Desde o início desta década, todas as áreas de expansão das plantações de dendezeiros na Colômbia coincidiram geograficamente com áreas de expansão e presença paramilitar. Até o ponto de algumas das novas plantações em desenvolvimento terem sido financiadas como projetos produtivos para aqueles que tinham sido deslocados pelo grupo paramilitar Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC) que já tinham incursionado nessas áreas.
Essa estratégia de controle territorial através da expansão do dendê tem um aliado importante nas políticas governamentais de apoio e incentivo à plantação de dendezeiros que também visam claramente ao controle econômico, político e militar de grandes áreas da Colômbia que escapam do controle governamental.
As políticas governamentais estão por sua vez potenciadas pelos lineamentos estratégicos de investimento dos organismos internacionais. Uma análise das propostas de investimento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) ilustra a questão: “A critério do BID, as culturas de médio e longo prazo têm maior potencial exportador, maior capacidade de sobrevivência em uma economia aberta, imprimem grandes benefícios em termos do processo de pacificação e geram um crescimento sustentável do agro, superando assim os problemas de financiamento agropecuário de longo prazo. (...) E em concordância com o Documento de País (BID), o programa focaliza suas atividades nas áreas e projetos importantes do ponto de vista do esforço de pacificação. Em geral os investimentos em culturas de médio e longo prazo são vistos pelo BID como estratégias de governabilidade ou controle territorial diante de problemáticas como o conflito guerrilheiro, a violência política, a delinqüência comum e as culturas ilícitas. A agricultura extensiva é uma alternativa real para a ocupação do território e para a geração de emprego em áreas de conflito.”
Finalmente, todos esses discursos confluem na idéia de as culturas de dendezeiros serem um meio de desenvolvimento econômico útil para a pacificação do país. Tal confluência de ações ilegais e delituosas, de políticas governamentais e de investimentos internacionais conforma o modelo do dendê na Colômbia.
O modelo pode ser generalizado em um esquema de 5 estágios:
- Arremetida ou conquista paramilitar
- Apropriação ilegal das terras. Roubo ou compra com intimidação armada.
- Semeadura de dendê.
- Complexo palmar = Plantações + Extratoras.
5a. Fluxo do óleo para o mercado nacional e/ ou internacional.
5b. Domínio territorial.
Esta caracterização é uma síntese dos diferentes processos que vêm se desenvolvendo nas áreas de palmares do país, mas é particularmente aplicável de forma integral (de 1 a 5) às novas plantações desenvolvidas desde inícios da presente década.
Nos processos anteriores como em Santander ou Tumaco, o modelo foi iniciado com complexos de palmares já estabelecidos, nos que os próprios empresários de dendê conformaram ou convidaram e financiaram grupos paramilitares como corpos de segurança privada diante da guerrilha. Ao contrário, em Casanare, as plantações de dendezeiros se espalharam ao mesmo ritmo que o acionar paramilitar, encobrindo-se ambas expansões. O caso que se ajusta perfeitamente ao modelo corresponde às plantações da região do Chocó onde foram os próprios paramilitares que convidaram os empresários de dendê para que se instalassem em suas áreas de controle.
Conforme a Procuradoria Geral da Nação, “a apropriação, usurpação e saqueio das terras por parte de grupos de autodefesas (33%), guerrilhas (17%), narcotraficantes, esmeraldeiros [comerciantes de esmeraldas], terra- tenentes, alguns palmicultores e outros atores foi denominada por analistas e pela mídia como a ‘contra-reforma agrária’ e a ‘para- reforma agrária’”.
De uma extensão estimatimativa entre 2,6 e 6,8 milhões de hás, grande parte está plantada com dendê atualmente . Esta ‘contra- reforma agrária’ denunciada por vários analistas e meios de comunicação já vem sendo denunciada há muito tempo pelas próprias vítimas, como nos casos das comunidades do Curvaradó e Jiguamiandó, afetadas pelas plantações de dendezeiros.
As incursões, arremetidas ou a posterior conquista territorial deixaram um saldo macabro nas áreas rurais da Colômbia. Os assassinatos ou massacres, os sumiços forçados, as ameaças, os seqüestros, as torturas e outras fustigações provocam o deslocamento forçado coletivo e/ ou individual dos habitantes das terras que são alvo de arrebatamento.
As dimensões do deslocamento forçado na Colômbia são assustadoras. Estima-se que no país foram deslocadas violentamente entre 1.874.917 e 3.832.525 pessoas conforme diferentes registros. Deste elevado número, dois em cada três deslocados possuiam terras na hora de ser deslocados. (Texto extraído de “El flujo del aceite de palma Colombia - Bélgica/Europa. Acercamiento desde una perspectiva de derechos humanos”) http://www.hrev.org/media/documentos/elflujopalmaes.pdf
As denúncias continuam: a organização colombiana Salva la Selva (Rettet den Regenwald) denunciou que os líderes comunitários que se opõem às plantações de dendê e aqueles que apóiam as comunidades deslocadas com posse de títulos legais sobre suas terras para elas retornarem aos lugares de onde foram deslocadas vêm recebendo ameaças de morte. Outras pessoas da área foram atacadas por membros de forças paramilitares e militares. Em setembro de 2007, duas pessoas foram feridas de bala por homens que se acredita pertenciam a um grupo paramilitar. Também continuam as ameaças às comunidades que já retornaram a suas terras.
Desde 2001, houve 113 assassinatos, 13 deslocamentos forçados, e soube-se de numerosas ameaças de morte e ocupações ilegais de terras. Em dezembro passado, o Promotor Geral da Nação elevou um caso contra 23 representantes de empresas de dendê, mesmo que isso não tenha resultado em esforços reais para deter a expansão do dendê nem da pecuária em terras comunitárias.
No passado mês de maio os membros da comunidade de Caracoli, território coletivo de Curvaradó, Jair Barrera, Jonny Barrera e Devis Salas, e as defensoras de direitos humanos da Comissão de Justiça e Paz, Elizabeth Gómez e Luz Marina Arroyabe foram detidos ilegalmente pela polícia sob acusações dirigidas a criminalizá-los, e posteriormente sofreram maus tratos, torturas e ameaças. Toda a ação policial esteve acompanhada por beneficiários do paramilitarismo e a palmicultura (vide http://www.salvalaselva.org/protestaktion.php?id=255).
Por sua vez, o Conselho Nacional de Política Econômica e Social (CONPES) anunciou novas políticas que irão incrementar o apoio governamental à expansão dos agrocombustíveis, com o intuito de transformar a Colômbia em uma potência exportadora de agrocombustíveis.
As violações dos direitos humanos no Chocó e outras partes, e a destruição acelerada de florestas tropicais e outros sistemas vitais e biodiversos são o resultado direto destas políticas do governo.