Apoie esta declaração de mulheres contra o REDD e os mercados de carbono!

Mulheres indígenas, camponesas e afrodescendentes de diferentes países da América Latina estão convocando organizações e movimentos sociais de todo o mundo a assinarem esta declaração que rejeita projetos de mercado de carbono em seus territórios.


ASSINE A DECLARAÇÃO AQUI

NÃO ao REDD+:
Declaração do Encontro de mulheres que resistem aos mercados de carbono e lutam em defesa de seus territórios 

Território Ka'apor Alto Turiaçu, Brasil, setembro de 2025

Mulheres que levantam a voz, que semeiam coragem e regam a terra com resistência.
Somos raízes firmes que sustentam a vida, guardiãs da memória e da esperança.
Cada passo é um grito de liberdade, que a união entre nós seja sempre a maior arma contra as injustiças.
Seguimos lado a lado, de punhos erguidos, defendendo a terra, a água, a vida e a dignidade dos nossos povos


Nós, mulheres defensoras de territórios coletivos de diferentes países da América Latina, reunidas na Terra Indígena Alto Turiaçu - Aldeia Ararorenda do povo Ka'apor, no estado do Maranhão, Brasil, entre os dias 9 e 12 de setembro de 2025, apresentamos nossa posição em relação ao mercado de carbono e aos mecanismos de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD+) que avançam e ameaçam nossos territórios.

Considerando que:

    1. Nossos territórios e florestas foram cuidados e protegidos ancestralmente por nossos avós, e continuamos a protegê-los de todas as ameaças que governos e empresas privadas nos impõem.

    2. Hoje os governos estão abrindo caminho para o negócio de créditos de carbono, colocando um preço em nossos territórios e florestas.

    3. Nossos territórios são sagrados e não colocamos preço ao que nos dá vida.

    4. Governos e empresas que alegam proteger e reduzir a poluição por meio de compensações de carbono e REDD+, na verdade, sob a lógica da compensação, permitem a expansão e a legitimação da pilhagem associada à extração de minerais, hidrocarbonetos, agronegócios (como pecuária e plantações), projetos de infraestrutura, exploração madeireira e outras atividades. Eles assinam contratos de longo prazo que nos privam do acesso aos nossos territórios, água, alimentos e medicamentos para nossas famílias e comunidades.

Portanto, se realmente querem reduzir sua poluição, desmatamento e degradação florestal, reiteramos o que insistentemente exigimos de nossos governos e empresas:

    1. Parem de poluir rios com mineração, parem de desmatar florestas com suas atividades extrativas em nossos territórios e áreas protegidas e parem de nos culpar como se fôssemos uma ameaça de desmatamento.

    2. Permitam que florestas degradadas por atividades extrativas sejam restauradas naturalmente, reduzindo verdadeiramente a poluição.

    3. Garantam processos justos de compensação, restauração e reparação para nossos povos, comunidades e territórios historicamente afetados pelo extrativismo, seja ele capitalista ou de governos desenvolvimentistas que se apresentam como de esquerda.

    4. Parem de colocar um preço na natureza e de lucrar com a vida dos nossos povos e de todos os seres vivos que precisam de florestas e água para sobreviver, porque sem florestas livres, não podemos viver.

    5. Parem de nos enganar com contratos, políticas e projetos REDD+, créditos de carbono e outras "soluções verdes", soluções baseadas na natureza, etc., alegando com isso proteger o que já protegemos, enquanto continuam a poluir, desmatar e mercantilizar nossos territórios ao redor do mundo.

    6. Cumpram a Consulta Livre, Prévia e Informada e de boa-fé, sem nos dividir, respeitando nossos próprios procedimentos de consulta e sem corromper organizações para que possam avançar com projetos alheios às nossas comunidades.

    7. Garantam o direito aos territórios para quem efetivamente os protegem: promovam a regularização fundiária em todos os nossos territórios, por meio da demarcação e homologação de terras indígenas, da titulação de comunidades quilombolas, da reforma agrária com assentamentos coletivos para camponeses e do reconhecimento de territórios de uso comum, entre outras medidas necessárias para que se respeite esse nosso direito.

    8. Fortaleçam territórios já regularizados que ainda enfrentam conflitos com empresas agroindustriais, petrolíferas ou mineradoras, assegurando a retirada dessas atividades de seu entorno e garantindo o acesso a outros direitos fundamentais que permitam a plena sobrevivência, produção e reprodução da vida no território.

Por fim, afirmamos que o REDD+ não é uma solução; é uma proposta ilusória e falsa porque é um negócio que mercantiliza a natureza, onde intermediários lucram, empresas e governos continuam poluindo, e somos privadas de nossos territórios, que são nossa força vital.

Por todas essas razões, nós, mulheres defensoras de nossos territórios, expressamos nossa veemente rejeição a todas as formas de REDD+ e nos declaramos prontas para lutar em defesa de nossas vidas!

REDD+ JAMAIS!

ASSINAM:
- Tuxa Ta Pame - Conselho de Gestão Ka'apor, Brasil
- Jumu'eha Renda Keruhu - Centro de Formação Saberes Ka'apor, Brasil
- Coordinadora Nacional de Defensa de Territorios Indígenas Originarios Campesinos y Áreas Protegidas (CONTIOCAP) - Bolívia
- Comité Defensor de la Vida Amazónica en la cuenca del Río Madera (COMVIDA) - Bolívia
- Organización Comunal de la Mujer Amazónica (OCMA) - Bolívia
- Associação das Mulheres Munduruku Wakoborun - Brasil
- Tejido Unuma De La Orinoquia - Colômbia
- Red de Mujeres Indígenas Tejiendo Resistencias - Perú
- Associação dos Moradores do Baixo Riozinho e Entorno (ASMOBRI) - Brasil
- Aty Ñeychyrõ - Argentina
- Associação dos Moradores Agroextrativistas do Assentamento Acutipereira (ASMOGA) - Brasil
- Associação dos Moradores Agroextrativistas do Assentamento Peaex Acangata - (ASMOGAC) - Brasil
- Associação Indígena Extrativista da Aldeia Akamassyron Surui Aikewara- Brasil
- Associação dos Pescadores São José de Icatu Quilombola - Brasil
- Coletivo de Mulheres Flor da Roça, Quilombo São José de Icatu - Brasil

 

Escutar quem luta no território contra as monoculturas de árvores

Este Boletim traz o depoimento de movimentos e comunidades de diferentes partes do mundo que resistem a esse tipo de monocultivo e que lutam em defesa da vida. Escutá-los é fundamental. Esses relatos descortinam a realidade por trás desses projetos e arrancam a máscara de ´sustentabilidade´ que seus promotores se esforçam em construir. Os impactos diários que provocam no ambiente, na cultura e na vida dessas comunidades, em especial na das mulheres, não deixam dúvidas: as monoculturas de árvores são um braço do capitalismo patriarcal, racista e colonial. (1)

Em pleno 2025, empresas européias de monocultura de árvores de seringueiras e de dendê, como a Socfin, (2) seguem instaladas em diversos países da África em áreas de onde comunidades inteiras foram expulsas. Seguem privando os habitantes de tais comunidades de acessarem as terras onde eles antes cultivavam alimentos e de onde coletavam dendê nativo, atividades essencialmente femininas. Funcionários dessas empresas condicionam por sexo a entrada das mulheres nessas áreas para que elas possam colher dendê em seu próprio território ancestral, mas agora cercado e protegidos por seguranças da empresa. (3) Como chamar isso senão de capitalismo patriarcal, racista e colonial? 

A Suzano Papel e Celulose, a maior empresa mundial desse setor (4), ocupa 2,7 milhões de hectares no Brasil. Essa área poderia abrigar cerca de 100 mil famílias de camponeses por meio da Reforma Agrária, mas é destinada a uma única empresa que devasta o ambiente, concentra terra e dinheiro. (5) Processos como esse de expansão das empresas, muitas vezes são marcados pela grilagem e pela expulsão de famílias de camponeses dessas terras. As mulheres que vivem em áreas que disputam a terra com empresas como essa, têm que arcar de forma direta com os impactos desses desertos verdes que matam toda a vida ao seu redor e secam nascentes e rios com suas raízes sedentas. Entre outras coisas, são expostas a uma sobrecarga de trabalho, já que precisam se locomover cada vez mais longe em busca de água e de alimento para suas famílias e comunidades. É por isso que as mulheres do MST denunciaram durante suas recentes manifestações que a "Suzano planta fome" (6). Sem falar nas ameaças que sofrem por denunciarem e resistirem. Como chamar isso senão de capitalismo patriarcal, racista e colonial? 

Como o impacto dessas monoculturas de árvores é sentido especialmente pelas mulheres, muitas vezes são elas também que lideram as organizações comunitárias e a defesa de seus territórios. (7) (8) Este Boletim toca de perto nesse tema ao percorrer diferentes territórios em disputa com multinacionais do dendê, da borracha e do eucalipto. Pisa sobre a terra das comunidades que resistem às monoculturas de árvores. Traz relatos de quem viu de perto a chegada desses empreendimentos e seus impactos. São textos escritos por lideranças de comunidades e por movimentos organizados sempre vindos de locais onde se luta intensamente contra esse modelo de extrativismo e onde as mulheres se levantam em defesa da natureza como fonte de vida e em defesa de suas comunidades. 

O primeiro artigo nos leva à Indonésia. Os autores, do movimento de resistência Fórum de Camponeses do Plasma de Buol (FPPB, pela sigla em inglês), que luta contra a multinacional de dendê PT Hardaya Inti Plantations, nos contam como foram enganados por falsas promessas que os levaram a aceitar esquemas de parceria com empresas em um programa apelidado pelo governo de `Plasma´. O resultado: escassez de alimentos, dívidas e ameaças de enchentes trazidas pelos monocultivos de dendê que impactam de forma específica às mulheres. Hoje se organizaram para enfrentar essa armadilha e lutar pela recuperação das terras e seu modo de vida tradicional.  

Integrantes do movimento Território de Vida, Interétnico e Intercultural de Cajibío (TEVIIC), da Colômbia, nos contam no segundo artigo como uniram povos indígenas e camponeses nesse movimento para enfrentar uma das maiores multinacionais do mundo na produção de papel e papelão: a Smurfit Westrock. Organizados, lutam para avançar com a Reforma Agrária a partir da autonomia e da retomada de terras usurpadas pela empresa. 

terceiro artigo traz o depoimento de duas mulheres de movimentos de camponeses em luta pela terra, uma da Tailândia e outra do Brasil. Em ambos os casos, as mulheres têm protagonismo na luta pela ocupação de áreas que conseguiram arrebatar de gigantes do setor. Onde antes havia apenas monocultivo de árvores, agora, pelas mãos delas, abrem-se espaços para o plantio de alimentos agroecológicos. 

Por fim, o quarto artigo nos leva até a Libéria. Uma entrevista exclusiva com duas lideranças do clã Joghban traz detalhes das diversas violências que viveram com a chegada das multinacionais da borracha, a LAC-Socfin, e do dendê, a Equatorial Palm Oil - antiga LIBINC. Mas o foco da entrevista é, sobretudo, como as mulheres e homens, articulados, conseguiram uma vitória histórica: retomar e ter reconhecido parte de seu território tradicional invadido por uma dessas empresas.

Embora  os impactos desses monocultivos de árvores estejam registrados nos artigos que aqui trazemos, a partir das palavras daqueles que os vivem na pele, este não é apenas um Boletim de denúncia. É sobretudo um Boletim para alimentar a esperança. É uma amostra de que a resistência contra os monocultivos de árvores - e o modelo que representam - pulsa forte no Sul Global, especialmente entre as mulheres. Colocar lado a lado essas resistências nas páginas que seguem é também um esforço de aproximar lutas e povos que, apesar das diferenças e das distâncias geográficas, trazem semelhanças históricas e objetivos comuns: dizem não ao monocultivo de árvores e sim à autonomia das comunidades. 

Boa leitura!


Referências:

    (1) WRM, Monoculturas de árvores.
    (2) WRM, 2017. As plantações da SOCFIN na África: no mínimo, irresponsáveis, mas sobretudo violentas e destrutivas 
    (3) WRM, 2020. Vídeo: A violência e o abuso sexual contra mulheres em plantações industriais de dendê DEVEM ACABAR
    (4) Rede Alerta contra os Desertos Verdes, 2023. O que você precisa saber sobre a empresa Suzano Papel e Celulose.
    (5) WRM, 2025. Contra o capital e o patriarcado, mulheres do MST realizam jornada de luta e ocupam plantações de eucalipto da Suzano, no Brasil  
    (6) MST, 2025. Mulheres Sem Terra interditam via de acesso à Suzano no Maranhão. Mulheres Sem Terra interditam via de acesso à Suzano no Maranhão - MST
    (7) WRM, Mulheres e monoculturas de árvores
    (8) WRM, 2018. B 236 Women, tree plantations and violence: building resistances

 

O TFFF: Uma nova armadilha para povos e florestas do Sul Global

O Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês) será lançado na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre o Clima (COP30), em novembro. Esta iniciativa é apresentada como uma "nova esperança" para as florestas tropicais em todo o mundo. No entanto, o TFFF não visa enfrentar as causas do desmatamento que destroem as florestas e ameaçam seus povos e comunidades tradicionais. Pelo contrário, a iniciativa recorre ao mercado financeiro, que impulsiona o desmatamento.