Através do Decreto de Gabinete 123, do dia 4 de dezembro de 2002, o governo do Panamá resolveu "dispensar o Ministério de Obras Públicas (MOP) do requisito de seleção de empreiteiras, autorizando-o a contratar diretamente a empresa CUSA (Construtora Urbana S.A.) para o desenho, financiamento e construção do caminho ecológico Boquete-Cerro Punta". Trata-se da construção de uma estrada, pelo Passo do Respingo, que atravessaria os parques Nacional Vulcão Barú e Internacional A Amizade, dessa forma vulnerando o status de proteção da região. O caminho está na rota da Senda dos Quetçais e, segundo a empresa, tem um custo de 7,5 milhões de dólares. A explicação apresentada para a contratação direta é a urgência de se aproveitar a estação da seca.
O projeto tem história. Começa em 1980-81, em função de interesses pessoais que não conseguiram vingar. No ano 1991, o então ministro de Obras Públicas mandou abrir com um buldôzer uma azinhaga de um quilômetro no meio do Parque Nacional, partindo do Respingo e passando pela Senda dos Quetçais. O governador interveio e conseguiu barrar a medida. O Executivo, então, entrou com um anteprojeto de lei na Assembléia Legislativa, declarando a construção dessa estrada "de interesse público". Foi feita ainda uma nova tentativa, em 1992, impulsionada por uma série de interesses privados, figuras de destaque do governo, proprietários de fazendas cujo valor aumentaria significativamente com a construção da estrada.
Embora o Colégio de Geógrafos Profissionais tenha feito um estudo da rota proposta, apontando o fato dela não ser aconselhável por causa das encostas e da geologia do local, insiste-se novamente nessa proposta, sem qualquer debate público nem transparência na manipulação da informação, e sem ao menos contar com um estudo de impacto ambiental objetivo. No decorrer desses anos todos, foram apresentadas alternativas para a rota, recomendando a construção de um caminho por Cuesta de Piedras, no lado sul do vulcão Barú, o qual beneficiaria uma série de comunidades isoladas.
Os estragos causados pela abertura de estradas nesses lugares de extrema fragilidade são desastrosos, pela compactação, diminuição da infiltração e acentuado aumento na escorrência superficial, provocando mudanças no regime hídrico que envolvem risco de inundação nas áreas baixas (é o caso de Boquete, possuidor de um histórico de enchentes em 1969, 1970, 1990, 1991, 1995 e 2000).
A Iniciativa da Sociedade Civil para o Ambiente (ISCA) - uma rede que congrega várias associações ambientalistas e de direitos humanos - está muito interessada em que se esclareça a forma de agir, se defina o que está por trás disso tudo e se continue com o devido processo, a fim de avaliar o custo-benefício real da abertura de uma estrada no local proposto. Também sugere que aqueles que conhecem bem o Parque Nacional Vulcão Barú poderão dizer que, entre os potenciais beneficiários da construção da estrada, existem várias pessoas integrantes do atual governo que possuem terrenos no local, cujo valor aumentaria significativamente com a construção da estrada.
A ISCA pergunta: "E o Plano de Manejo do Parque Nacional Vulcão Barú que está sendo financiado pelo Projeto do Corredor Biológico Meso-americano do Atlântico Panamenho? Essa questão não foi incluída nos parâmetros de discussão do Plano de Manejo... quer dizer que todo esse investimento e trabalho realizados até agora para a elaboração desse Plano de Manejo devem ser feitos de novo? E a Reserva da Biosfera de Chiriqui-Bocas del Toro, anunciada com tanto entusiasmo no ano passado? E os deslizamentos e problemas que afetarão a qualidade e o caudal das águas que alimentam as hidrelétricas da região? E a perda de mais florestas nuviosas, que estão entre os ecossistemas mais ameaçados da Mesoamérica? E o valor dos quetçais e outras espécies ameaçadas? E as espécies endêmicas de aves e a flora das terras altas?
Artigo elaborado a partir de informação enviada por Felipe Carazo, TNC - La Amistad Project, correio eletrônico: fcarazo@TNC.ORG