezais estão comprometidas com sua defesa, porque ela garante a segurança alimentar dessas pessoas. Por isso, exigem mais espaço para participar das decisões e a aprovação do consentimento prévio, livre e informado das comunidades antes de prosseguir com um projeto. Também reivindicam que as concessões e as propriedades abandonadas possam ser transferidas aos pescadores artesanais, com vistas a uma produção responsável que contribua com suas necessidades econômicas.

VENEZUELA

A delegação da Venezuela disse que a atividade petroleira em zonas marinhas costeiras, a ampliação portuária, os empreendimentos turísticos, os monocultivos e a concentração de terras provocam graves impactos nos ecossistemas de mangue. Tudo isso é reflexo de um modelo de desenvolvimento equivocado, que expulsa as comunidades de pescadores artesanais e privatiza o patrimônio natural dos povos.

Os delegados presentes também exortaram a Assembleia Nacional a analisar uma Lei para a Proteção do Ecossistema de Mangue.

BRASIL

Os pescadores e pescadoras tradicionais têm compreendido historicamente a importância do ecossistema de mangue para o equilíbrio das espécies e o fortalecimento de sua identidade ancestral. Para eles e para elas, a atividade pesqueira é mais do que uma profissão, é um elemento de suas vidas pessoais, que contribui para garantir a soberania alimentar do povo brasileiro, fazendo dele o guardião de uma tradição milenar.

Nessa condição, assumiram uma luta frontal contra o atual modelo de desenvolvimento baseado em políticas de privatização dos cursos d’água, através da lei de concessões de água para a implementação da aquicultura em grande escala, flexibilização das mudanças jurídicas para o fortalecimento dessa atividade e ampliação de diversos projetos de mineração, hidrelétricas, represas, turismo de massas, termoelétricas, parques eólicos, indústrias de petróleo, estaleiros e portos navais.

A Redmanglar Internacional dá seu apoio à luta dos pescadores e pescadoras brasileiros e solicita das autoridades competentes que aprovem o projeto proposto por eles de Lei de Regularização dos Territórios Pesqueiros, para salvaguardar e proteger seus territórios ancestrais para esta e as próximas gerações.

A organização declarou, por fim, a necessidade de realizar a unidade e a aliança com todas as forças, movimentos progressistas, forças revolucionárias, entidades e instituições que apoiam as lutas pela proteção e recuperação dos mangues e dos direitos das comunidades ancestrais que dependem deles – símbolo de vida e não simples mercadoria.

Por ocasião do 26 de julho, Dia Internacional pela Defesa do Ecossistema Mangue, sob o lema “Mangue, soberania alimentar dos povos costeiros”, convocam-se as organizações de base dos países membros da Redmanglar Internacional e os não membros: Lutar, lutar e resistir, resistir.

Com base em material enviado pela Redmanglar. Para ver a declaração completa de Monterrico e a nota de imprensa pelo Dia Internacional do Mangue, visite http://www.redmanglar.org