Nos días 7 e 8 de dezembro de 2011 foi realizado um encontro na cidade amazônica de Cobija, Bolívia, para analisar a condição dos direitos dos povos indígenas em isolamento e em situação de extrema vulnerabilidade da Amazônia e o Grande Chaco, e para estabelecer um plano de ações a respeito de sua defesa.
Pablo Cingolani informa sobre o encontro e tece algumas reflexões a respeito. A seguir, extraímos e adaptamos alguns dos conceitos e conclusões constantes do documento que pode ser lido na íntegra em castelhano em:http://www.ecoportal.net/Temas_Especiales/Pueblos_Indigenas/Un_camino_hacia_la_proteccion_de _los_pueblos_indigenas_en_aislamiento_de_Bolivia.
Nos últimos cinco anos, no contexto de uma impressionante mobilização social e cultural, Bolívia tem vivido uma época de mudanças. Hoje, como nunca antes, a problemática dos povos originários- sobreviventes de um genocídio que começou no século XVI e de um etnocídio que continua- está em debate enriquecido e carregado de dinamismo humano sensível e multiplicador e de significados históricos, presentes e futuros.
Há sessenta anos, o processo nacionalista quis integrar o índio das terras altas e diluir sua identidade na mestiçagem e o sindicato agrário, e ao mesmo tempo- no caso dos povos indígenas das terras baixas- desconhecia seus territórios lançando- sucessivamente, no decorrer de décadas- sobre eles trágicos planos de invasão e domínio estatal e privado. Hoje, o conflito não só continua aberto e pendente de resolução, mas se torna descarnado uma vez que se inscreve e se potencia criativa e contraditoriamente no novo quadro legal de direitos- que a nova Constituição consagra- e nessa mobilização permanente dos setores sociais, que tem marcado a última década da vida nacional.
O encontro, convocado pela Confederação de Povos Indígenas de Bolívia (CIDOB), realizou-se com a presença de (quase) todos os atores intervenientes e convergentes na problemática dos povos em isolamento e em extrema vulnerabilidade. Estiveram presentes, o governo nacional, o Ministério Público, as regionais da CIDOB, a Oficina do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos com sede em La Paz.
Houve diversas palestras e denuncias sobre situações que vivem os povos em isolamento, em contato inicial e em extrema vulnerabilidade, mas principalmente foi debatida profundamente a elaboração de um plano de ação mínimo e de execução imediata e caráter permanente para estabelecer, pela primeira vez na vida democrática do país, uma agenda visível e propositiva em defesa dos direitos dos povos mais esquecidos.
A declaração e o plano de ação reconheceram que é urgente e necessária a aprovação de uma lei quadro de defesa e proteção dos Povos Indígenas em isolamento, em contato inicial e em alto grau de vulnerabilidade, e nesse sentido percebe-se como positivo o anteprojeto de lei elaborado pelo Vice- Ministério de Justiça do Estado Plurinacional.
Definiu-se como imperioso iniciar um processo de demarcação e controle de todos os territórios indígenas, mas especialmente daqueles territórios habitados por povos indígenas em isolamento, em contato inicial e em alto grau de vulnerabilidade. Isso implica que as grandes obras de infraestrutura ao serviço de projetos extrativos e agroindustriais não continuem exigindo vítimas, devorando povos, promovendo o etnocídio e o genocídio.
Estabeleceu-se um plano de ação mínimo que implica: a demarcação e salvaguarda de uma área de reserva para o povo indígena Toromona e outra para o povo indígena Pacahuara, para sua estrita proteção e a intangibilidade de seu território; o estabelecimento de uma área de refúgio especial para segmentos do povo indígena T'simane em condições de extrema vulnerabilidade; o apelo à conformação de comissões de trabalho multidisciplinares e inter-institucionais encabeçadas pela CIDOB para a identificação de outras áreas de refúgio de povos ou segmentos de povos indígenas existentes no território nacional, como as que são habitadas por segmentos do povo Araona, Chacobo, Yuqui, Mosetén, Esse Ejja, Yuracaré e Ayoreo, excluindo qualquer possibilidade de afetá-las com algum tipo de atividade hidrocarbônica e/o mineira dentro de seus territórios.
O pronunciamento final expressa: “Se há quase três décadas proclamou-se que Bolívia não podia viver mais sem seus povos indígenas; hoje, com a mesma força e mesma convicção, proclamamos que Bolívia e seu Estado Plurinacional só poderá existir e ser pleno e digno se defender e proteger os últimos Povos Indígenas em Isolamento, em Contato Inicial e em Alto Grau de Vulnerabilidade da Amazônia e do Grande Chaco”.
“Bolívia nunca mais sem seus povos indígenas em isolamento e em situação de alta vulnerabilidade”.