O Peru é um dos poucos países sul- americanos em que as monoculturas florestais ainda não foram implantadas em grande escala, mas o governo está prestes a promover essa expansão. De fato, o país já tem um “Plano Nacional de Reflorestamento 2005- 2024” [Plano Nacional] e uma “Lei de promoção do investimento privado em florestamento e/ou reflorestamento” [Lei de Florestamento], que seriam as ferramentas fundamentais para justificar e viabilizar as plantações de árvores. A meta concreta para 2024 é o estabelecimento de 860.000 ha de plantações comerciais, principalmente na Amazônia e 909.000 ha de plantações de “proteção ambiental”, fundamentalmente em la Sierra.
A leitura de ambos documentos evidencia claramente que o governo peruano limitou-se a copiar o mesmo modelo já implementado em muitos outros países da região e a usar os mesmos argumentos falsos para conseguir o apoio necessário da cidadania, em particular, nas regiões em que está prevista a instalação de plantações: geração de emprego, redução da pobreza, desenvolvimento, impactos ambientais positivos. Os mecanismos de promoção também são um decalque dos usados em outros países (isenção tributária, créditos brandos, pesquisa feita pelo Estado, etc.) e o único aspecto inovador (acesso às terras por parte do setor privado) resulta ser o mais perigoso de todos.
A exposição dos motivos da Lei de Florestamento começa assinalando que “A promoção do investimento privado em florestamento e reflorestamento está contextualizada em uma estratégia de redução da pobreza rural” e também menciona – entre outros supostos benefícios- a “geração de riqueza e empregos permanentes”. O Plano Nacional contribui com mais detalhes quanto a empregos, afirmando que as plantações geram um emprego direto a cada 4 hectares e portanto, o plano criaria 425.000 postos de trabalho direto. O Fundo de Promoção do Desenvolvimento Florestal (FONDEBOSQUE) vai além e no folheto de divulgação afirma que as plantações “geram, no mínimo, um emprego direto a cada 2 hectares”; conforme esse dado, o número total de empregos a ser gerados pelo plano seria de 850.000.
Infelizmente, isso tudo é absolutamente falso. Cabe salientar os dados que se manejam no Uruguai, que é um dos países mencionados como exemplo “bem- sucedido” no Plano Nacional. De acordo com um estudo da Direção de Estatísticas Agropecuárias desse país, o florestamento gera 7 empregos permanentes a cada 1000 hectares (outras fontes diminuem esta cifra a 4,5 empregos/ 1000 ha). Quer dizer, que na melhor das hipóteses, o florestamento gera apenas 1 emprego direto por cada 143 hectares, cifra bem afastada das absurdas afirmações do Plano Nacional e o FONDEBOSQUE. A mesma situação se repete em outros países “bem- sucedidos” como Chile e Brasil, onde o florestamento tem demonstrado ser a pior opção possível quanto à geração de empregos. O florestamento não reduz a pobreza, pelo contrário a incrementa.
Em matéria ambiental, o Plano Nacional sustenta que todas as plantações (com exóticas ou nativas; em monoculturas ou sistemas agroflorestais; de produção ou de proteção) têm as mesmas funções que as florestas. Portanto, não apenas não provocariam impactos negativos, senão que todos seus impactos seriam positivos. Quanto a isso, o Plano afirma que os benefícios abrangem a “regulação do regime hídrico das bacias”, “controle da erosão dos solos”, “melhora de solos e proteção de culturas agrícolas”, “condicionamento do hábitat de flora e fauna”, entre outros.
Infelizmente, isso tudo também é falso, simplesmente devido a que as monoculturas de árvores não são florestas e portanto não podem cumprir com as funções próprias delas. Em todos os países da região em que existem grandes plantações foi constatado que produzem sérios impactos sobre a água, que favorecem processos de erosão, que degradam os solos e impactam sobre as culturas adjacentes e que afetam gravemente a flora e a fauna nativas. Os impactos das plantações são originados fundamentalmente no fato de serem em grande escala. No caso do Peru está previsto que as plantações sejam estabelecidas justamente em grande escala e portanto todos os supostos benefícios não existirão e ainda haverá graves impactos sobre a água, o solo, a flora e a fauna. As plantações não beneficiam o ambiente, pelo contrário o degradam.
A partir dessas- e outras- falsidades, o artigo primeiro da Lei de Promoção declara de “interesse nacional a promoção do investimento privado em atividades de florestamento e ou reflorestamento”, o que significa que o Estado dará apoios múltiplos às empresas plantadoras, incluindo isenções tributárias, incentivos fiscais, troca de dívida externa e que o próprio Estado instalará as plantações para “proteção ambiental”, fundamentalmente em teras de comunidades camponesas andinas. Isso significa que quem pagará será o povo peruano (direta e indiretamente) para a instalação das plantações, tanto privadas quanto estatais.
Pior ainda, as plantações serão transformadas em um instrumento para a privatização das terras do Estado. De fato, o Plano Nacional afirma que “o Estado colocará à disposição do setor privado, através de diversos mecanismos de aquisição, o acesso à propriedade privada de terras públicas para serem destinadas ao estabelecimento de plantações florestais industriais”. Por sua vez, a Lei de Florestamento afirma no artigo segundo que “O Estado, através da Agência de Promoção do Investimento Privado (PROINVERSION), poderá outorgar em venda com compromisso de investimento terras de seu domínio, com capacidade de uso maior florestal para fins de florestamento e/ ou reflorestamento, através do mecanismo de leilão público…”.
Em resumo, esses planos são contrários aos interesses de quem mais necessita e apenas beneficiarão os setores economicamente poderosos, que poderão ter acesso à terra e aos benefícios previstos nesta nova legislação. Por isso, é imperioso que as organizações da sociedade peruana se informem sobre o assunto e ajam antes que seja tarde demais. Ainda há tempo para deter o processo.