Indonésia: política governamental sobre desenvolvimento de dendê

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Com base em uma análise da legislação elaborada sobre as plantações, é possível identificar, na Indonésia, cinco fases nas políticas governamentais quanto ao desenvolvimento do azeite de dendê. Essas fases podem ser chamadas fase  PIR- Trans  (até outubro de 1993), fase de Desregulamentação (1993-1996),  fase de privatização (1996- 1998),  fase das cooperativas (1998- 2002) e a atual fase de descentralização (2002- 2006). Cabe apontar, porém, que essas fases não foram totalmente diferenciadas e que o início de uma nova fase não implicou a conclusão dos processos previamente lançados.

PIR- Trans: Antes de outubro de 1993, os esforços governamentais para estabelecer as plantações de dendezeiros estiveram centrados em tomar conta das áreas florestais das ilhas exteriores e em alocar essas áreas a operadores da PTPN [empresa plantadora estatal], que controlaram tanto os empreendimentos inti [operações em grande escala em áreas extensivas] quanto os empreendimentos plasma [minifúndios operados individualmente], fornecida com uma força de trabalho e pequenos proprietários através do programa de transmigração. As leis foram promulgadas em 1986 e 1990 com a finalidade de garantir a melhor coordenação entre as agências governamentais e assim acelerar o processo  de licenciamento exigido para liberar as terras florestais que seriam transformadas. O controle das florestas ficou centralizado nas repartições florestais regionais (Kanwil Kehutanan) que apenas estavam autorizadas a liberar até 100 ha para plantações.

Durante esse período, os direitos consuetudinários das comunidades residentes nas terras frequentemente não eram reconhecidos. Entretanto, os povos indígenas foram inseridos em programas de transmigração tanto ao serem reassentados em vilas de transmigrantes formadas por moradores locais (translok) quanto ao serem deixados em assentamentos mistos (Transmigrasi sisipan) com moradores locais e pessoas que tinham migrado, sob o patrocínio do governo, de Java, Madura e Bali. A maioria  dos programas PIR- Trans concedeu apenas 2 hectares a cada família transmigrante, sendo que em uma metade eles deviam plantar arroz e na outra metade deviam plantar dendezeiro a fim de abastecer as fábricas estabelecidas ao lado das plantações núcleo. Os migrantes se queixaram das moradias de pouca qualidade, dos baixos preços dos cachos de frutos frescos do dendezeiro (FFB) e dos longos atrasos no pagamento de salários, quitando dívidas e transferindo os títulos das terras.

Fase de Desregulamentação:Em outubro de 1993, o governo aprovou duas leis como parte de um Pacote Nacional de Políticas de Liberalização. O objetivo geral da política foi dar aos governadores locais maior autoridade para promover o desenvolimento regional, enquanto visavam garantir que as companhias privadas tivessem um compromisso no longo prazo com as áreas em que estavam investindo. Conforme essas leis, os governadores podiam emitir licenças para a transformação de áreas florestais de até 200 hectares, enquanto as áreas de mais de 200 hectares permaneceram sob responsabilidade do Conselho Geral de Culturas de Fazenda em Jakarta. As companhias privadas que solicitavam licenças para a transformação de florestas, por outro lado, não foram permitidas de transferir a posse dos arrendamentos assim obtidos.

Fase de privatização: Nos últimos anos da ditadura de Suharto houve um impulso coordenado entre vários setores, inclusive as culturas de fazenda, para privatizar as empresas para- estatais, encorajar as iniciativas do setor privado e facilitar o investimento estrangeiro direto.  Várias leis foram aprovadas a fim de acelerar o desenvolvimento das culturas de fazenda nesse sentido e garantir o jogo limpo entre as companhias. Os procedimentos pelos quais as companhias tinham licenças garantidas para desenvolver fazendas foram esclarecidos- uma licença inicial temporária durante um ano (ijin prinsip), que poderia se tornar uma licença permanente (ijin tetap) e que poderia ser acrescentada com uma licença de expansão (ijin perluasan).  Os requisitos foram introduzidos para garantir que as companhias com planos de transformação de florestas primeiramente obtivessem o consentimento de qualquer companhia madeireira com licenças de corte (HPV) sobre as mesmas áreas. Uma nova lei também esclareceu que as terras florestais clareadas e plantadas com culturas de fazenda seriam classificadas em Planos Espaciais Provinciais como terras agrícolas mas com nenhum direito a anexar licenças para plantar.

Fase das Cooperativas: A queda do regime de Suharto desencadeou uma era de reformas (reformasi) que permitiu que os políticos com idéias alternativas sobre o desenvolvimento rural ganhassem poder temporariamente. Foram feitos esforços para incentivar modelos de desenvolvimento que permitiriam que as comunidades locais se beneficiassem mais diretamente das terras e dos recursos naturais. Enquanto uma lei foi aprovada proibindo a transformação florestal em florestas protegidas (hutan lindung),  assim harmonizando os procedimentos de planejamento espacial tanto local quanto regional, um decreto era aprovado para permitir licenças de plantações de três anos (ijin usaha perkebunan) a ser concedidas a cooperativas para áreas acima de 1000 hectares por parte de governadores das províncias ou acima de 20.000 hectares por parte do Ministério das Florestas e das Culturas de Fazenda.

Fase de descentralização: A queda de Suharto aconteceu em um período de mudanças políticas radicais na Indonésia, que conferiram  maior poder para controlar terras e recursos e para administrar os orçamentos regionais aos governos locais e os parlamentos. Desde 2002, essas mudanças também tiveram impacto no desenvolvimento do setor dendezeiro, embora ainda limitando as autoridades locais para incentivar as plantações em média escala. Uma nova lei permitiu que os regentes distritais (bupati) emitissem licenças de até 1000 hectares, enquanto qualquer área que se sobrepusesse nos limites do distrito permaneciam como privilégio dos governadores provinciais. No entanto, a autoridade para emitir licenças de mais de 1000 hectares foi confiada ao Ministério da Agricultura.  Além disso, em resposta às preocupações sobre o ritmo de desmatamento das florestas clareadas para estabelecer plantações mesmo que vastas áreas de terras degradadas estivessem disponíveis para plantar, em 2005, o governo aprovou outra lei que estabelecia uma moratória na transformação das florestas em culturas de fazenda.

A moratória foi apresentada seguindo a assinatura de uma carta de intenções entre o governo da Indonésia e o FMI, embora não estivesse claro por quanto tempo a moratória devia ser mantida e se referia a uma moratória sobre a atual transformação da cobertura florestal ou uma moratória sobre a mudança do status de terras florestais para permitir a plantação. Em fevereiro de 2005, o Ministério das Florestas passou ao governo local duas circulares contraditórias. Uma afirmava que a moratória ainda era efetiva, enquanto a outra afirmava que a fim de otimizar o uso da terra florestal para as culturas de fazenda o ministério avaliaria propostas para transformação conforme sua qualidade. As mesmas perspectivas divididas podem ser diferenciadas na forma em que o ministério tem respondido à proposta de estabelecer 1,8 milhões de hectares de plantações de dendezeiros no coração de Bornéu.

Extraído de: “Promised Land: Palm Oil and Land Acquisition in Indonesia - Implications for Local Communities and Indigenous Peoples”, por Forest Peoples Programme, Sawit Watch, HuMA e o World Agroforestry Centre, http://www.sawitwatch.or.id/images/Publikasi/Land%20Acquisition%20(English).pdf