Nos últimos 30 anos, cerca de 15 megarrepresas hidrelétricas foram construídas no Rio Mekong, tanto rio acima, em território chinês, bem como rio abaixo, em Laos, causando morte e destruição num dos maiores rios do mundo, do qual milhões de pessoas dependem para sobreviver. Atualmente oito novas barragens estão sendo projetadas no rio. Um projeto considerado dos mais destrutivos é o da usina hidrelétrica de Phou Ngoy, em Laos. Ao longo do Rio Mekong e Rio Mun, comunidades que lutam contra essa usina alertam que sua conclusão, em paralelo a outros projetos de barragens, significará, de uma vez por todas, a morte do rio Mekong.
O governo da Indonésia, a sua vez, pretende estimular fortemente a construção de mega-hidrelétricas nos próximos anos sob o lema de ´transição verde´. No norte da ilha de Kalimantan, no Rio Mentarang, já começou a construção de uma megarrepresa, a maior da Indonésia, afetando diretamente a sobrevivência de cerca de 10 comunidades indígenas Punan, além de outras 20 que serão indiretamente impactadas. A eletricidade gerada abasteceria outros dois megaprojetos ´verdes´: um parque industrial chamado KIPI localizado na costa e ao nova capital ´verde´ da Indonésia, também com impactos devastadores (1). Além disso, em outras ilhas do arquipélago, mais megaprojetos destrutivos de usinas hidrelétricas são planejados, a exemplo de Papua, com projetos de grandes represas nos rios Mamberano, Warsamson e Muyu.
A experiência de luta e resistência acumulada pelas comunidades na região do Mekong motivou comunidades Punan da Indonésia a visitá-las para trocar experiências ao longo de quatro dias, em fevereiro de 2025. Foram trocas profundas junto a outros ativistas, na certeza de que apesar das muitas diferenças, não há outro caminho senão caminhar juntos como coletivo para enfrentar a nova onda de usinas hidrelétricas que já se iniciou na região.
Por ocasião do dia 14 de março, dia internacional de ação contra as barragens, as comunidades reunidas emitiram a declaração a seguir reafirmando a importância e o compromisso da luta conjunta, mostrando que “estamos unidas e firmes na luta coletiva para defender nossos rios, florestas e futuros das falsas soluções verdes e da ganância empresarial”.
Veja a declaração abaixo e clique aqui para assiná-la.:
(1) Veja mais informações sobre o KIPI e os impactos devastadores da nova capital da Indonésia no Boletim 268 e no Boletim 264 do WRM, respectivamente, disponíveis em WRM.
Declaração conjunta
de comunidades e pessoas que resistem a grandes usinas hidrelétricas
em todo o Sudeste Asiático, na América Latina e no Mundo
Esta é uma declaração de representantes de comunidades do Rio Mekong, na Tailândia, do Rio Mentarang, na Indonésia, e da América Latina, reunidas na Tailândia em fevereiro de 2025 para intercambiar experiências e fortalecer as lutas travadas atualmente contra projetos destrutivos de usinas hidrelétricas. Essas lutas não existem isoladamente. Elas representam e se unem a dezenas de outras que fazem a resistência contra projetos e planos para a construção de grandes hidrelétricas ao longo dos rios da região do Mekong (da China ao Vietnã), em toda a Indonésia (de Papua a Sumatra), em toda a América Latina e em muitas outras partes do mundo.
Neste Dia Internacional de Ação Contra as Barragens, nós, Povos Indígenas e comunidades locais cuja sobrevivência depende dos nossos rios, estamos unidos para rejeitar a falsa alegação de que grandes usinas hidrelétricas são energia limpa.
Por décadas, nossas terras, nossas águas e nossos modos de vida foram sacrificados sob a bandeira do chamado desenvolvimento. As promessas vazias de empregos, prosperidade e energia limpa, resultaram em lares inundados, meios de subsistência destruídos, escassez de peixes e uma devastação ambiental irreversível.
À medida que a crise climática é transformada em arma para acelerar a busca global por energia renovável, reafirmamos, com absoluta clareza e convicção:
Grandes usinas hidrelétricas não são energia limpa. Elas são máquinas de gerar violência, deslocamento e destruição.
Governos, empresas e instituições financeiras continuam impondo projetos destrutivos de hidrelétricas na parte continental do Sudeste Asiático, do rio Mekong ao rio Mentarang, assim como em outros rios vitais na América Latina e no mundo. Esses projetos são fraudulentamente vendidos como energia verde, mesmo devastando rios, florestas e comunidades indígenas. Por trás dessas hidrelétricas estão esquemas poderosos e centralizados de comércio de energia, como a ASEAN Power Grid, a Belt and Road Initiative (BRI) e os Projetos Estratégicos Nacionais da Indonésia – todos promovendo lucros de empresas enquanto prejudicam diretamente comunidades e ecossistemas.
As ameaças vão muito além das hidrelétricas. Em todas as regiões, outros tipos de barragens, incluindo as de rejeitos de minério impulsionadas pela extração implacável de minerais para a chamada economia de baixo carbono, representam graves riscos para comunidades próximas, como foi tragicamente demonstrado pelos rompimentos de barragens em Mariana e Brumadinho, no Brasil. Ao mesmo tempo, barragens de irrigação construídas para atender grandes projetos do agronegócio estão causando graves danos ambientais e sociais, ao mesmo tempo em que aprofundam ainda mais a crise hídrica.
Nós, comunidades unidas no Sudeste Asiático, na América Latina e no mundo, exigimos:
1. O fim imediato do financiamento de usinas hidrelétricas destrutivas e da compra de sua energia.
2. A rejeição a todos os projetos de grandes barragens que devastam rios, forçam o deslocamento de comunidades e aceleram a crise climática.
3. Uma transição energética verdadeira, que tenha as comunidades à frente e esteja enraizada nos direitos delas e fundamentada na restauração ecológica, e não em megaprojetos empresariais.
Estamos unidas e firmes na luta coletiva para defender nossos rios, florestas e futuros das falsas soluções verdes e da ganância empresarial.
14 de março de 2025
ASSINE EM SOLIDARIEDADE
(prazo final 31 de maio)
Initial signatories:
1. Gerakan Selamatkan hutan, tanah dan Manusia Malamoi (Tolak Bendungan Warsamson) — Save Forest, land and Malamoi people movement (Against Warsamson River Dam), Indonesia
2. Hug Chaingkhan Community group, Thailand
3. Hug Mekong Association, Thailand
4. Komunitas Masyarakat Hukum Adat suku Muyu ( Tolak Bendungan kali Muyu) — Indigenous People Muyu Tribe Community (Against Muyu River Dam), Indonesia
5. Living River Association, Thailand
6. MAB (Movement of People Affected by Dams in Brazil)
7. MAR (Movement of People Affected by Dams), Latin America
8. Northeastern Mekong River Protection Network, Thailand
9. Northeastern Network for Natural Resources and Environment, Thailand
10. People’s Network to Protect the Mekong River, Thailand
11. Punan Sekalak Community, Mentarang-Tubu River, North Kalimantan, Indonesia
12. Thai Mekong People in 8 Provinces
13. Southern Peasants' Federation of Thailand (SPFT)
14. Tamui Community-Based School, Thailand
15. Lao Highlander Network
16. Mekong Community Institute Association (MCI), Thailand
17. Ubon Monitoring Group on Flood and Mekong Dams (UMFD)
18. Earthrights international. Mekong
19. ETOs Watch Coalition
20. Focus on the Global South (FOCUS)
21. Human Rights and Environment Association, Thailand
22. Just Energy Transition in Thailand (JET in Thailand)
23. Land Watch Thai
24. Laos Dam Investment Monitor (LDIM)
25. Mekong Energy and Ecology Network (MEENet)
26. Nature care, Thailand
27. NUGAL Institute for Social and Ecological Studies, Indonesia
28. Project SEVANA South-East Asia
29. School of Democratic Economics, Indonesia
30. The Association of Northeast Thailand Community Network in 7 Provinces along the Mekong Basin (ComNetMekong)
31. The Mekong Butterfly, Thailand
32. Towards Organic Asia (TOA)
33. World Rainforest Movement (WRM)