Para as pessoas que lutam por seus direitos em áreas de florestas, a mudança climática parece estar afastada de suas preocupações imediatas. No entanto, saibam ou não, são dos atores mais importantes e comprometidos na proteção do clima da Terra.
Por exemplo, aqueles que se opõem às operações madeireiras industriais em seus territórios podem sentir que sua luta se
trata apenas de direitos e meios de vida. E disso se trata para eles, logicamente. No entanto, detendo as operações madeireiras, também estão evitando a liberação de grandes volumes de emissões de dióxido de carbono –o principal gás de efeito estufa que leva ao aquecimento global- que está bem armazenado na biomassa da floresta. As comunidades que lutam contra grandes barragens hidrelétricas também estão evitando a liberação de grandes volumes de gases de efeito estufa como metano, CO2 e óxido nitroso dos reservatórios de água das barragens, bem como a liberação de CO2 das florestas, que seriam destruídas e de quaisquer outras fontes relacionadas com a construção de barragens.
As comunidades indígenas e outras comunidades dependentes das florestas que confrontam planos governamentais ou corporativos para a “conversão” (destruição) de florestas para agricultura e criação de gado em grande escala, para plantações de dendezeiros e madeireiras, para criação industrial de camarões, para mineração, também estão de fato protegendo o clima do mundo, evitando a liberação de enormes volumes de CO2 e outros gases de efeito estufa na atmosfera.
As comunidades das florestas que confrontam a exploração e explotação de petróleo em seus territórios estão ainda mais diretamente vinculadas ao combate à mudança climática, porque estão fazendo exatamente o que precisa ser feito: evitar a extração -e portanto a queima- de combustíveis fósseis, que são a principal e climaticamente a pior fonte de emissões de CO2 relacionada com o aquecimento global.
Do que antecede fica bastante evidente para qualquer pessoa que tenha conhecimentos mínimos sobre as causas da mudança climática, que as lutas dessas pessoas estão de fato evitando uma maior mudança climática. No entanto, a maioria dessas lutas estão sendo reprimidas e criminalizadas pelos governos que têm assinado e ratificado a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática. Ao mesmo tempo, as corporações que estão diretamente ou indiretamente envolvidas nesses investimentos estão localizadas em países -a maioria do Norte- que também têm assinado e ratificado a Convenção.
A conclusão é obvia: reprimindo essas lutas -ou apoiando as corporações envolvidas no assunto- os governos estão não apenas violando os direitos dos povos locais, mas também uma Convenção das Nações Unidas criada para abordar a ameaça mais séria enfrentada pela humanidade: a mudança climática.
Além disso, muitas das “soluções” apresentadas pelos governos para abordar a mudança climática resultam em impactos sociais e ambientais adicionais que levam à resistência local. Por exemplo, como meio de evitar as reduções necessárias em suas próprias emissões, os países do Norte foram instrumentais na criação de mecanismos para “compensar” suas emissões. Um desses mecanismos promove o estabelecimento de plantações de árvores em grande escala para que atuem como “sumidouros de carbono”. Isso significa promover o mesmo tipo de plantações que já estão sendo resistido por inumeráveis comunidades locais do mundo inteiro. Uma outra “solução” para evitar as necessárias mudanças na produção e no consumo que levam à mudança climática tem sido a promoção de agrocombustíveis -desde milho e soja até dendezeiros e eucaliptos- que também têm evidenciado serem ambientalmente destruidores, resultando portanto em oposição local organizada.
Apesar de que não é fácil estabelecer se essas -e muitas outras igualmente absurdas- “soluções” se originam em representantes governamentais na Convenção sobre Mudança Climática ou em membros de grupos de pressão corporativos nacionais e presentes na Convenção, fica claro que um grande número de corporações e empresários estão beneficiando-se ou planejam beneficiar-se com eles.
A respeito do clima, a atual situação portanto evidencia que aqueles que têm o poder de fazer com que a situação mude –os governos- não querem fazer o que é preciso.
De outro lado, há um grande número de atores que realizam diferentes tipos de resistência em nível local, que se originam em diferentes assuntos, aparentemente afastados do clima, como por exemplo reforma agrária, agricultura em pequena escala, soberania alimentar, direitos dos povos indígenas e tradicionais, igualdade de gênero, direitos humanos, poluição, consumo e muitos outros.
Na maioria –senão todas- dessas lutas há pelo menos algum vínculo com o clima e portanto todos esses diferentes processos de resistência poderiam fazer parte da luta bem mais ampla para evitar a mudança climática. Esse pode ser o vínculo comum para unir movimentos locais, regionais e internacionais sob a égide da mudança climática, para fazer surgir as grandes mudanças sociais e econômicas necessárias para atingir esse objetivo.
Enquanto os governos perdem o tempo –para o deleite das corporações- o futuro da humanidade agora fica nas mãos de seus povos.