Tadao Chino, presidente do Banco Asiático de Desenvolvimento (ADB, em inglês), sabe perfeitamente o que espera a sociedade civil desse banco. Na Assembléia Geral Anual do ADB de 2001, realizada no Havaí, Chino aceitou uma declaração assinada por 68 ONGs, intitulada “Os povos desafiam o ADB”. A declaração incluía a exigência de “as diretrizes para políticas e práticas futuras surgirem de debates e discussões públicas, e não de negociações a portas fechadas entre grupos de elite da gerência do ADB, elites nacionais e do governo e “expertos” técnicos.
Chino prometeu que as opiniões das ONGs “seriam levadas em conta”. Infelizmente, ao elaborar a nova proposta de política florestal, parece que o Banco esqueceu a promessa de seu presidente.
O Banco afirma ter consultado mais de 500 pessoas no decurso de oficinas realizadas em Bangladesh, Paquistão, Filipinas e Sri Lanka. Em fevereiro de 2002, quando da elaboração pelo Banco de um rascunho da nova política florestal, 140 pessoas participaram numa oficina na sede do Banco em Manila. Antes da oficina de Manila, o Banco enviou seu “rascunho do marco estratégico” a “aproximadamente 12 expertos em matéria florestal... para que façam uma revisão e formulem observações”.
Logicamente, esses “expertos” foram escolhidos pelo próprio Banco. Uma vez divulgado o rascunho da política florestal do Banco, toda pretensão de debate público desapareceu. “O processo formal de consulta externa concluiu com a Consulta Regional de fevereiro de 2002”, explicou Jan P. M. van Heeswijk, diretor geral do Departamento de Desenvolvimento Regional e Sustentável do ADB. “O processo de revisão interna ainda está em andamento”, acrescentou Heeswijk.
Justamente, esse processo de revisão interna é o tipo de negociação a portas fechadas e elitista que as ONGs assinantes da declaração do Havaí pretendiam evitar.
As carências do último rascunho da política florestal do Banco, de junho de 2003, ficam demonstradas por seu apoio não crítico a plantações industriais de árvores. De fato, um dos objetivos da nova política do Banco é “aumentar a extensão e a produtividade das plantações”.
Uma plantação de monocultura de eucalipto, formada por grandes blocos de árvores da mesma idade derrubadas a cada cinco anos, tem mais em comum com uma cultura agrícola do que com uma floresta. No entanto, o Banco define a plantação como “uma floresta estabelecida através de plantio e/ou semeadura no processo de florestamento ou reflorestamento”.
No rascunho, a floresta é definida como “um ecossistema com, pelo menos, 10% de cobertura de copa e/ou outras terras florestais ou com bambu, geralmente associadas a fauna e flora silvestre e condições naturais do solo e não sujeito à agricultura”. Porém, na hora de proteger as florestas, para evitar que sejam transformadas em plantações, o rascunho estabelece que: “o ADB não fornecerá assistência para plantações em áreas de floresta natural com mais de 40% de densidade de copa”.
Assim, pois, uma floresta com 39% de densidade de copa não recebe nenhuma proteção. Não é dada nenhuma explicação para esse súbito aumento da cobertura mínima de 10% para 40%, embora ele implique um enfraquecimento importante da proteção dada pela política.
Pior ainda, o rascunho da política autoriza todo tipo de projeto devastador de florestas, porquanto permite que consultores e funcionários do Banco decidam que não é possível evitar o desmatamento ou a degradação de uma floresta. O rascunho da política estabelece que: “Caso a avaliação ambiental indique que o investimento proposto contribuirá significativamente para a degradação de uma floresta natural, ou para a conversão a um uso da terra diferente do da floresta, e a mudança do uso da terra como floresta se torne inevitável, o ADB exigirá a reabilitação o reflorestamento de uma área igual, como julgar adequado, em consulta com as comunidades atingidas”.
O Banco não explica o significado da palavra “inevitável” nesse contexto. Também não explica como será tomada a decisão de reputar de inevitável o dano causado às florestas. Um assessor florestal contratado pelo ADB pode dizer que a substituição de grandes áreas de floresta, campos, terras de pastoreio e campos de cultivo migratório por plantações de monocultura é inevitável. Para os moradores cujo sustento depende dessas terras, sem dúvida, essa decisão seria totalmente “evitável”.
Porquanto define plantação como floresta, o Banco está deixando de dar proteção à floresta. Se um projeto de plantação industrial financiado pelo ADB planeja substituir, digamos, 50 mil hectares de floresta, para satisfazer a política do Banco, os promotores do projeto poderiam sugerir o “reflorestamento” de mais 50 mil hectares com plantações industriais. Um ponto que não fica claro no rascunho é se o Banco também vai financiar esse “reflorestamento”.
O ADB divulgou o rascunho da política, de junho de 2003, através do sítio Web, “agradecendo as observações” que lhe forem enviadas e garantindo que receberão “importante consideração”. Quanto à redação final da política florestal, o Banco “fará uso de seu direito de utilizar, ou não, as observações”, e afirma que “poderá publicar uma relação de pessoas que contribuíram com observações”.
Porém, aquilo que o ADB não diz no sítio Web é que a diretoria já discutiu e rejeitou o rascunho da política de junho de 2003.
Numa reunião de diretoria, realizada no dia 22 de julho de 2003, vários diretores executivos do Banco pediram que o rascunho de junho de 2003 fosse revisado, segundo afirma Uschi Eid, secretária parlamentar do Ministério de Cooperação Econômica (BMZ). A Sra. Eid descreveu o rascunho da política como: “infelizmente, aquém de nossos princípios e normas mínimas para esse setor; ele não satisfaz a qualidade exigida pelas ‘normas operativas’ do Banco Mundial”.
O problema com o processo de revisão interna do Banco é que é interno, e não público. Ele não permite a participação. O Banco não fará públicas todas as observações que recebe. Não dará resposta às observações. Não se sabe como decidirá quais observações vão ser incluídas e quais vão ser ignoradas. Nenhum dos supostos expertos do Banco deverá enfrentar perguntas em público sobre a política florestal. Em suma, ao solicitar observações, o Banco não faz senão tentar legitimar um processo autocrático.
Por Chris Lang, correio eletrônico: chrislang@t-online.de