Green Resources Moçambique: Mais Promessas Falsas!

A Green Resources Moçambique é uma empresa de plantações de monoculturas, parte da Green Resources, SA. (GR). Estabelecida em 1995, a Green Resources SA, uma empresa de capitais maioritariamente noruegueses, com mais de 80 acionistas, é considerada a maior empresa de plantações de monoculturas em África (excluindo a África do Sul). Está presente em 3 países africanos (Moçambique, Tanzânia e Uganda) com 10 plantações, nomeadamente Bukaleba e Kachung (Uganda); Lindi, Idete e Mnyera (Tanzânia); Niassa Green Resources, Chikweti, Lúrio Green Resources, Tectona e Ntacua (Moçambique).

Segundo a Green Resources Moçambique (GRM) os objectivos que orientam as suas plantações de monoculturas são: i) estabelecer e gerir de forma sustentável as plantações florestais comerciais, a fim de gerar produtos florestais para uso doméstico e de exportação (produção de energia, painéis de partículas e polpa; madeira serrada e postes de transmissão); ii) sequestro de carbono; iii) conservação das florestas naturais e biodiversidade; iv) desenvolvimento económico e social das áreas e comunidades abrangidas. A realidade no terreno mostra o contrário: inúmeros conflitos de terra, usurpação de terra comunitária que era utilizada na maioria dos casos para produção de alimentos, estabelecimento de plantações junto a rios e fontes de água, junto a estradas e habitações e em áreas de floresta nativa, entre várias outras questões.

As situações de conflitos entre comunidades locais e a Green Resources não ocorrem somente em Moçambique, vários são os estudos que apontam sérios conflitos de terra entre a empresa e as comunidades locais, tanto em Moçambique como em Uganda e Tanzânia. Por exemplo, a “National Association of Professional Environmentalists (Amigos da Terra-Uganda)” levou a cabo um estudo em 2012 onde apresenta o cenário geral dos conflitos entre a empresa e comunidades locais. O estudo refere que a Green Resources em Uganda, através da sua sucursal “Busoga Forestry Co Ltd”, usurpou cerca de 8.000 a 10.000 hectares da floresta nativa em Bukalega para converter em plantações de pinheiro e eucalipto. Cerca de 8.000 pessoas de 13 aldeias da mesma região foram expulsas de suas terras alegadamente porque teriam ocupado ilegalmente a região durante a agitação política de 1975-1985 (1).

Na Tanzânia, um relatório publicado pela TimberWatch em 2011 apontou os seguintes impactos em plantações da Green Resources: “[T]erra perdida por comunidades desterritorializadas, péssimas condições de trabalho, destruição da biodiversidade de que comunidades dependem para alimentação, combustível e medicamentos; redução da disponibilidade de água, assim como muitos efeitos diretos e indiretos que impactam negativamente o modo de vida das comunidades afetadas”. (2)

Lutas contra a Green Resources em Moçambique

A Justiça Ambiental, Livaningo e a União Nacional de Camponeses (organizações moçambicanas da sociedade civil) lançaram em Setembro do 2016 um estudo “O Avanço das Plantações Florestais sobre os Territórios dos Camponeses no Corredor de Nacala: o caso da Green Resources Moçambique” (3). No âmbito desta iniciativa as três organizações produziram ainda um breve documentário que ilustra a situação das comunidades afectadas pelos conflitos de terra com a Green Resources Moçambique. (4) Adicionalmente foi elaborada uma petição em parceria com a World Rainforest Movement, que contou com 12.332 assinaturas de singulares e de organizações nacionais e estrangeiras e foi submetida às empresas Green Resources na Noruega, Portucel/The Navigator Company em Portugal, bem como às instituições governamentais moçambicanas nomeadamente o Ministério da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural e Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar. A petição traz como principal demanda que as empresas Green Resources e Portucel, e todas as demais empresas que pretendem obter grandes extensões de terra fértil para monoculturas de árvores no leste e no sul de África, devolvam a terra às comunidades locais, de modo a resolver os atuais conflitos de terra e impedir novos conflitos. Na petição exigimos que o Governo de Moçambique assegure que a Lei de Terras é de facto cumprida e garanta que os direitos das comunidades à terra, água e alimentos sejam devidamente respeitados.

Até ao momento não recebemos qualquer resposta formal à nossa petição. Tivemos recentemente conhecimento que a Green Resources respondeu à nossa petição através da sua página na internet (5). Como se poderá verificar, esta resposta pouco ou nada trás de novo, no entanto, apresenta um dado bastante interessante. Um dos argumentos para o estabelecimento de plantações de monoculturas tem sido o uso de terras degradadas e marginais, que sabemos não corresponder à realidade e nesta resposta a Green Resources confirma que precisa de terras férteis para as suas plantações… e nós precisamos de produzir comida meus senhores!!!

Desde o lançamento público do estudo em 2016, as referidas organizações tiveram dois encontros com a Green Resources Moçambique, mediados pela Embaixada da Noruega, que em nada contribuíram para a resolução dos conflitos. Nestes encontros o estudo foi severamente criticado, tanto pela empresa como pelos representantes da Embaixada de quem se esperava uma postura imparcial, no entanto nenhum foi capaz de justificar ou fundamentar as críticas apresentadas, as razões de tanta indignação! Importa reconhecer que a empresa referiu nos dois encontros estar aberta a discutir as questões apresentadas no estudo, no entanto, nos dois encontros isso não aconteceu. A Green Resources Moçambique foi consultada na elaboração do estudo, limitou-se a refutar qualquer informação de conflitos ou má conduta da empresa sem fundamentar ou apresentar a documentação que poderia esclarecer algum equívoco e não o fez. Os consultores a cargo do estudo solicitaram uma serie de documentos à empresa, tais como actas de consultas comunitárias, processos de aquisição do Direito do Uso e Aproveitamento da Terra (DUATs) e, apesar da empresa referir inúmeras vezes que tem registro de tudo e tudo foi feito de acordo com a Lei nacional, não tivemos acesso aos documentos solicitados e fomos aconselhados a solicitar os mesmos ao governo.

Esta estratégia tem sido bastante utilizada pelas empresas: afirmar que não tem responsabilidade de fornecer esta informação e que os interessados deverão solicitar ao governo pois este sim tem a responsabilidade de assegurar o acesso à informação. No entanto, e apesar dos inúmeros pedidos e nenhuma recusa oficial ainda não tivemos acesso aos mesmos.

Confrontando financiadores na Noruega e na Suécia

As situações de conflitos de terra, queixas referentes ao processo de compensações e a insatisfação das comunidades afectadas na sua maioria permanecem por resolver e dada a difícil comunicação e acesso a informação as organizações decidiram levar a questão para apresentação e discussão na Noruega, país de origem da empresa, e Suécia, pela relação com a empresa de plantações de monoculturas Chikweti, adquirida pela Green Resources.

Foi neste âmbito que uma delegação composta por representantes da Justiça Ambiental (JA!), Livaningo, União Nacional de Camponeses (UNAC), União Provincial de Camponeses de Niassa (UPC Niassa), e representantes das Comunidades de Meparara, Namacuco e Lanxeque, distrito de Ribaué, província de Nampula, estiveram na Noruega de 26 a 29 de Setembro de 2017, onde tiveram encontros com a Norfund (The Norwegian Investment Fund for Developing Countries) , Norad (Norwegian Agency for Development Cooperation), membros do parlamento Norueguês e diversas organizações da sociedade civil. Nestes encontros a delegação apresentou as principais constatações do estudo e foram discutidos os conflitos com as comunidades locais e de que modo estes actores poderão intervir na resolução dos mesmos, sem no entanto esquecer os interesses económicos que estes países têm neste tipo de investimentos.

No encontro com a Norfund, um dos financiadores da Green Resources Moçambique, tivemos conhecimento de que a certificação FSC para as plantações na Província de Nampula está suspensa. A certificação FSC de que a Green Resources Moçambique se gaba sempre que é confrontada com os inúmeros problemas nas comunidades foi na verdade suspensa desde Maio de 2016, devido a inúmeros problemas detectados (6).

Os representantes da Norfund mostraram-se bastante preocupados com os resultados do estudo e acima de tudo com os testemunhos dos representantes das comunidades, mas a situação não era nova, tinham conhecimento das questões. É importante salientar que a preocupação da Norfund não se prende necessariamente com a situação de conflitos com as comunidades locais, mas sim com a dimensão do valor investido na Green Resources e com a necessidade de retorno desse valor, as razões parecem ser puramente de interesse económico e há muito interesse em assegurar que a empresa recupere. A Norfund parece acreditar que as plantações de monoculturas trazem o tão publicitado “desenvolvimento” e acreditam ainda que ao financiar este tipo de investimento em países pobres estão de facto a apoiar no desenvolvimento desse país, como acreditam ser o caso em Moçambique. Facto curioso é terem ainda referido que já receberam inúmeros relatórios a relatar conflitos e problemas com a Green Resources, tanto de Moçambique como das plantações no Uganda e na Tanzânia.

É lamentável a falta de transparência da Green Resources Moçambique, que tem mencionado a certificação FSC em todos os momentos em que é confrontada mas em nenhum momento referiu que esta foi suspensa no ano passado.

A certificação FSC é utilizada pelas empresas como selo de qualidade, pretendendo assegurar ao consumidor que a madeira que adquire é proveniente de florestas exploradas de forma socialmente justa, economicamente viável e ambientalmente adequada, no entanto, a credibilidade deste processo tem sido largamente questionada devido a vários casos em que são reportados conflitos graves com comunidades locais e questões ambientais sérias enquanto as empresas mantém a certificação. Outro aspecto que contribuiu bastante para a perda de credibilidade da certificação FSC foi a inclusão de plantações de monoculturas no processo de certificação apesar da imensa oposição que este tipo de projecto tem recebido devido aos impactos negativos que causam.

A delegação teve ainda um encontro com um representante do Green Resources na Noruega, que julgava que o processo de compensações e de aquisição de terra tinha sido um sucesso. Apresentamos as questões mais urgentes e ficou claro que não partilhamos da mesma opinião sobre a forma como tem sido conduzidos os processos ao nível das comunidades locais, pois segundo o mesmo tudo foi feito de acordo com a Lei e todas as compensações foram devidamente calculadas, negociadas e pagas. Claramente não dispomos da mesma informação, entregamos cópias das fichas de pagamento de compensações para que visse os valores pagos, e cópias das fichas de recolha de informação sobre as áreas de machamba e o número de árvores e estes documentos não deixam dúvida de que há matéria para discussão e há várias situações que requerem solução urgente. Foi possível confirmar com o representante da Green Resources que a Lurio Green Resources tem a Certificação FSC suspensa, e é importante salientar que a Green Resources Moçambique referiu-se inúmeras vezes à certificação como prova de que todos os procedimentos tinham sido cumpridos e que tudo funcionava da melhor forma possível e em momento algum referiu que a mesma estava suspensa.

Uma outra questão que tem sido motivo de inúmeras discussões entre as comunidades locais e a empresa são as promessas que foram feitas durante as consultas comunitárias e que foram de facto a razão principal de muitos membros das comunidades terem aceito ceder as suas terras. No entanto a Green Resources tem se esquivado destas promessas alegando ter sido mal compreendida pelas comunidades, e que são infraestruturas sociais sob a responsabilidade do governo e não das empresas. Curiosamente no Relatório Público de Certificação Florestal Woodmark consta como uma das questões problemáticas identificadas e que requer atenção por parte da empresa “Aquando das consultas das comunidades, comités e lideres foi repetidamente mencionado que a LGR [Lurio Green Resources] prometeu construções de infraestruturas sociais, incluindo escolas, furos de água e postos de saúde. Estas promessas ainda não foram cumpridas. Os gestores da empresa dizem que vão honrar os compromissos por fases e de acordo com as prioridades. Como evidência a empresa mostrou um contrato com a BJ Drilling, Lda, para abertura de 7 furos de água nos 3 distritos onde operam. LGR deverá assegurar que as expectativas da comunidade são geridas e que comunicam regularmente sobre o progresso e planos para cumprir os compromissos sociais.”

Um outro dado novo para nós refere-se à actual situação financeira da empresa. Segundo informação confirmada na reunião com o representante da Green Resources na Noruega, a empresa está a atravessar sérias dificuldades financeiras, e esta é a razão principal para não ter ainda levado a cabo os projectos sociais, que incluem as inúmeras promessas que tem sido constantemente citadas e de certa forma contestadas pela Green Resources Moçambique, alegando se tratar de expectativas fora do controle da empresa e não de promessas como as várias comunidades consultadas afirmaram sempre.

Qual é a dimensão desta crise financeira da Green Resources em Moçambique? Qual é a estratégia da empresa para resolver a sua situação financeira sem prejudicar mais ainda as comunidades locais e como poderá ainda cumprir as suas obrigações com as comunidades afectadas neste cenário? Questionamos se existe uma estratégia de saída em caso de falência, e percebemos que em caso de falência tudo ficará nas mãos dos bancos… não há qualquer estratégia!

Em todos os encontros tidos tanto na Noruega e na Suécia ficou claro que embora possamos não concordar em tudo há espaço para discutir os conflitos entre a empresa e as comunidades afectadas e estes conflitos existem. Os mesmos resultam de processos mal conduzidos, da aplicação selectiva da lei e são agravados ao longo dos anos pela falta de sensibilidade, arrogância no tratamento dos mesmos, pela gritante desigualdade de poder entre os investidores e as comunidades locais nos processos de negociação e pela ganância por acumular mais e mais terra competindo directamente com a produção de alimentos num país em que se diz que a agricultura é a base do desenvolvimento, mas tem no entanto promovido cada vez mais investimentos que requerem largas extensões de terra e que tem afastado mais e mais camponeses das suas terras.

A luta continua!!!

Justica Ambiental, http://ja.org.mz/en/

(1) National Association of Professional Environmentalists – NAPE (FoE Uganda), A Study on Land Grabbing Cases in Ugnada, 2012,
https://reliefweb.int/sites/reliefweb.int/files/resources/Full_Report_3823.pdf
(2) Timberwatch Coalition, CDM Carbon Sink Tree Plantations. A case study in Tanzania, 2011, http://globaljusticeecology.org/files/CDM%20plantations%20report.pdf
(3) Justiça Ambiental, Livaningo e a União Nacional de Camponeses, “O Avanço das Plantações Florestais sobre os Territórios dos Camponeses no Corredor de Nacala: o caso da Green Resources Moçambique”, 2016,
https://issuu.com/justicaambiental/docs/o_caso_da_green_resources_moc__ambi
(4) target="_blank" rel="noopener">
(5) Resposta disponível em http://www.greenresources.no/News/ID/60/Green-Resources-GR-Responds-to-Open-Letter-Calling-for-an-end-to-the-expansion-of-forest-plantation-activities
(6) Lurio Green Resources SA. License Code: FSC- C110223. Veja: https://info.fsc.org/details.php?id=a0240000008hYgcAAE&type=certificate#result