Soberania alimentar e a nova ´descoberta´ da biodiversidade

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Há milhares de anos que, em especial as mulheres, mas também os homens de diferentes povos em várias partes do mundo têm garantido a soberania alimentar, baseando-se na biodiversidade das regiões onde vivem. Com sabedoria, souberam distinguir e utilizar sementes, raízes, frutas, folhas, árvores, arbustos, plantas medicinais, animais, peixes e muito mais.

Mas o nosso mundo chamado de moderno conseguiu reduzir de forma drástica a riqueza da biodiversidade, introduzindo monoculturas em larga escala para a produção de alimentos e produtos como madeira.

Enquanto os defensores do modelo monocultural argumentam que o mesmo tem produzido mais grãos e mais comida, constata-se que o mesmo tem reduzido a soberania alimentar.

Parece curioso que nas últimas décadas e, sobretudo, mais recentemente, a biodiversidade ganhou novamente o interesse das grandes empresas que tanto defendem a monocultura e contribuem em muito para reduzir a biodiversidade. Porque será?

Além do patenteamento das sementes, em curso há anos, mais recentemente, também outros elementos da biodiversidade estão na mira do grande capital, na medida em que esses elementos ficam mais escassos, como água, a regulação do clima, a conservação do solo, etc.

Neste boletim, os diversos artigos têm a ver com essa nova ameaça da ´redescoberta´ da biodiversidade por parte das empresas transnacionais, por exemplo, quando querem vender serviços ambientais. Isso pode gerar profundos impactos sobre a vida das pessoas, como mostra o projeto da empresa da Grã Bretanha New Forests Companyque atua em Uganda, e é até certificada pelo selo verde do FSC. Para essa empresa plantar suas monoculturas de árvores, ela expulsou nada menos que 22 mil pessoas, de olho na venda do serviço ambiental de carbono, comprometendo drasticamente a soberania alimentar de toda uma população.

Dedicamos este boletim às populações que resistem à tentativa de mercantilização da natureza e buscam defender seus territórios com toda sua biodiversidade. Apoiamos a Via Campesina que, neste mês de outubro, junto a outras organizações, pressionaram a FAO, em Roma, em especial a Comissão de Segurança Alimentar Global, para que seja banido o ´land grabbing ´ (uma forma particular de grilagem de terras muito praticada atualmente na África), a apropriação e concentração de terras nas mãos de investidores, estados e empresas estrangeiras, que ocorre, sobretudo, na África. Esse processo perverso incentiva a agricultura monocultural , os agrocombustíveis e a apropriação e venda de serviços ambientais. Segundo Oxfam, cerca de 227 milhões de hectares de terras já estariam vendidos ou dados em concessão, o que equivale a uma área do tamanho do Noroeste da Europa, mostrando a profunda injustiça social e ambiental desse modelo. Reforçamos o apelo para que a FAO tome medidas que garantam os direitos dos camponeses a suas terras e aos recursos naturais!

Finalizamos com uma boa notícia que nos motiva e anima: parabenizamos a entidade aliada GRAIN, uma das organizações que há muitos anos alerta para a destruição da biodiversidade e que defende a soberania alimentar. GRAIN ganhou o Prêmio Nobel Alternativo ( Right Livelihood Award ) por seu trabalho contra o ´ land grabbing ´ e em defesa da agricultura camponesa.