O FMI e o desmatamento na Indonésia

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Devido a uma crise econômica prolongada e à desvalorização da rupia indonésia no começo de 1997, a Indonésia se viu obrigada a procurar ajuda do FMI e no final de outubro ajustou-se a concessão de um primeiro pacote assistência. O pacote de resgate financeiro de USD 43 bilhões incluía alguns ajustes estruturais ou reformas estipuladas na Carta de Intenção que o governo da Indonésia deveria cumprir. O Presidente da época, Suharto, assinou a primeira Carta de Intenção com o FMI em outubro de 1997, focalizada na reforma do setor bancário, mas sem incluir qualquer referência ao setor florestal ou ao meio ambiente.

No início de janeiro de 1998, o governo da Indonésia não tinha implementado os compromissos da primeira Carta de Intenção e o país sumiu-se em uma crise econômica mais profunda. Apesar disso, negociou-se e assinou-se uma Carta de Intenção em 15 de janeiro de 1998. O FMI anunciou que a segunda Carta de Intenção aceleraria e ampliaria os compromissos de reforma anteriores.

O primeiro grande conjunto de reformas que afetam as florestas estavam contidos na Carta de Intenção de janeiro de 1998 com o Governo indonésio –os documentos que estabeleceram as condições do empréstimo- que Indonésia tinha que aceitar para garantir um empréstimo de USD 1 bilhão, como parte de um pacote afiançamento de USD 43 milhões. Um abalador novo elemento à primeira Carta de Intenção foi uma série de medidas relacionadas com as florestas (6 pontos) e outras medidas ambientais (4 pontos). Elas incluíam compromissos maiores para “reduzir os impostos à exportação sobre troncos, madeira serrada, rattan, e para impor impostos apropriados ao arrendamento de recursos” (ponto 37) e “remover restrições sobre o investimento estrangeiro nas plantações de dendezeiros” (ponto 39).

Ironicamente, apesar de que a Carta de Intenção exigia maior transparência e consulta com a sociedade civil, o processo de redação dos próprios acordos não foi transparente. O conteúdo das Cartas de Intenção ainda não está disponível para escrutínio público antes de serem assinadas. Não há ampla participação de ONGs e especialmente daqueles mais afetados pelas condições das Cartas de Intenção.

Através dos pacotes de Cartas de Intenção do FMI, o Banco Mundial guiou o governo indonésio para implementar as receitas do FMI de seus empréstimos de ajuste estrutural. As Cartas de Intenção se transformaram na “santa bíblia” que guiava a economia do país e suas políticas de manejo dos recursos naturais.

Em 2002, WALHI/FOE Indonésia encarregou um estudo independente para avaliar o impacto da implementação das Cartas de Intenção sobre as florestas e o meio ambiente. O estudo foi realizado por uma equipe liderada por um proeminente experto em economia florestal do Instituto da Agricultura de Bogor. O estudo concluiu que o orçamento do estado para despesas públicas com manejo ambiental tinha diminuído e que a liberalização econômica e do comércio tinha aumentado a exploração de recursos naturais. Algumas constatações do estudo são resumidas a seguir.

A liberalização da exportação de troncos (ponto 37, Carta de Intenção de 1998) forneceu incentivos financeiros para a exportação de troncos. Apesar de que reduzir os impostos da exportação de madeira pode ter melhorado o preço da madeira subestimada na Indonésia, o que poderia levar à melhoria da eficiência na extração de matéria-prima e servir como incentivo para os esforços de conservação, essa política de fato tem sido catastrófica.

A atividade de exportação de troncos foi incentivada mas ao mesmo tempo aumentou o déficit de abastecimento de madeira para as indústrias de processamento de madeira nacionais. Ironicamente, apesar da escassez de abastecimento de madeira, a indústria baseada nas florestas até foi até aumentada, especialmente a produção nas fábricas de celulose e papel. Em decorrência disso, a madeira para a indústria era fornecida por fontes ilegais e não registradas. Além disso, como o abastecimento de madeira das concessões madeireiras diminuiu, a demanda da madeira de florestas de conversão aumentou.

A mesma tendência aconteceu basicamente com a política de liberalização do investimento no setor de plantação de dendezeiros (ponto 39). Essa política tem sido objeto de controvérsia desde que foi lançada, porque era totalmente contraditória com o compromisso do Banco e do FMI de reduzir a conversão florestal na Indonésia. Remover as restrições sobre o investimento estrangeiro no azeite de dendê promoveu uma maior expansão da plantação de dendezeiros às expensas das florestas. Junto com a política prévia do governo indonésio, essa condição abriu o país para maior conversão florestal. De acordo com o estudo, 80% das plantações de dendezeiros se estabeleceram através da conversão de florestas naturais.

Apesar das melhorias em alguns aspectos da governança e da transparência (por exemplo, exigências de reforma de regulações de concessões, introdução de padrões de desempenho e desmantelamento de cartéis) poderiam claramente beneficiar tanto as florestas quanto as receitas do governo, outros objetivos como a redução dos impostos de exportação sobre a madeira iam provavelmente a compensar esses lucros. Um compromisso para deter a conversão das terras florestais era inconsistente com a remoção de restrições sobre a exportação de azeite de dendê e sobre o investimento estrangeiro no setor –um movimento que provavelmente aceleraria a taxa de conversão de florestas para plantações. As medidas não fizeram qualquer coisa para abordar as causas estruturais subjacentes do desmatamento e da degradação.

Desde o colapso econômico de 1997, o Banco Mundial e o FMI têm tido um rol direto na tomada de decisões que afetam as florestas e os povos das florestas, já que eles pressionam a Indonésia para continuar com os pagamentos da dívida. Essas instituições devem aceitar a responsabilidade conjunta pela destruição das florestas e a resultante marginalização das comunidades e começar a priorizar as necessidades dos pobres sobre os interesses das finanças internacionais.

Por Longgena Ginting, WALHI /Friends of the Earth Indonesia, e-mail: ginting@foei.org