Desde 2002, quando todas as concessões de manejo de florestas foram suspendidas, o governo cambojano tem passado a
outorgar Concessões Econômicas de Terras para companhias privadas, principalmente para o desenvolvimento de cultivos
agroindustriais como arroz, mandioca, seringueiras, acácias e agrocombustíveis. Essas plantações estão destinadas não
apenas a gerar receitas para o estado e a desenvolver atividades agrícolas intensivas, mas também a reduzir a pobreza,
promovendo as oportunidades de emprego locais. No entanto, desde o começo, essas plantações em grande escala não
têm cumprido adequadamente esses objetivos e em decorrência disso, o Governo tem estado pressionado para regular e
monitorizar melhor suas operações.
O quadro legal que rege as Concessões Econômicas de Terras se focaliza na Lei de Terras de 2001 e o sub-decreto de
2005 de Concessões Econômicas de Terras, que incluem requisitos para a contratação e monitorização de operações,
dispõem sobre a proteção dos direitos das comunidades locais que moram ao redor dessas plantações e evitam impactos
ambientais. Também incluem penalidades para as companhias que não cumpram esses requisitos. No entanto, muitas
concessões têm sido outorgadas em violação desse quadro legal, têm tido sérios impactos sobre as comunidades locais e
não têm conseguido cumprir a promessa de benefícios econômicos[1].
Uma razão para esses problemas foi a falta de transparência durante o processo de contratação e falta de responsabilidade,
uma vez que as companhias começassem as operações. Sob pressão de doadores e da sociedade civil, o governo
cambojano aceitou em junho de 2007 estabelecer e atualizar regularmente um registro público das concessões econômicas
de terras outorgadas no país inteiro. Esse registro público está destinado a fazer públicas as inscrições da propriedade,
localização, estado e operações de cada concessionário e está hospedado no site na web do Ministério da Agricultura,
Florestamento e Pesca. Além disso, o governo se comprometeu a revisar um pequeno número de concessões que foram
outorgadas além do limite máximo de 10.000 hectares e a outorgar maior prioridade a assegurar-se que as companhias
operam em cumprimento da Lei Cambojana.
No entanto, uma revisão pelas ONGs que trabalham em assuntos de manejo de terras e de recursos naturais achou que
para novembro de 2008, o progresso para melhorar a transparência e responsabilidade através dessas medidas tinha sido
muito desapontador[2]. O registro público não tinha sido atualizado regularmente, especialmente em termos de informação
relacionada com concessões autorizadas em nível provincial. Há contradições nos dados atualmente disponíveis –entre as
diferentes seções do site, e com informação circulada por outras agências governamentais. Além disso, o conceito de
“registro público” tem sido interpretado pelo Governo como um meio baseado em internet em língua inglesa, que é
inacessível para as comunidades atingidas por essas plantações, que são as que mais precisam dessa informação. Um
registro genuinamente “público” DEVERIA estar disponível na língua khmer em nível local, em formato não eletrônico.
O progresso para melhorar as operações na prática tem sido ainda mais insatisfatório de acordo com as ONGs. Das nove
Concessões Econômicas de Terras listadas no registro público como ultrapassando limite legal, somente duas têm sido
reduzidas até agora. Outras três companhias se negam a renegociar seus contratos. Enquanto isso, o governo tem
continuado outorgando Concessões Econômicas de Terras que ultrapassam o tamanho máximo. Em abril de 2008, a
Kenertec Co. Ltd., uma companhia sul-coreana recebeu uma concessão 6 vezes maior que o limite legal para a produção e
processamento de agrocombustível. Em setembro de 2008, o Governador da província de Stung Treng apoiou publicamente
a intenção da Greensea Industry Company Ltd. para expandir a produção de agrocombustível em sua concessão que é dez
vezes maior que o limite de tamanho legal máximo.
As ONGs que trabalham sobre terra e recursos naturais continuam recebendo queixas das comunidades locais sobre as
companhias com Concessões Econômicas de Terras que violam a lei e agências do Governo Real do Camboja que não
punem aqueles que descumprem a lei. Os contratos são emitidos antes do registro legal da terra e em decorrência disso,
muitas áreas de concessão incluem terras legalmente em possessão de granjeiros locais. As ONGs não estão em
conhecimento de quaisquer casos nos que uma companhia tenha consultado adequadamente com as comunidades locais
ou levado a cabo uma Avaliação do Impacto Ambiental e Social global antes da outorga da concessão.
Muitas Concessões Econômicas de Terras violam disposições do quadro legal cambojano que garantem o uso tradicional
pelos povos das florestas e protegem suas terras comunais. Uma companhia com uma solicitação pendente para uma
Concessão Econômica de Terras para uma plantação de borracha de 10.000 hectares na província de Mondulkiri
supostamente força os povos indígenas na comunidade vizinha de “alugar” sua terra para a companhia por entre $25 e $250
por até 99 anos[3]. Alguns membros da comunidade até denunciaram que foram forçados a vender sua terra para a
companhia por esse valor. Supostamente as transações eram arranjadas por policiais locais que informavam aos
povoadores que se não concordavam com a oferta, de qualquer jeito a companhia obteria a terra. Esse caso não é
considerado como um exemplo isolado; a intimidação dos povoadores locais é percebida no país inteiro.
Em preparação para a reunião anual entre o Governo cambojano e seus Doadores, as ONGs compilaram as seguintes recomendações de mudanças requeridas durante os próximos 12 meses que genuinamente melhorarão a transparência e responsabilidade da governança das plantações agroindustriais:
§ Atualização trimestral do registro público e sua disponibilização em língua khmer em nível local para as comunidades atingidas por Concessões Econômicas de Terras;
§ Cancelamento de todas as concessões que não tem cumprido os requisitos do sub-decreto (que estabelece que,
antes de que uma concessão possa ser outorgada, a terra deve ter sido registrada, as Avaliações do Impacto Ambiental
e Social e as consultas públicas devem ter ocorrido e os assuntos de reassentamento devem ter sido resolvidos);
§ Clarificação da base legal na que as três Concessões Econômicas de Terras remanescentes grandes demais
sejam capazes de continuar suas operações e emissão de toda a informação relacionada com os procedimentos de
revisão, especialmente os resultados de consultas públicas com as comunidades atingidas. Garantir que essas
Concessões Econômicas de Terras não continuem avançando até que esses problemas sejam abordados.
A Sociedade Civil cambojana tem utilizado com sucesso essas reuniões Governo-Doador no passado como uma
oportunidade para influenciar a política. No entanto, a mudadora relação Governo-Doador decorrente de acordos de ajuda
bilaterais entre o Camboja e seus vizinhos regionais está desafiando esse status quo. A pergunta para as ONGs envolvidas
sobre a governança futura da terra e dos recursos naturais é como relacionar-se com esses “doadores emergentes”
enquanto mantém relações com doadores tradicionais e ao mesmo tempo criar oportunidades para o diálogo com os
próprios concessionários.
Por Megan MacInnes, Land and Livelihoods Programme Advisor, The NGO Forum on Cambodia, email: megan@ngoforum.org.kh