Desde 1995, o movimento indonésio de ONGs vem apoiando o manejo florestal comunitário (MFC). A principal mensagem transmitida na fase inicial foi que a maior parte dos modelos de manejo florestal comunitário implementados de forma sustentável fundava-se na sabedoria, cultura e hábitos da comunidade.
Na Indonésia, a cultura e os costumes das comunidades da floresta são influenciados pelo contexto exterior, inclusive por fatores como a tecnologia, as prescrições públicas e as tendências da cultura mundial. A globalização e o desenvolvimento incrementaram a influência da cultura mundial nas comunidades tradicionais, as quais, quase sempre, habitam áreas afastadas. De modo geral, esses novos padrões culturais são mais materialistas e individualistas do que a cultura e os hábitos comunitários existentes. O modelo de MFC, outrora aplicado com espírito comunitário (tanto em terras da comunidade quanto em propriedades privadas), voltou-se para o individualismo, foi passando do ritualismo ecológico para uma orientação pecuniária. No tocante à terra e às florestas, os valores sociais, culturais e tradicionais estão mudando lenta mas firmemente rumo à comercialização.
Essa mudança para o individualismo e materialismo pode ser percebida no aumento dos conflitos por terra, florestas e outros recursos entre membros da mesma comunidade. O conflito acontece porque as rápidas mudanças estão modificando a cultura de dotação e manejo da terra.
Nem todas as comunidades mudaram conforme a descrição acima, mas acho que, mais dia, menos dia, todos os grupos comunitários (inclusive as comunidades indígenas e tradicionais) seguirão esse caminho.
O que deveriam fazer as ONGs que apóiam o manejo florestal comunitário?
Cientes da situação, a pergunta é: o que devemos fazer? Devemos continuar promovendo o antigo modelo de MFC, devemos procurar um novo modelo, ou devemos voltar ao modelo convencional (de sistemas estatais de manejo da terra)?
A meu ver, devemos promover o modelo de MFC, mas melhorado. Essa afirmação funda-se em três aspectos. Em primeiro lugar, na Indonésia, o sistema de gestão governamental não é bem gerenciado, motivo pelo qual não seria possível implementar, de maneira apropriada, o manejo florestal estatal. Caso o governo tente mais uma vez forçar as comunidades a adotar o modelo de manejo estatal, multiplicar-se-ão os conflitos pelo manejo dos recursos naturais entre comunidades, governo e o setor privado. Também, aumentarão a corrupção, os conluios e o nepotismo no setor florestal, o que, em última instância, acelerará o processo de destruição das florestas. Em segundo lugar, as comunidades locais que habitam as florestas, ou suas adjacências, possuem uma história que as liga à região e faz com que sejam mais responsáveis pela conservação das mesmas. Em terceiro lugar, as comunidades locais possuem conhecimentos indígenas, os quais podem ser a base para alcançar um manejo sustentável das florestas.
Por todos esses motivos, o movimento em prol do MFC na Indonésia ainda deverá enfrentar muitos desafios. A fim de evitar falsas hipóteses e ações inapropriadas, os partidários do movimento para o manejo florestal comunitário devem ter clareza quanto às tendências da mudança cultural no seio das comunidades rurais.
Entre os obstáculos com os quais nos deparamos ao enfrentar os desafios do desenvolvimento do MFC, estão os seguintes:
1. O enfraquecimento das instituições locais (em especial, a falta de mecanismos para a solução de conflitos e de sistemas de aplicação de normas vigentes)
Segundo a nossa experiência, é difícil, para as instituições locais, se adaptar às mudanças e novas oportunidades. Existem muitos grupos comunitários que não sabem lidar com mudanças. Isso provoca muitos conflitos internos que ficam sem ser resolvidos. Também percebemos um enfraquecimento muito grande do sistema de aplicação. Com freqüência, os grupos pedem ao governo que resolva seus conflitos, mas o próprio governo tem pouca ou nenhuma capacidade para a solução de conflitos.
2. Os limites da tecnologia e a metodologia para o MFC
Na Indonésia, quase todas as atividades de manejo são realizadas através de investimentos e operações em grande escala. O modelo de manejo florestal comunitário baseia-se em abordagens em pequena escala e pequenos investimentos. A maior parte da tecnologia e metodologia de manejo florestal disponível na Indonésia é apropriada apenas para operações em grande escala, envolvendo construção de estradas, equipamento pesado, produção de grandes quantidades de madeira, etc.
Para o nosso projeto de construção de uma serraria comunitária, tivemos que trazer equipamento de fora, pagando por ele um preço muito alto. Por outro lado, em se tratando de manejo florestal em pequena escala, com freqüência, é difícil achar soluções técnicas para problemas como a definição do corte anual permitido, revezamento, fertilização, etc. A maior parte dos expertos disponíveis costuma trabalhar com o modelo em grande escala, mas não com a exploração florestal comunitária em pequena escala. Tivemos experiências similares durante o processamento e administração de recursos da rota. Em suma, não contamos com tecnologia e metodologia apropriadas para apoiar o MFC na Indonésia, onde as comunidades querem produzir para um mercado mais amplo.
3. Falta de sistemas de apóio
É necessário um sistema de apóio que ajude as comunidades a ter acesso à informação de mercado e treinamento, contar com serviços de assistência técnica, obter facilidades creditícias e elaborar uma regulamentação de apóio. Para possibilitar o sucesso do manejo florestal comunitário, é necessário reordenar o sistema de serviços públicos da Indonésia, a fim de que o mesmo satisfaça essas necessidades e desenvolva as capacidades técnicas necessárias, para apoiar o manejo florestal comunitário em pequena escala.
Por: Ade Cahyat, East Kalimantan Foundation for Supporting CBFM (SHK Kaltim); correio eletrônico: cahyat@samarinda.org