O desmatamento foi e ainda é um flagelo violento, com causas visíveis e ocultas. Uma das causas mais destacadas e visíveis do desmatamento na África é o duo entre suborno e corrupção, que há muito infecta o setor florestal no continente. Muitos esforços e muito dinheiro têm sido dirigidos à reforma das leis e ao reforço do Estado de direito nos países produtores – mas eles têm fracassado.
O novo relatório da Global Witness, “Logging in the shadows”, (disponível emhttp://www.globalwitness.org/sites/default/files/library/Shadow%20Permit%20Report%202013%20Final_Web_0.pdf) identifica como as licenças para promover as pequenas empresas e atender às necessidades locais estão sendo alocadas às centenas a madeireiras industriais em Camarões, República Democrática do Congo (RDC), Gana e Libéria.
Na Libéria, a Atlantic Resources Ltd. e a Alpha Logging & Processing Inc. – empresas ligadas à gigante malásia Samling Global Ltd – obtiveram direitos de exploração de madeira sobre 10% do território do país via este tipo de licenças “artesanais”, apesar da duvidosa reputação global da Samling.
Alocadas em sigilo e sujeitas a poucos controles sobre suas operações, essas licenças facilitam o acesso rápido às florestas para grandes operações madeireiras altamente lucrativas, sem que haja fiscalização por parte das autoridades. Geralmente, incluem baixa tributação, escassa consulta à população local, pouco ou nenhum beneficiamento local e mínimos requisitos ambientais.
Como o relatório aponta: “A ausência de controle eficaz sobre operações com licenças “artesanais” permite às madeireiras operar com pouca consideração para com o meio ambiente. Raramente ou nunca são realizadas avaliações de impacto ambiental, e a tendência a usar a mesma licença em vários locais aumenta o potencial para danos ambientais. As consequências têm sido particularmente chocantes na Libéria, onde 40% das florestas do país foram alocados através de Licenças de Uso Privado”.
Vencendo o sigilo, foi possível denunciar o uso das licenças “artesanais” em todos os quatro países, mas a informação foi publicada muito tempo depois de a extração de madeira ter começado e quando já era tarde demais para as florestas e os povos da floresta.
O relatório conclui que essas licenças são produto de uma economia política que privilegia o poder, o clientelismo e interesses vigentes em detrimento dos interesses da sociedade em geral e do meio ambiente. O mau comportamento por parte das elites egoístas e irresponsáveis desgasta a confiança dos cidadãos no governo e sufoca o crescimento das economias locais sustentáveis. Na ausência de um sistema de licenças para uso local que funcione, as comunidades que dependem da floresta são obrigadas a suprir suas necessidades de madeira de forma ilegal, prejudicando ainda mais o estado de direito.
Embora a corrupção seja identificada como uma causa subjacente do desmatamento, o relatório reconhece que, sem abordar também outras causas do desmatamento, como a demanda global por madeira, os Acordos de Parceria Voluntária (APVs) da Europa e outras iniciativas – como o Regulamento relativo à Madeira da União Europeia (EUTR) e a extensão da chamada Lei Lacey, nos Estados Unidos – vão fracassar na redução do desmatamento.
São apresentadas recomendações valiosas, incluindo um processo de alocação aberto, transparente e competitivo. Os objetivos são garantir que se pague um preço justo pelo acesso aos recursos, que os importadores europeus e norte-americanos não pressuponham que a madeira é legal porque tem licença, que se aumentem os esforços para proporcionar um marco jurídico significativo às formas de manejo florestal comunitário e que se dediquem recursos suficientes à sua implementação, para que os povos que dependem da floresta possam desfrutar de um controle adequado sobre seus próprios recursos.
Além disso, o relatório não diz, mas seria necessário questionar em muito todo o padrão de produção, comércio e consumo que alimenta a indústria madeireira, bem como o suborno e corrupção que o permeiam.