Este último boletim do Movimento Mundial pelas Florestas em 2014 trata de uma questão que, de algum modo, está presente em todas as lutas locais e nas questões relacionadas, sobre as quais este boletim informa todos os meses. Embora não seja especificamente sobre uma questão relacionada a florestas ou à plantação de árvores, trata de algo que envolve as comunidades que dependem da floresta e à qual nos parece muito importante dedicar um boletim do WRM: o complexo debate sobre alternativas.
Muitos de nós estão envolvidos em lutas contra projetos que destroem as florestas, todos já passamos muitas vezes por uma situação em que uma empresa ou um representante de governo nos questiona quando nos opomos a um determinado projeto, exigindo saber “qual é a nossa alternativa”. Dessa forma, neste boletim, tentamos abordar esta pergunta um pouco intimidante a partir de ângulos diferentes, a fim não só de mostrar sua complexidade, mas também de oferecer algumas ideias sobre como lidar com essa pergunta e com o debate das “alternativas” em geral, em nossa prática diária.
Como Larry Lohmann mostra em seu artigo, quando finalmente tentamos responder à demanda que nos é colocada para que apresentemos uma “alternativa”, muitas vezes também somos obrigados a formular nossa alternativa dentro da lógica do modelo de produção hegemônico. Como sabemos, esse modelo existe para atender a um nível muito elevado de consumo material por parte de uma minoria no mundo que costuma viver longe de onde a maior parte do dano será causado. Larry sugere que, antes de qualquer coisa, deveríamos questionar a demanda que nos é feita, por exemplo, contrapondo perguntas como “alternativa para quem” e “à custa de quem”.
Também devemos dar continuidade a nossos esforços para desvendar, refletir e responder à linguagem usada e imposta a nós por aqueles que mais pressionam pelos grandes projetos que destroem florestas – e que mais se beneficiam deles. Durante décadas, empresas, consultores, autoridades, a grande mídia, etc. têm afirmado ter as “alternativas”, as “soluções” para as diversas crises que as nossas sociedades enfrentam. Cerca de 20 anos atrás, eles falavam sobre “desenvolvimento sustentável” como uma “alternativa” ao modelo dominante de desenvolvimento. Nos últimos anos, como os problemas persistiram apesar de duas décadas de implementação de políticas e projetos de “desenvolvimento sustentável”, eles começaram a falar da “economia verde” e de “dar preço à natureza”, como sendo as novas “alternativas”. Essas “alternativas” são adotadas e promovidas por órgãos da ONU, por quase todos os governos e todas as corporações transnacionais, ao passo que, na prática, nada muda em termos estruturais. Sendo assim, parece que pensar e propor “alternativas” se tornou, mais do que qualquer outra coisa, simplesmente parte de um mesmo modelo ao qual se devem apresentar “alternativas”.
Mas será que existe alternativa para o debate/demanda por “alternativas”? Uma experiência interessante é contada no artigo de Adolfo Maldonado, do Equador, sobre como lidar com a situação enfrentada por muitos milhares de comunidades, em todo o Sul global, que se encontram diante de uma grande crise, em muitos aspectos, como resultado de anos de atividades destrutivas em suas casas e ao redor delas. No caso do Equador, essas atividades envolvem a indústria do petróleo e as plantações de monoculturas de árvores frutíferas. Durante anos, Adolfo trabalhou com uma comunidade afetada, por meio da chamada “Clínica Ambiental” – uma iniciativa da organização Acción Ecológica, baseada na crença de que, quando a natureza está “doente”, as pessoas também vão ficar “doentes”. Na comunidade envolvida nessa iniciativa, a alternativa às “alternativas” veio a ser chamada de energia alterativa, referindo-se a uma energia capaz de mudar a vida das pessoas da comunidade para melhor.
Na prática, no mundo todo, várias experiências singulares estão ocorrendo em muitos países, bem ao nível local, o qual tem em comum a necessidade diária das pessoas de mudar suas vidas para melhor, apesar de uma situação muitas vezes adversa, em que há um grande projeto destrutivo nas proximidades. Essas experiências são promovidas por pessoas das comunidades, por mulheres e grupos de jovens, por organizações que trabalham com a cultura e por movimentos sociais, para citar apenas alguns exemplos.
Outro exemplo é a história do desafio, em um país tão complexo quanto a Índia, de transformar os diversos esforços voltados a mudar a vida das pessoas da comunidade para melhor em um movimento político mais amplo por mudança social e transformação radical. É impossível, portanto, não tocar nos enormes obstáculos e desafios que surgem quando se trata de procurar alternativas capazes de mudar a vida das pessoas para melhor em um país que é – como a maioria dos nossos países – dominado pelo poder do Estado, por um regime capitalista que beneficia as corporações transnacionais que controlam a economia de mercado. Como é possível a construção de “alternativas” dentro de um modelo único e dominante que continua destruindo formas de vida e culturas?
Assim, os desafios são enormes e, como também tratamos em um dos artigos a seguir, principalmente para as mulheres. O artigo aborda o desafio, que se coloca às feministas do Sul Global, de buscar novas formas de feminismo que melhor reconheçam as realidades da maioria das mulheres afetadas pelo modelo destrutivo já mencionado e que sofrem múltiplas opressões, inclusive a de ser mulher. Enfrentar esse desafio também significa superar a fragmentação das análises que são feitas, bem como a fragmentação de nossas lutas.
Considerando tudo isso, esperamos que este boletim seja uma contribuição pequena, embora importante, para este debate complexo, mas necessário. Convidamos você a expressar seus pontos de vista e suas experiências sobre o tema. E, é claro, esperamos que você goste da leitura!