O processo de certificação para camarão orgânico no Equador é incentivado pela Naturland, certificadora alemã que, a partir de 1996, iniciou processos para certificar empresas de camarão no país e para conseguir o credenciamento de um selo verde com o intuito de permitir os empresarios exportadores ingressarem a mercados com melhores preços e padrões de qualidade. Os principais mercados de camarão orgânico são Alemanha, Suíça, França e Reino Unido.
No Equador existem cerca de mil hectares de tanques de camarão certificados. Parte do processo de certificação precisa do cumprimento não só das normas Naturland- realizadas com apoio da GTZ-, como também da legislação nacional e ainda da consecução de benefícios sociais decorrentes desta atividade.
A certificação é considerada por alguns setores ambientalistas como um espaço para promover a participação de múltiplos setores- ONG, setor privado e setor governamental- embora a participação das comunidades envolvidas no processo apareça como algo secundário. Segundo eles, em decorrência da certificação ambiental no Equador, vários são os benefícios potenciais: acesso aos mercados, custos reduzidos, benefícios sociais e aumento de empregos.
* Acesso aos mercados: “esperam atrair consumidores verdes que pagarão preços mais altos por produtos que garantirem impactos ambientais mais baixos em seus processos de produção”. Porém, a maioria dos consumidores alemães da empresa Deutsche See, que vende camarão “ecológico” desde 2003 provindo das granjas camaroneiras certificadas pela Naturland, e que é o maior fornecedor de peixe da Alemanha, nem sequer sabe que 40% provém de aqüiculturas, acredita que estão comprando peixe silvestre, supondo inclusive que, existe um respeito do meio ambiente, das comunidades e das leis do país de origem do produto. Nada disso acontece na prática.
* Custos reduzidos por economizarem na compra de agroquímicos e conseguirem benefícios para as empresas, tais como “relações menos conflitantes com os trabalhadores, comunidades locais e grupos ambientalistas, redução da erosão e outros benefícios ambientais e econômicos”. As vantagens comparativas de produzir no Sul também reduzem os custos já que há menos regulamentação ambiental, a mão de obra é barata. Mas não são considerados os custos ambientais devidos à destruição dos manguezais que resultam em uma dívida ecológica muito mais alta gerada por esta atividade exportadora.
* Benefícios sociais: “a redução de químicos tóxicos, o fornecimento de equipamento de trabalho básico para os trabalhadores, a construção de infra- estructura sanitária básica e a provisão de áreas de recreação e serviços sociais trouxe melhoras para o bem- estar e produtividade dos trabalhadores. Estes benefícios são vivenciados pelas comunidades locais”. No caso das piscinas de camarão não fica evidenciada esta melhora para as comunidades locais, que continuam enfrentando a restrição de terra disponível para os agricultores, a perda do livre aceso ao remanescente dos manguezais, a perda de recursos aquáticos, significando, então, a redução de suas receitas e a perda de qualidade de vida.
* Aumento de emprego: “O crescimento das exportações vem gerando maior número de empregos”, é uma afirmação que no caso da atividade camaroneira não coincide com a realidade. Em decorrência da crise do setor, o número de trabalhadores diminuiu e o nível de emprego das piscinas camaroneiras é bastante baixo, já que, além de se tratar de um emprego temporário, em geral, não são contratados trabalhadores locais e as condições de trabalho não são as melhores. Se confrontarmos esta afirmação com o número de empregos perdidos pela destruição do manguezal e pelas conseqüências sobre a pesca tradicional, atividades que eram realizadas familiarmente, para a indústria camaroneira o saldo é negativo.
Esta visão a respeito dos benefícios potenciais da certificação não leva em consideração que, ao serem fomentadas estas atividades para a exportação, ao apostarem neste modelo anda-se em detrimento da soberania alimentar. A exportação de camarão, palma, banana, florícola tem mostrado seus efeitos negativos no país.
A certificação de piscinas camaroneiras não tem promovido benefícios nem sociais nem ambientais, as áreas de mangue reflorestadas não foram revertidas ao ecossistema e ainda subsistem problemas com as comunidades lindeiras que não têm livre acesso às áreas de mangue remanescentes e que, ainda por cima, não foram consultadas.
As normas e procedimentos empregados nos processos de certificação não são transparentes, a informação não é pública, não tem havido consulta, nem cumprem com a legislação nacional.
Na prática, os grandes empresários se beneficiam com um discurso verde que não corresponde, porém, ao que acontece no setor, nem sequer ao cumprimento das normas que estão obrigados a seguir para obter a certificação. Estão mais preocupados por limpar sua imagem.
A certificação responde exclusivamente à questão de os consumidores do norte pretenderem garantir um alimento “mais limpo”, sem se importarem em melhorar as condições dos ecossistemas de manguezal e das comunidades locais.
O modelo de desenvolvimento em que se baseia a certificação privilegia as exportações de produtos para satisfazer o consumo dos países industrializados e não para melhorar a produção para o mercado nacional, mesmo que seja à custa de destruir os ecossistemas, de deslocar as populações e de pôr em risco os usuários ancestrais dos ecossistemas litorâneos.
Por: Ricardo Buitrón C., endereço eletrônico: manglares@accionecologica.org . Versão resumida do relatório "Certificación de camarón orgánico. Sello Verde a la impunidad", disponível em: http://www.wrm.org.uy/paises/Ecuador/camaron.html