A gigante finlandês-sueca da indústria florestal, Stora Enso, uma das maiores indústrias de celulose e papel do mundo, também está ávida por avançar na pesquisa sobre árvores geneticamente modificadas (GM). Sua enorme área de plantações industriais na América Latina e na Ásia já resultou em graves violações ambientais e de direitos humanos (1). Não obstante, um questionário divulgado em 2014 pelo Forest Dialogue revela que a empresa busca intensificar sua produção ainda mais, muito provavelmente usando árvores transgênicas (2).
A expansão de milhões de hectares de plantações de árvores é o que move o negócio da Stora Enso. A empresa está construindo, na China, uma nova fábrica de celulose e outra de papelão, que serão abastecidas por seus aproximadamente 90 mil hectares de plantações. Além disso, ela também tem operações na Índia, na Coreia, no Laos e no Paquistão. No Uruguai, a papeleira Montes de Plata, de propriedade da Stora Enso e da chilena Arauco, é abastecida por cerca de 190 mil hectares de plantações. No Brasil, a Stora Enso, junto com a brasileira Fibria, é dona da Veracel Celulose, que conta com 211 mil hectares de terras, dos quais 90 mil estão cobertos com eucaliptos. Também é dona de 43 mil hectares de terras no Rio Grande do Sul, cuja metade, aproximadamente, está plantada com eucaliptos (3). Segundo o questionário do Forest Dialogue, a empresa pretende fazer testes de campo com árvores transgênicas não Brasil.
Com o objetivo de continuar desenvolvendo novos produtos e serviços com base em madeira (4), a Stora Enso está em busca de tecnologias para intensificar sua produção. Apesar de ainda não contar com plantações conhecidas de árvores transgênicas, a empresa tem claras intenções de seguir esse caminho, ignorando os perigosos riscos ambientais e sociais.
No questionário do Forest Dialogue, o gigante florestal reconhece que as árvores transgênicas podem se propagar como qualquer outra espécie que tenha sido “melhorada” em seus programas de cultivo de eucalipto ou de seus híbridos. Acrescentando que não vê “nenhuma diferença entre as possíveis árvores transgênicas e outros clones que surjam de seus programas de cultivo”. Isso mostra como a empresa se recusa a aceitar os riscos implícitos na propagação de árvores transgênicas, ou seja, de árvores que implicam o risco de contaminação genética de habitats, afetando seriamente a biodiversidade, que aceleram a secagem de mananciais e poços em função de seu maior consumo de água, devido ao aumento de sua taxa de crescimento, que expõem as populações locais a perigosos produtos químicos, bem como a efeitos prejudiciais por inalar a toxina Bt que produz proteínas mortais para os insetos, entre outros (6).
A Stora Enso afirma, inclusive, que não vê “nenhum impacto social, positivo ou negativo, que possa ser atribuído à tecnologia de engenharia genética em si”. E continua dizendo: “do ponto de vista social, consideramos que as árvores geneticamente modificadas são iguais a outras plantações que surgem do programa de cultivo”. Nenhum impacto social?
As plantações industriais, com árvores transgênicas ou não, ocupam imensas quantidades de florestas e terras, contaminam solos e cursos d’água e agravam direta ou indiretamente a expulsão de mais comunidades de seus territórios, destruindo os meios de vida e a soberania alimentar locais. Ao afirmar que não há “nenhum impacto social”, a empresa também ignora denúncias como a que foi apresentada em 2013 ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, por violações aos direitos humanos em suas plantações de eucalipto e em sua fábrica de papelão prevista na China (7).
Intensificar o uso de terras, para quê?
Um dos principais argumentos da Stora Enso para avançar com a pesquisa em árvores transgênicas é o de querer intensificar sua produção, já que, segundo a empresa, “a intensificação da produção de alimentos, fibra e combustíveis é necessária para atender às necessidades da crescente população mundial”. Para ilustrar, a empresa inclui no questionário o link para um vídeo sobre suas plantações no estado da Bahia, no Brasil, como exemplo de “onde a produção intensiva de madeira, com as plantações de árvores, estabilizou o uso da terra e permitiu a restauração de florestas nativas”.
O vídeo chamado “A Stora Enso está salvando a floresta tropical” (8) conta que a implementação das plantações de eucalipto, junto com a recuperação de uma parte de suas terras, aumentou a biodiversidade. O que o vídeo não diz é que a Veracel, desde seus primeiros anos de funcionamento, causou grande desmatamento com tratores e retroescavadeiras. Tanto é que, em 17 de junho de 2008, na decisão histórica de um tribunal federal, a empresa foi obrigada a restaurar, com vegetação nativa, todas as suas áreas incluídas nas licenças de plantação de eucaliptos que foram emitidas entre 1993 e 1996, bem como pagar uma multa de mais de 12 milhões de dólares (9). Mas os eucaliptos seguem se expandindo, ao mesmo tempo em que continuam as denúncias contra a Veracel por parte das comunidades locais, agrupadas no Fórum Socioambiental do Extremo Sul da Bahia e na Rede Alerta contra o Deserto Verde, ao ocupar territórios habitados e devastar florestas nativas (10).
“A cada ano, nós plantamos 400 hectares de floresta”, afirma no vídeo Eliane Anjos, administradora de sustentabilidade da Veracel, dizendo, também, que a empresa ensinou as populações locais a se relacionar com a floresta e manejar as sementes nativas. Além de ser necessário avisar à Sra. Eliane que a área de plantio de monocultura de eucalipto é muito maior que isso – pelo menos 10 mil hectares por ano – e que plantações não são florestas essas plantações da Veracel também estão se aproximando dos territórios tradicionalmente ocupados pelo povo indígena Pataxó, que denuncia uma ocupação de aproximadamente 30 mil hectares (11). Como se pode afirmar que uma empresa com tão graves impactos negativos sobre as florestas nativas e as populações locais “está salvando a floresta tropical”? A empresa não deveria escutar e aprender com as populações locais o que realmente significa uma floresta e a biodiversidade que ela implica?
“Intensificar o uso de terras”, ou seja, a ideia de obter mais madeira por hectare, pareceria um argumento convincente para aliviar a pressão sobre as florestas. Mas então, por que, apesar de a produção de madeira já ter se intensificado nas últimas décadas em países como Brasil, as plantações de monocultivo continuaram avançando exponencialmente?
A crescente expansão de plantações industriais anda de mãos dadas com a demanda cada vez maior por produtos à base de madeira, sobretudo proveniente de países do Norte, seja para celulose e papel, fibra, combustíveis, “reservas” de carbono, seja para outros tantos fins. Ao se aumentar a demanda por madeira, também se aumenta a pressão sobre florestas e territórios. Portanto, as modificações genéticas de árvores, que lhes permitem crescer mais rápido, resistir a produtos químicos e a insetos, e tolerar o congelamento, aumentarão os lucros das empresas e, por sua vez, a extensão das plantações. A liberação comercial de árvores transgênicas ocasionaria a perda de biodiversidade e de água doce, a desertificação de solos, e graves impactos sobre saúde humana, tudo o que, direta ou indiretamente, provoca a degradação e o colapso de florestas e campos nativos.
(1) http://wrm.org.uy/pt/artigos-do-boletim-do-wrm/secao1/a-campanha-de-propaganda
-da-stora-enso-no-laos/
(2) http://theforestsdialogue.org/publication/company-responses-questionnaire-development-genetically-modified-trees
(3) http://www.storaenso.com/About-Site/Pages/Stora-Enso-in-brief.aspx
(4) Referência 3
(5)http://assets.storaenso.com/se/com/DownloadCenterDocuments/Policies_Wood_
and_Fibre_Sourcing_and_Land_Management_2012_english.pdf
(6) Veja mais informação em:
http://wrm.org.uy/pt/files/2004/12/Arvores_geneticamente_modificadas.pdf
(7) http://wrm.org.uy/pt/artigos-do-boletim-do-wrm/secao2/ongs-apresentaram-
denuncia-a-onu-contra-a-violacao-dos-direitos-humanos-pela-stora-enso-na-china/
(8) iwrV_yQ46Q0&list=FL3WUNpTDWw42Yms2lemkaNA&index=3">
(9) http://www.wrm.org.uy/oldsite/boletim/132/opiniao.html
(10) http://wrm.org.uy/pt/artigos-do-boletim-do-wrm/secao2/brasil-ocupacion-de-
plantaciones-forestales-de-veracel-en-reclamo-de-reforma-agraria/
(11) http://wrm.org.uy/pt/artigos-do-boletim-do-wrm/secao2/brasil-las-plantacione
s-de-veracel-la-usurpacion-certificada/