Gâmbia: população rural que está no centro do manejo florestal

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A Gâmbia é um país pequeno (10.000 km2) e economicamente pobre que enfrenta um conjunto de problemas sociais e ambientais. Desses últimos, o desmatamento é provavelmente o problema que supõe a maior ameaça tanto para as pessoas quanto para o ambiente. Até o início do século XX, a Gâmbia tinha uma cobertura de densas florestas. Em 1981, cerca de 430.000 ha (45% do total de área terrestre) eram classificadas como floresta. Em 1988, a cifra despencou a cerca de 340.000 ha (30% da área terrestre). Adicionalmente, a degradação da condição da floresta é tão séria que a maior parte das densas florestas têm desaparecido deixando apenas uma savana de árvores e arbustos de baixa qualidade.

Por isso, resulta interessante ver como a Gâmbia- com recursos financeiros muito limitados- está enfrentando atualmente o problema com uma abordagem centrada nas pessoas. A esse respeito, o Departamento Florestal tem desenvolvido o “Conceito Gambiano de Manejo Florestal” (GFCM, sigla em inglês), que norteia todas suas atividades.

Algumas citações do documento do GFMC servem para ilustrar uma mudança importante nas conhecidas abordagens florestais:

- “ A admistração florestal e os funcionários florestais devem ver além das árvores e preocupar-se mais com as pessoas e o potencial uso múltiplo das terras florestais. A abordagem tradicional dos especialistas florestais precisa ser ampliada em prol do envolvimento da população rural no manejo e uso racional de suas florestas”.

- “As decisões sobre o uso da terra não podem ser tomadas apenas conforme as perspectivas dos especialistas florestais, devem levar em consideração o desenvolvimento populacional, a necessidade por terras agrícolas, etc.”

- “O objetivo do manejo florestal deve ser orientado mais para o pastoreio antes de ser focalizado apenas na proteção ou na produção de madeira e outros produtos florestais”.

- “A função do pessoal florestal tem passado de ser guardião a ser parceiro no manejo”.

O GFMC coloca a população rural no centro do manejo florestal. Em conseqüência, tem abordagens participativas a fim de a população local estar integralmente envolvida no planejamento, tomada de decisões, organização e administração. A introdução do Florestamento Comunitário surgiu, de fato, porque o Departamento Florestal compreendeu a futilidade de seus esforços para proteger as florestas sem o envolvimento comprometido da comunidade local.

A introdução e aplicação do florestamento comunitário provou que é um processo de construção de confiança e que leva muito tempo para criar um senso de propriedade da floresta entre os moradores devido a um profundo receio quanto às ações e políticas governamentais conforme a experiência passada.

Uma das condições fundamentais que uma comunidade deve satisfazer antes de ser estabelecido um Acordo de Manejo Florestal Comunitário com o Departamanto Florestal é a criação de um Comitê Florestal em nível do povoado. Esse comitê será responsável por toda a organização do trabalho no nível do povoado.

Basicamente, a implementação de florestamento comunitário tem tres fases: uma preparatória, durante a qual as comunidades preparam o manejo florestal; uma preliminar, durante a qual as comunidades demonstram sua capacidade para manejar e proteger a floresta; e uma de consolidação durante a qual as comunidades ganham mais habilidades técnicas e de manejo objetivando o auto- manejo.

Quando o processo é completado, um Acordo de Manejo Florestal Comunitário (CFMA, sigla em inglês) é estabelecido entre a comunidade e o Departamento Florestal através do qual são concedidos os direitos de propriedade permanente sobre a floresta claramente demarcada a uma comunidade ou várias. Com o CFMA, as comunidades têm direito a conservar os benefícios decorrentes de suas florestas. A única condição anexa ao CFMA é o fato de manejar os recursos da floresta conforme um simples plano de manejo.

A experiência gambiana parece tão interessante que a Secretaria do WRM decidiu que seria útil visitar o país. Portanto, entramos em contato com o Diretor do Departamento Florestal- o senhor Jato S.Sillah- que amavelmente organizou um conjunto de visitas às florestas comunitárias bem como entrevistas com o pessoal pertinente do departamento. O que vimos e ouvimos coincide basicamente com a política florestal declarada.

Visitamos várias florestas comunitárias e falamos com integrantes dos comitês das florestas comunitárias que nos explicaram os numerosos benefícios que estavam recebendo dos diferentes usos florestais. Tivemos um encontro com membros da Associação Nacional de Apicultores que nos explicaram como essa atividade ajuda na prevenção de incêndios florestais e nas rendas crescentes do povo rural (vide http://www.wrm.org.uy/bulletin/107/Gambia.html). Vimos especialistas florestais sem uniformes interagindo, de igual para igual, com os integrantes da comunidade. Vimos cartazes nas florestas comunitárias com a legenda “pastoreio permitido”. O pessoal florestal explicou a simplicidade burocrática para conseguir o status de floresta comunitária. Desde o Diretor do Departamento Florestal até o pessoal de campo, todos pareciam verdadeiramente convencidos do conceito gambiano e engajados na sua implementação.

É evidente que uma visita curta a umas poucas áreas de um país não pode, de jeito nenhum, provar nada. Contudo, essa experiência parece ser um importante passo na direção certa e ter um potencial para ser reaplicada em outros países que enfrentam problemas similares. Provavelmente seja necessária uma pesquisa maior para avaliar a realidade na prática, mas o marco conceitual não apenas faz sentido sob uma perspectiva de conservação de florestas como também sob uma perspectiva social e econômica.

Artigo baseado em informações obtidas de: Gambian Forest Management Concept (GFMC). Version 2. Draft , maio de 2001 http://www.wrm.org.uy/countries/Gambia/GambiaGFMC.pdf Community Forest Ownership: Key to Sustainable Forest Resource Management. The Gambian Experience http://www.wrm.org.uy/countries/Gambia/GambianExperience.html e viagem à Gambia de Ricardo Carrere em junho de 2006.