Heredia, 28 de março de 2009
Nós, organizações da sociedade civil de todos os continentes nos reunimos em Costa Rica entre os dias 24 e 28 de março para compartilhar experiências, visitar comunidades camponesas, refletir e gerar propostas sobre o clima, as florestas e as plantações.
Na primeira parte de nosso encontro, visitamos comunidades camponesas do norte do país e pudemos verificar o impacto da monocultura do abacaxi sobre as comunidades locais, seus territórios, suas fontes de água, sua saúde e os ecossistemas locais e comprovar como as comunidades camponesas continuam protegendo e regenerando suas florestas perante todas as agressões que recebem.
Pudemos verificar às claras a maneira na que a imposição de um modelo agroexportador que se repete com diferentes formas e produtos no mundo inteiro, contribui com o atual desastre climático. Este modelo de exportação de produtos básicos, com suas monoculturas, o uso intensivo de agroquímicos baseados em combustível fóssil e o transporte de produtos através de milhares de quilômetros para o consumo do Norte rico, é uma das principais causas da atual crise climática.
Costa Rica se vende ao mundo como um país “verde” que defende suas florestas e sua biodiversidade. No entanto, temos verificado que essa imagem não reflete a realidade do povo e do ambiente de Costa Rica.
Depois de dois dias de refletirmos sobre as causas que tem levado nossas sociedades a essa situação e sobre as propostas que desde os âmbitos oficiais se estão realizando, queremos compartilhar nossas conclusões, nossos compromissos e nossas propostas para enfrentar a mudança climática.
Nossa primeira conclusão é que a mudança climática é a conseqüência inevitável de um sistema socioeconômico e político que tem transformado a natureza e as pessoas em mercadorias. Apesar de que a mudança climática é uma das ameaças mais sérias que enfrentaremos para o futuro, faz parte de uma cadeia de crises que têm estado acontecendo nos últimos anos.
Em segundo lugar, temos chegado à conclusão de que nenhuma das soluções propostas pelos governos e as Nações Unidas se ocupa realmente das causas da mudança climática.
Temos concluído que o comércio do carbono, o mecanismo conhecido por sua sigla em inglês como REDD, o pagamento por serviços ambientais e todos os mecanismos de mitigação baseados no mercado são instrumentos que não apenas não cumprem o objetivo declarado, mas promovem a mercantilização de toda a vida e portanto a destruição de nosso planeta e o agravamento da mudança climática. Todas essas propostas se transformam em “alvos móveis” que, mudando permanentemente, tentam nos distrair dos verdadeiros problemas.
O mercado global e suas grandes corporações se têm apropriado das negociações sobre Mudança Climática nas Nações Unidas e as têm seqüestrado, transformando-as em um espaço para negócios que de nenhum jeito respondem às necessidades e as medidas que devem tomar-se urgentemente.
O Banco Mundial, que tem sido responsável de financiar a destruição do planeta, agora está encabeçando o assunto do clima, promovendo modelos de mercados fracassados que fazem zombaria das tentativas de enfrentar-se com a crise climática.
As tecnologias que estão sendo desenvolvidas como resposta, tais como os agrocombustíveis, plantas transgênicas, o uso do “biochar” e outras similares, também não são uma resposta real à mudança climática. Por trás de todas essas falsas soluções estão as grandes corporações com a cumplicidade dos governos, que se têm transformado em simples facilitadores dos negócios das mesmas. Ao mesmo tempo, são também os governos os que promovem a repressão e a criminalização das pessoas e organizações que resistem a imposição de plantações, monoculturas e todas essas falsas soluções.
Portanto, nos comprometemos a desenvolver nossa própria agenda, focalizada nas necessidades e lutas de nossos povos, para gerar e contribuir com um movimento social amplo com o objetivo de transformar este sistema de baixo para cima.
Nesse quadro, a defesa do clima, as florestas e outros ecossistemas pelos povos é a única alternativa possível para o futuro que estamos construindo. As mulheres desenvolvem uma função de liderança fundamental no caminho para mudar as relações entre as pessoas e com a natureza que privilegie a cooperação por cima da dominação e o controle.
Rejeitamos as plantações e as monoculturas, porque deslocam comunidades, destroem florestas, poluem o planeta e geram mais mudança climática e esse será um dos pontos principais de nossa agenda para o futuro. Sublinhamos que as plantações não são florestas.
Sobre essa base é que nos propomos:
1- A defesa da terra e territórios contra a qualquer tipo de concentração da terra em poucas mãos. Propomos a realização de uma reforma agrária integral, partindo da integração solidária de mulheres e homens com sua terra e a proteção da água e da biodiversidade que nos sustenta. Opomo-nos totalmente às reformas agrárias baseadas no mercado promovidas pelo Banco Mundial, que somente procuram o deslocamento das comunidades para ocupar seus territórios. Nossa proposta é o estabelecimento de uma relação respeitosa com a terra e sem agressão. Entendemos que defender o território é defender nossa cultura e nosso modo de relacionar-nos entre nós e com a terra.
2- Soberania alimentar, entendida como o direito dos povos a decidir no tocante à produção de alimentos e a agricultura. A soberania alimentar começa com a defesa das sementes nativas e o vínculo com a natureza. Para sermos soberanos precisamos produzir em nível local a maior parte de nossos alimentos para nosso consumo em harmonia com a natureza e desta maneira podemos produzir alimentos para todos de forma diversificada, para evitar as monoculturas enquanto “esfriamos o planeta” e combatemos a mudança climática. Esse é o caminho para atingir povos e ecossistemas saudáveis e em equilíbrio.
3- Oposição aos mecanismos para o clima baseados no mercado. Resistiremos e denunciaremos a falsidade do comércio do carbono, o mecanismo REDD ou todas as propostas similares que possam surgir no futuro. Comprometemo-nos a explicar em todos os âmbitos possíveis as razões pelas que esses mecanismos nunca poderão dar uma resposta à atual crise climática.
Atingiremos esses objetivos através da realização de atividades nas que nos iremos coordenando e apoiando:
- Educação e conscientização através da produção de materiais educativos, audiovisuais e todas aquelas ferramentas que nos permitam ampliar a base de pessoas conscientes da problemática.
- Desenvolvimento de estudos de casos para documentar os impactos da Mudança Climática e suas falsas soluções, junto com as comunidades atingidas e acompanhando essas comunidades em suas lutas contra os impactos.
- Criação de alianças com todos os movimentos sociais que questionam este sistema econômico, incluindo povos indígenas, organizações de mulheres, organismos de direitos humanos, sindicatos, etc.
- Apoio aos movimentos de pessoas atingidas pela mudança climática para ajudar a que sua voz se escute e fortalecer suas estratégias de sobrevivência.
- Trabalho em nível local, nacional e internacional de maneira coordenada e solidária.
Voltamos a nossos países irmanados com o povo de Costa Rica em suas lutas contra os tratados de livre comércio e em defesa da biodiversidade, a água, a produção em harmonia com a natureza e um mundo justo e solidário.
Participantes da Reunião do WRM:
Alejandra Porras (COECOCEIBA) - Costa Rica
Almuth Ernestina (Biofuel Watch) – Reino Unido
Ana Filippini (WRM) - Uruguai
Carlos Salvatierra (Savia) - Guatemala
Carlos Vicente (GRAIN) - Argentina
Chris Lang (REDD Monitor) - Alemanha
Eduardo Aguilar (COECOCEIBA) - Costa Rica
Elizabeth Bravo (Acción Ecológica) - Equador
Elvin Castellón (FEDICAMP)- Nicarágua
Francesco Martone (FPP)- Italia
Ginting Longgena (FoEI) - Indonésia
Grace Garcia (COECOCEIBA) - Costa Rica
Gustavo Castro (Otros Mundos / Amigos de la Tierra) - México
Ines Soares Rodrigues (Via Campesina) - Brasil
Isaac Rojas (COECOCEIBA) - Costa Rica
Javier Baltodano (Amigos de la Tierra Internacional) - Costa Rica
Juan Almendares (Madre Tierra) - Honduras
Juan Figuerola (COECOCEIBA)- Costa Rica
Jutta Kill (FERN) - Alemanha
Lambert Okrah (Institute for Cultural Affaire) - Ghana
Mariana Porras (COECOCEIBA) - Costa Rica
Miguel Marín (FEDICAMP) - Nicaragua
Nicola Bullard (Focus on the Global South) - Filipinas
Oscar Reyes (Transnational Institute) - Países Baixos
Ricardo Carrere (WRM) - Uruguai
Ricardo Navarro (CESTA) - El Salvador
Sarah Sexton (The Corner House) – Reino Unido
Winnie Overbeek (Red Alerta contra el Desierto Verde) - Brasil
Witoon Permpongsacharoen (FER) – Tailândia