Para que grandes extensões de plantios industriais de árvores fossem viáveis no Brasil, estabeleceram-se estreitas interações entre governo, empresas, bancos, universidades, mídia além de instituições internacionais, financeiras, produtoras e compradoras. Numa grande orquestração política, criaram mecanismos legais, tributários, financeiros, técnicos e científicos, agrários, logísticos. Do mesmo modo articulações contrárias a estas políticas cresceram à medida da expansão dos monocultivos.
Inicialmente, a política florestal procura definir um conjunto de técnicas capazes de ordenar a utilização dos recursos florestais. O primeiro regulamento das florestas no Brasil é de 1934 com o primeiro Código Florestal, que define algumas áreas protegidas, mas também traz a possibilidade de substituição das florestas por monocultivos de árvores.
Em 1965, através da Lei 4.771 edita-se um segundo Código Florestal, onde aparecem novas categorias de unidades de conservação. Foi neste âmbito também, através da Lei 5.106 de 2 de setembro de 1966, que se regulamentou os incentivos fiscais ao reflorestamento, que beneficiavam as pessoas físicas e jurídicas contribuintes do Imposto de Renda. No caso da pessoa física, poderia abater de sua renda bruta (para cálculo do imposto de renda) todas as despesas realizadas na atividade, até o limite de 50% de sua renda. No caso de pessoas jurídicas, poderiam abater do valor das despesas realizadas na atividade florestal até 50% do imposto devido e em 1970, através do Decreto-Lei 1.134 (16/11/70) modificou-se para: ao invés de deduzir as despesas feitas do valor do imposto devido, o contribuinte passou a poder descontar até 50% desse imposto para aplicação em empreendimentos florestais.
Nas primeiras décadas do século XX alguns estados criam serviços Florestais, ligados às Secretarias de Agricultura e em 1967, cria-se o IBDF (Instituto Brasileiro para o Desenvolvimento Florestal), pelo Decreto-lei nº 289, no âmbito do Ministério da Agricultura.
Para impulsionar o crescimento econômico, investiu-se muito também no desenvolvimento científico e tecnológico. Em 1967 se formava a primeira turma de engenheiros florestais, concluindo curso mantido por convênio entre o IBDF e a FAO. Em 1968 foi criado o Instituto de Pesquisas Florestais (IPEF), numa iniciativa conjunta da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ –USP) e das empresas Champion, Duratex, Rigesa, Suzano e Madeirit. O objetivo do IPEF era a geração e difusão de tecnologia na área florestal, com financiamento para a realização de pesquisas, com recursos do setor público, através de incentivos fiscais ao reflorestamento.
O apoio financeiro do Estado, via BNDE (Banco Nacional de Desenvolvimento) possibilitou que empresas líderes fossem favorecidas com a Decisão nº 196/68 para projetos de instalação e/ou ampliação que superassem uma capacidade produtiva de 100t/dia de celulose e que garantissem um suprimento próprio de madeira equivalente a, no mínimo, 50% das necessidades calculadas. A partir de 1972, os incentivos passaram a ser priorizados para projetos com produções acima de 1000 toneladas/dia, mas aceitava-se que esta meta fosse alcançada em duas etapas de 500 toneladas cada.
A proliferação de grupos executivos setoriais originou a criação do conselho de Desenvolvimento Industrial (CDI), em 1969, composto por representantes dos ministérios econômicos, forças armadas, BNDES, Banco do Brasil, além de entidades representativas do setor privado, como o grupo de papel e celulose que desempenhou a tarefa de formular e coordenar as diretrizes norteadoras da expansão setorial.
Na década de 70 até meados de 80, é a fase em que as plantações de árvores recebem mais incentivos fiscais, com o II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND). Neste Plano as metas a serem alcançadas entre 1974 e 1979 para a produção de celulose e papel representavam um crescimento de 85% e 28%, respectivamente.
No plano de ação do BNDE para o período de 1974-78 estipula-se apoio a projetos de celulose de grande porte que concorram para que a economia atinja um nível de produção superior a 2,5 milhões de toneladas em 1978.
O FISET (Fundo de Incentivos Setoriais), criado através do Decreto-Lei 1376/74, foi a principal forma de incentivo fiscal de 1974 a 1988 com empréstimos a longo prazo com custos reduzidos. Permitia a dedução de imposto de renda para investimentos em projetos de reflorestamento.
Em 1974 é lançado o Plano Nacional de Papel e Celulose (PNPC). A pretensão de plantio era de 4 milhões de hectares de árvores. Programou-se para isso a implantação de 30 “Distritos Florestais”, áreas selecionadas visando a racionalização do processo de não dispersão dos recursos da área florestal. Havia uma divisão entre sub-distritos celulósicos e sub-distritos energéticos. A área mínima exigida era de 1.000 hectares por projeto e considerava-se a aproximação com as indústrias. As indústrias com base florestal próprias eram privilegiadas. Para garantir grandes áreas contínuas, o governo induziria a implantação das plantações em áreas definidas.
Outras modalidades de incentivos concedidos às empresas privadas foram no sentido de conceder isenção do Imposto de Importação (II) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), além de estímulos à ampliação de produção destinada à exportação.
Em 1987 surge o II Plano Nacional de Papel e Celulose que estabelecia metas de expansão até 1995 (importação de equipamentos, implantação de novos reflorestamentos e exportação da produção). A projeção de ampliação da produção de celulose era de 3,5 milhões t/ano para 6,6 milhões t/ano.
Além dos financiamentos do BNDES em maior escala, outro mecanismo de financiamento e capitalização das empresas de celulose, sobretudo, foi a empréstimos junto a organismos internacionais, como a International Finance Corporation (IFC), do Banco Mundial. A captação de recursos no mercado internacional envolve diversas operações e bancos, como no caso da Aracruz Celulose com o Den Norske Bank, da Noruega, Citibank, J.P. Morgan, Chase Manhatan, Bolsa de Valores de New York.
Em 2000 é criado o Programa Nacional de Florestas (PNF), dentro do Ministério do Meio Ambiente, sob responsabilidade da Diretoria do Programa Nacional de Florestas. O Programa é implementado com recursos provenientes do Tesouro Nacional e de recursos provenientes de cooperação técnica e financeira externa, principalmente: Organização Internacional de Madeiras Tropicais (OIMT), Programa Piloto para Proteção das Florestas Tropicais (PPG7), do Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF) e dos governos do Japão, Reino dos Países Baixos (Holanda) e Inglaterra.
De 2004 a 2007 o PNF tinha por uma de suas metas a expansão da base florestal plantada, por meio do plantio de 800 mil hectares em pequenas e médias propriedades, e de 1,2 milhão de hectares por meio de programas empresarias.
Para isso criou-se algumas linhas de financiamento ao plantio de árvores, cujos principais são: BNDES – FINEM (Financiamento Direto a Empreendimentos), PRONAF Florestal (coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário desde 2002), PROPFLORA (coordenado pelo Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, desde 2002).
Existem ainda linhas de financiamento florestal com abrangência regional como o FNO Floresta (Região Norte), FCO Pronatureza (Região Centro-Oeste), FNE Verde (Região Nordeste).
Entre outros estímulos financeiros criados que favorecem as plantações florestais estão o Programa Nacional de Crédito Fundiário, como parte do Plano Nacional de Reforma Agrária do Ministério de Desenvolvimento Agrário e é resultado de acordo de empréstimo com o Banco Mundial.
Para um conjunto tão vasto de mecanismos para a viabilidade das monoculturas, as empresas investem fortemente em campanhas eleitorais de candidatos de todos os partidos e com isso conseguem garantir apoio no Congresso, como por exemplo na Frente pró-silvicultura além da bancada ruralista.
Mais recente, outra estratégia de expansão para as plantações de árvores no Brasil são os créditos de carbono, a partir do Protocolo de Kyoto. Aqui um dos principais mercados que negociam estes créditos é o Mercado Brasileiro de Reduções de Emissões (MBRE), iniciativa conjunta da BM&F e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).
Outro mercado potencial apontado no Brasil são os biocombustíveis à base de celulose, que já ganha investimentos de pesquisa.
Em curso estão também propostas de mudanças no Código Florestal (em tramitação no Congresso Nacional) onde aparece a redução da área de reserva legal na Amazônia dos 80% atuais para 50% onde a floresta já foi derrubada. Nos 30% de diferença proprietários poderão plantar espécies exóticas.
Iniciativas que vão de encontro com os monocultivos industriais de árvores
Enquanto os monocultivos de árvores crescem, também acontecem muitas articulações no sentido de restringir as áreas plantadas, frear a expansão e mesmo interromper a produção nesta escala.
Entre as ações restritivas estão por exemplo leis estaduais, como no Espírito Santo com a Lei 6.780/01 que proíbe o plantio de eucalipto para fins de produção de celulose, até que fosse concluído e promulgado o Zoneamento Ecológico Econômico. Porém foi suspensa em Junho de 2002 pelo Supremo Tribunal Federal.
Legislações que garantam o direito à terra de populações tradicionais, como a quilombola (Decreto-lei 4887/03) , podem também restringir a posse da terra por empresas do setor de celulose.
A articulação da sociedade civil em Redes que se organizam para divulgar os impactos das monoculturas, denunciar, pressionar governo e empresas, propor alternativas ao modelo de desenvolvimento, entre outras ações. Neste sentido podemos citar a Rede Deserto Verde, a Via Campesina, Articulação Nacional de Agroecologia, Rede Brasileira de Justiça Ambiental, Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais.
Participação da sociedade civil em audiências públicas de implantação ou expansão dos projetos industriais. As audiências públicas são condições para aprovação dos empreendimentos, porém na prática não definem nada.
Denúncias no Ministério Público, em Conferências Nacionais, organismos internacionais, processos na justiça.
Ocupações de terras em áreas com plantações de eucalipto têm acontecido em várias partes do país pelos movimentos sociais do campo, sobretudo o MST, em reivindicação à Reforma Agrária e questionamento quanto à produtividade e função social (conforme Artigos 185 e 186 da Constituição Federal) destes latifúndios.
Também tem havido uma forte articulação da sociedade civil no sentido de cobrar do BNDES que cumpra o seu caráter de banco público e estabeleça políticas de abertura, diálogo e transparência de seus investimentos, defina critérios sociais e ambientais mais adequados para diminuir as desigualdades sociais entre a população brasileira, e ainda deixe de investir em projetos privados do agronegócio, como é o setor de papel e celulose, conforme “Plataforma BNDES”, 2007.
Por Daniela Meirelles e Alacir De´Nadai, FASE/ES, correio eletrônico: fases@terra.com.br