Em 1987, foi aprovada, no Uruguai, uma legislação que envolve a promoção --através de isenções tributárias e subvenções -- de monoculturas em grande escala de árvores exóticas (principalmente eucaliptos e pinheiros) voltados para a exportação. É assim que o país, até então agrícola- pecuarista, inicia a transformação de parte de suas férteis pradarias em “desertos verdes” que, atualmente, ultrapassam os 700.000 hectares.
Paralelamente, começa uma crescente oposição às monoculturas de eucaliptos e de pinheiros. Parte dessa oposição é o resultado de anos de campanhas e denúncias concretas de organizações ambientalistas, sociais e sindicais locais, que têm documentado os impactos desse modelo florestal. Mas também cabe esse “mérito” às próprias empresas florestais, cujas plantações têm demonstrado ter os impactos anunciados pelas organizações da sociedade civil e cujas práticas sociais deixaram muito a desejar.
A partir do ano 2001 entra em cena o FSC (Forest Stewardship Council ou Conselho de Manejo Florestal) ao certificar 5.000 hectares de plantações da empresa Industrias Forestales Arazatí (através da certificadora SmartWood). Para quem conhecia essa empresa, com uma longa tradição de destruição ambiental (dessecamento de zonas úmidas) e de política antisindical (chegando a ameaçar representantes do Sindicato da Madeira de serem retirados a balaços) logo de saída ficou bem claro que, ao ser essa empresa certificada, todas as outras também o seriam. E, de fato, foi assim como aconteceu. Uma após a outra, as empresas que solicitam a certificação a conseguem, mesmo que os impactos continuem e sejam agravados ao passo que as plantações –certificadas ou não– abrangem extensões cada vez maiores em diferentes zonas do país.
Em agosto de 2005 eram sete as empresas com plantações certificadas pelo FSC no Uruguai, com uma área total certificada de 133.711 hectares, sendo que cinco delas tinham áreas plantadas de mais de 5.000 hectares, ao tempo que duas eram pequenas plantações (31 e 184 hectares respectivamente). Quanto à origem do capital, duas eram estrangeiras (a finlandesa COFOSA e a espanhola EUFORES) e as outras nacionais. Cinco receberam certificação da SGS Qualifor, e as outras duas da SmartWood (Rainforest Alliance).
Um trabalho de campo do WRM realizado no final de 2005 e publicado em março de 2006 (“Maquillaje Verde. Análisis crítico de la certificación de monocultivos de árboles
en Uruguay por el FSC”)- disponível em http://www.wrm.org.uy/paises/Uruguay/libro.pdf)- descreve as principais empresas certificadas no Uruguai (EUFORES, COFOSA, FYMNSA, COFUSA) e chega à conclusão de que nenhuma das quatro empresas analisadas cumpre com o objetivo explícito do FSC, que afirma que “O Conselho de Manejo Forestal (FSC, sigla em inglês) promoverá o manejo ambientalmente apropriado, socialmente benéfico e economicamente viável das florestas [sic] do mundo”.
No boletim Nº 104 do WRM, no artigo sobre o Uruguai, fizemos referência aos resultados do estudo. Os graves impactos sobre a água, a flora -que afetam especialmente a pradaria, principal ecossistema do país e base da produção agropecuária-, a fauna e a paisagem revelam que as plantações certificadas descumprem as condições de manejo “ambientalmente apropriado” dos recursos naturais.
Por outra parte, a promoção das plantações de monoculturas de árvores acarretou diversas tendências. Os benefícios empresariais do modelo florestal são optimizados em condições de latifúndio, produzindo assim um aumento da compra de grandes extensões de terra –principalmente por parte de empresas estrangeiras. Além disso, é uma atividade excludente de outras atividades produtivas devido aos impactos que provoca, contribuindo assim à despovoação do meio rural. E o emprego gerado tem sido precário, sazonal e terceirizado. Todas estas circunstâncias derrubam o requisito de manejo “socialmente benéfico”.
Quanto ao requisito de constituir uma atividade “economicamente viável”, pôde ser constatado que se não fosse pela enorme subvenção direta e indireta --desde isenções até construção e manutenção de caminhos-- recebida pelo Estado, quer dizer, o povo uruguaio, certamente a florestação não teria se desenvolvido no país.
Por último, no caso concreto do Uruguay, a certificação destas plantações não contribui para a promoção do manejo sustentável das florestas (protegidas por lei). Pelo contrário, dá sua aprovação para a destruição total do principal ecossistema do país (a pradaria).
A certificação implica, além disso tudo, um enfraquecimento da oposição local, já que as empresas recebem um selo pressumidamente “verde” concedido por uma instituição prestigiosa na qual participam ativamente ONGs sociais e ambientais, que também foram as criadoras e promotoras deste esquema de certificação.
Por outro lado, essas certificações erosionam a credibilidade do FSC, cuja obrigação original visava a proteção das florestas através de um manejo adequado. O próprio fato de o FSC considerar que as plantações são “florestas” vai em detrimento de sua credibilidade, somado à certificação de grandes monoculturas de árvores, que na realidade implica que as declara como “ambientalmente apropriadas, socialmente benéficas e economicamente viáveis” (tal como reza seu objetivo).