Poucos lugares no Sudeste Asiático podem superar Palawan, nas Filipinas. Ali, há sete áreas protegidas, uma que foi declarada “Refúgio de animais selvagens e Santuário de Pássaros” em 1967 e uma “Reserva de Mangue” desde 1981. A UNESCO declarou toda a província uma “Reserva do Homem e da Biosfera” em 1990.
Hoje, além do impacto negativo da mineração de níquel, os povos indígenas e agricultores de terras baixas estão diante das ameaças representadas pelos projetos de dendê. A maior parte dessas operações está sendo realizada pela Palawan Palm & Vegetable Oil Mills Inc. (PPVOMI) e a empresa Agumil Philippines Inc., do mesmo grupo. Atualmente, cerca de 15 mil hectares de terras estão sendo convertidos em plantações de dendezeiros. A Agumil Philippines Inc. é 75% filipina e 25% de propriedade malásia. A propriedade da PPVOMI é 60% de Cingapura e 40% filipina. As empresas começaram a operar oficialmente em janeiro de 2006.
De acordo com o governo da província, as monoculturas de dendê vão erradicar a pobreza e reduzir a dependência econômica de óleos comestíveis importados. Mas, da perspectiva dos povos indígenas locais, a expansão do dendê é uma tragédia, já que destrói suas terras ancestrais e seus produtos florestais, empobrecendo-os a um nível sem precedentes.
Recentemente, nativos palawans decidiram tomar o assunto em suas próprias mãos e construir vínculos de solidariedade com as comunidades afetadas pelo dendê em Mindanao. Uma importante reunião entre comunidades afetadas pelo dendê em Higaonon e Palawan ocorreu em Malaybaly (província de Bukidnon, Mindanao) em 21 e 22 de junho de 2013. Ela foi coordenada pela rede nacional ALDAW (Ancestral Land/Domain Watch) e pelo Father Vincent Cullen Tulugan Learning and Development Centre (FVCTLDC). A reunião resultou em uma resolução conjunta de Palawan/Mindanao contra o desenvolvimento do dendê.
A chamada “resolução de Malabalay” foi apoiada por mais de 100 mil assinaturas coletadas com a ajuda da ONG Rainforest Rescue, com sede na Alemanha, e apresentada às autoridades governamentais. Como resultado, aconteceu uma reunião entre agências em 7 de agosto, em Palawan, no gabinete governador. A reunião teve a participação de todos os órgãos governamentais envolvidos em nível provincial, bem como de ONGs e delegações de povos indígenas e agricultores.
Perto do final da reunião, quando um dos moderadores perguntou abertamente se os participantes eram favoráveis a uma moratória na expansão do dendê, a maioria disse SIM. A exceção a esta maioria foi, naturalmente, as empresas de dendê e representantes do Conselho para o Desenvolvimento Sustentável de Palawan, que, no passado, ficou do lado de grandes empresas, incluindo mineradoras.
Posteriormente, ocorreu uma reunião entre agências governamentais sobre o dendê, em Palawan, em 28 de agosto, no gabinete do governador, com a participação de representantes de organizações dos Povos Indígenas (incluindo a ALDAW e a NATRIPAL/Tribos Unidas de Palawan) e também de ONGs locais.
A ALDAW e a NATRIPAL apresentaram suas conclusões, mostrando que o desenvolvimento do dendê em Palawan tem ocorrido sem monitoramento por parte das autoridades competentes. Como resultado disso, na ausência de mapas, é impossível para o governo determinar sistematicamente a propriedade, a elevação, a classificação de terras, etc, da área em que os dendezeiros estão sendo plantados.
A apresentação da ALDAW também apontou que deveria ter sido estabelecida uma equipe de monitoramento formada pelos vários interessados, relativa às plantações de dendezeiros em Palawan. Mas, até agora, depois de mais de sete anos de funcionamento, as organizações indígenas e as ONGs não têm qualquer pista sobre a composição dessa equipe e os resultados (se houver) das inspeções que ela realizou em cada município impactado pelo dendê. Tampouco foram fornecidas informações aos membros da sociedade civil sobre os resultados (se houver) das atividades de acompanhamento feitas pela equipe sobre o impacto da planta de processamento de óleo de dendê no ar e na água e sobre gestão e eliminação dos resíduos das plantações industriais pela PPVOMI-Agumil.
Com referência específica ao impacto do desenvolvimento do dendê na biodiversidade, a ALDAW também apontou que Palawan tem uma das últimas áreas contíguas de floresta nas Filipinas. As plantações de dendezeiros estão rompendo a contiguidade entre ecossistemas diferentes e inter-relacionados, como floresta montanhosa, floresta de baixada, arbustos e pastagens, zonas úmidas, etc, causando impacto sobre as espécies animais que se movimentam e prosperam em diferentes nichos ecológicos, bem como sobre a integridade de cada nicho específico.
Outro ponto importante que foi levantado está relacionado a procedimentos que levaram à emissão de Certificados de Autorização Ambiental pelo Departamento do Meio Ambiente e Recursos Naturais (DENR) para a Agumil e a PPVOMI. A ALDAW esclareceu que os Certificados de Conformidade Ambiental são documentos que comprovam que o responsável por um projeto cumpriu as normas ambientais e estipula as condições que ele deve cumprir. Em vez disso, a DENR emitió os Certificados de Autorização Ambiental apesar do fato de que os procedimentos apropriados não foram observados e sem qualquer relatório técnico da Agumil e PPVOMI mostrando que as normas ambientais seriam cumpridas. Mais importante, a ALDAW apontou que a Agumil e a PPVOMI nunca tinham recebido do DENR uma “autorização para cortar árvores” e, portanto, violaram o Código Florestal Revisado P.D.705 de 1987, e legislação ambiental em vigor.
A alegação da Agumil segundo a qual o desenvolvimento do dendê está contribuindo para erradicar a pobreza foi questionada pela ALDAW com alguns dados concretos. O município de Sofronio Española, na verdade, tem o maior percentual de terras (mais de 45%) coberto por plantações de dendezeiros e a maior parte de sua produção vai para a fábrica de óleo de dendê, mas é um município de 4ª classe. De acordo com uma pesquisa de 2008, do Sistema de Monitoramento Comunitário (CBMS), Española tem o Índice de Desenvolvimento Humano mais baixo de Palawan. Também é um dos 100 municípios mais pobres do país. Um relatório da Social Watch de 2007 cita uma taxa de pobreza de 58% para Española em 2006. Sofronio Española também tem uma das maiores taxas de desnutrição na província (22,98%), de acordo com o responsável provincial de ação nutricional.
Durante a reunião, uma postura clara foi assumida pelo Gabinete Provincial de Recursos Ambientais e Naturais (PENRO) oficial contra a Agumil. Leonard Caluya, do PENRO, disse a representantes da Agumil: “Vamos calcular o dano causado pela sua empresa à floresta e isso vai fazer parte do processo judicial contra os senhores. Os senhores conhecem a nossa política, e conhecem suas limitações. Nós [do DENR] nunca lhe permitimos cortar árvores”. Ele lembrou a empresa de que existe uma moratória nacional ao corte de árvores dentro da floresta residual e em áreas madeireiras e que seu gabinete (PENRO/DENR) “vai continuar cumprindo seu mandato com o apoio de ONGs parceiras”. De acordo com Caluya, é provável que o DENR solicite à Agumil, como forma de punição, que elimine os dendezeiros plantados ilegalmente em área florestal e os substitua por espécies de árvores nativas.
A boa notícia é que, como resultado da pressão contínua gerada pela ALDAW sobre as autoridades do governo provincial, diferentes agências já estão se mobilizando para realizar suas próprias avaliações de campo sobre o impacto do desenvolvimento do dendê.
No final da reunião, os representantes dos indígenas e das organizações não governamentais fizeram declarações intensas e firmes. Datu Sangkula, do Non-Timber Forest Exchange Programme, confrontou a Agumil e avisou que “a longa mão da lei vai alcançá-los administrativa ou criminalmente” e também lembrou que “violações da Lei de Direitos dos Povos Indígenas são passíveis de condenação penal, e a empresa será processada por isso”.
No final da reunião, representantes das ONGs e de povos indígenas confirmaram sua exigência de uma moratória da expansão do dendê, pelo menos até que haja dados científicos confiáveis sobre os reais benefícios obtidos a partir do desenvolvimento do dendê em comparação com os custos involuntários do aumento do dióxido de carbono (a partir de áreas de plantio desmatadas), da perda de acesso tradicional à terra e aos recursos, da redução da produtividade da terra, da perda de meios de subsistência tradicionais, etc.
A ALDAW também apontou com muita veemência que é urgente fazer uma revisão séria das plantações de dendezeiros existentes e propostas para avaliar sua atual situação ecológica e a sobreposição entre eles e as áreas que ainda estão conservadas e gerenciadas pelos povos indígenas, bem como de categorias de terra da Rede Ambiental Área Crítica (ECAN) dentro da lei SEP. A menos que essa revisão seja feita, há um alto risco de que a sustentabilidade ambiental e ecológica da província, sua produtividade agrícola e a segurança alimentar das pessoas sejam seriamente comprometidas.
Ancestral Land/Domain Watch (ALDAW), e-mail: aldaw.indigenousnetwork@gmail.com,https://www.facebook.com/Aldaw.network.palawan.indigenous.advocacy