A inciativa ‘Aliança para uma Revolução Verde na África’ (AGRA) financiada pelas Fundações Gates e Rockefeller chegou na África anunciando que irá ajudar os pequenos agricultores a entrar no mercado. O que isso significa?
Por trás dos milionários projetos financiados está a promoção da biotecnologia na agricultura. A agricultura africana irá ficar mais dependente dos produtos químicos, das monoculturas de sementes híbridas, e das plantações geneticamente modificadas.
De acordo com Mariam Mayet, do Centro Africano para a Biossegurança, a AGRA é “um pacote muito violento porque introduz na África potentes produtos químicos de alta toxicidade. Desloca e destrói o conhecimento e as sementes locais. Favorece aqueles agricultores que têm possibilidades de aceder ao sistema- os agricultores mais poderosos. Isso irá dividir o campesinato africano. A AGRA também origina uma forte dependência e dívidas." (1)
Na tendência cada vez maior para a privatização da ajuda externa e a união do setor empresarial com os governos, a AGRA se torna uma ferramenta útil para os interesses empresariais privados e para os governos do Ocidente, ávidos por privatizar as terras e a água da África para as culturas de exportação, agrocombustíveis e os sumidouros de carbono.
As estratégias externas como a AGRA estão se apropriando das terras florestais que também são um espaço de soberania alimentar para as florestas e as comunidades que delas dependem.
As plantações de monoculturas para agrocombustíveis- jatrofa em Gana e Zâmbia, cana-de-açúcar na Uganda, Tanzânia e Quênia, dendezeiro em Benim, Camarões, Costa do Marfim, - invadem florestas, ameaçando e também despojando as comunidades locais de seus meios de vida, desencadeando deslocamentos e miséria.
Se a fonte da riqueza da África for privatizada, os países africanos irão perder sua oportunidade de determinar seu próprio futuro.
Delegados de organizações de camponeses de diferentes países africanos que compartilham a visão do movimento internacional camponês, La Via Campesina, se reuniram em um encontro regional em Madagascar, em maio de 2008. Eles expressaram sua oposição à introdução de políticas destrutivas que estão minando a produção local de alimentos ao forçarem os agricultores a produzir cultivos comerciais para as corporações transnacionais (TNCs) e a comprar seus próprios alimentos no mercado mundial. “Os camponeses e os pequenos agricultores não colhem nenhum benefício dos preços mais altos. Nós plantamos alimentos, mas os benefícios da colheita geralmente são tirados de nossas mãos: também muito frequentemente já têm sido prometidos aos credores, às empresas de insumos agrícolas, ou diretamente aos comerciantes ou à unidade de processamento.” (2)
A declaração final dos camponeses na reunião “Crise Mundial de Alimentos” denuncia que “a contínua apropriação de terras por parte das TNCs e outros especuladores irá expulsar milhões de camponeses das áreas rurais. Eles irão acabar nas grandes cidades onde irão aumentar os crescentes níveis de fome e pobreza nas periferias.”. Nela também afirma-se que "o tempo para a Soberania Alimentar já chegou!" e exige a implementação de "mudanças fundamentais na abordagem da produção de alimentos e os mercados agrícolas”, “compromissos políticos no longo prazo a fim de reconstruir as economias nacionais em termos de alimentos", prioridade absoluta à "produção local de alimentos a fim de diminuir a dependência do mercado internacional", um mecanismo de intervenção “para estabilizar os preços em um nível razoável no mercado internacional”, bem como “o direito a implementar controles às importações” a fim de deter a venda a preços inferiores aos normais, e o respeito e apoio em nível internacional de “programas que ajudem os consumidores mais pobres, implementem reformas agrárias e invistam na produção local de alimentos por parte de agricultores e camponeses".
Não apenas os sistemas alimentares e as florestas estão em jogo; também os sistemas sociais e toda a cultura africana.
Artigo baseado em:
(1) “AGRA - green revolution or philanthro-capitalism?”, Pambazuka News 361, http://www.pambazuka.org/en/issue/361;
(2) “Global Food Crisis”, Reunião Regional de La Via Campesina África, Madagascar, de 14 a 17 de maio de 2008,http://www.wrm.org.uy/countries/Africa/GlobalFoodCrisis.pdf