No próximo mês de agosto, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) finalmente atingirá o mesmo nível de outras instituições ao entrar em vigor sua primeira Política Operativa sobre Povos Indígenas (OP- 765). Unido ao Banco Mundial, o Banco Asiático de Desenvolvimento, o Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas e numerosos bancos privados, o BID finalmente se posiciona entre as outras instituições financeiras internacionais que têm adotado políticas durante os últimos quinze anos reconhecendo assim a inegável ligação entre os direitos dos povos indígenas, o desenvolvimento sustentável e a redução da pobreza. Os povos indígenas e seus defensores estão se perguntando se esta política valia a espera.
Ateando o fogo pelos impactos devastadores sobre os povos indígenas provocados pelos mega projetos energéticos tais como o gasoduto de Camisea no Peru, a planta de energia hidrelétrica Caña Brava na Amazônia brasileira e o projeto de represa hidrelétrica Yacretá, ao longo da fronteira entre Argentina e Paraguai, em 2004 o BID anunciou públicamente que faria um rascunho, consultando os povos indígenas, de uma “estratégia” não vinculatória para o desenvolvimento, que levaria em consideração os direitos indígenas e suas preocupações. De viva voz, os povos indígenas zombaram do Banco e fizeram questão de que eles apenas consederariam o rascunho de uma política vinculatória que obrigasse o Banco e seus prestatários a respeitarem seus direitos. Diante de uma defesa indígena organizada e forte, o Banco esmoreceu.
Desde a primavera de 2004 até o verão de 2005, o Banco informa ter levado a cabo acima de 40 “reuniões de consulta” com povos indígenas. Tais consultas estiveram em grande parte baseadas em um “perfil” da política planejada (um esboço narrativo de tipos) e não no texto atual da política. Esses esforços foram muito criticados pelos povos indígenas. Eles reclamaram que a informação relevante não era fornecida com suficiente antecedência para permitir um diálogo informado. Eles reclamaram que seus comentários não foram incorporados nos documentos de trabalho e que os membros do “Conselho Assessor Indígena” estabelecido pelo Banco ficaram de lado do processo final. É notório que o texto da política atual do Banco foi submetido a apenas uma consulta presencial com os povos indígenas que ocorreu na Costa Rica em agosto de 2005.
Sob essa nuvem de críticas, em 22 de fevereiro deste ano, os Diretores Executivos do Banco adotaram um texto e assim surgiu uma nova política. Em suas próprias palavras, a política propõe antecipar uma nova era de “desenvolvimento com a identidade dos povos indígenas” e com o intuito de “salvaguardar os povos indígenas e seus direitos contra os impactos adversos e a exclusão gerada pelo desenvolvimento dos projetos financiados pelo Banco.” A política contém diversos elementos positivos que demonstram os avanços que os povos indígenas (e seus aliados dentro e fora do Banco) têm conseguido quanto a ter sensibilizado diretores e pessoal do Banco sobre suas necessidades e direitos. Por exemplo, a nova política inclui um claro reconhecimento dos direitos coletivos, uma proibição do reassentamento forçado, e a proibição do financiamento de projetos que excluam as comunidades com base na etnicidade ou falta de respeito dos direitos dos povos indígenas sem contato de vivirem como escolheram. A política também reconhece a jurisprudência relevante do sistema Interamericano, aplicada a todas as operações e atividades apoiadas pelo Banco (não a projetos específicos) e requer alguma forma de prévio acordo com os povos indígenas nos casos de: (i) significativos impactos potencialmente adversos, (ii) desenvolvimento comercial da cultura indígena e recursos de conhecimento; (iii) operações que especificamente atinjam beneficiários indígenas, e (iv) reassentamento.
Contudo, vários problemas permanecem na Política e requerirão um acompanhamento bem de perto. Por exemplo: a não aplicabilidade de salvaguarda de terras e recursos onde as reclamações dos indígenas ainda estão pendentes ou em disputa; o reconhecimento limitado dos sistemas jurídicos indígenas e as leis consuetudinárias; a omissão de mecanismos independentes para verificar a conformidade entre o Banco e os prestatários; a ausência de uma linguagem explícita que forneça aos povos indígenas a participação ou controle sobre decisões para criarem ou designarem áreas protegidas; a falta de uma exigência mais explícita de um consentimento livre, prévio e informado dos povos indígenas sempre que a atividade financiada pelo Banco atinja suas terras, territórios e recursos; e a presença de uma forma de contornar o assunto (sepultada em duas notas ao pé de página) que permite que o prestatário satisfaça sua consulta e os requisitos da negociação mostrando simplesmente que os povos indígenas não estão interessados pela consulta ou concordaram em que mais negociações e acordos serão necessários no futuro.
Talvez a maior fraqueza da política consiste em conter tantas nuances nos termos, qualificações, e padrões – em particular para a consulta, negociação, e processos de consentimento e fases de valoração e avaliação. Estão unidos apenas com promessas que o Banco fornecerá posteriormente as diretrizes, procedimentos, monitoramento e verificação dos mecanismos necessários para realizar as operações e implementar a Política.
Conseqüentemente, a efetividade da nova política será em grande parte determinada pela maneira em que o pessoal do Banco e os prestatários interpretem suas disposições e implementem as mesmas coisas baseados em variadas diretrizes, procedimentos e mecanismos que ainda não foram desenvolvidos ou esboçados. O Banco afirma que agora está engajado com o esboço e que para finais de agosto será elaborado um livro de consulta com as melhores práticas, algunas diretrizes internas do BID e um plano interno de implementação. O fato de como esses documentos serão dados a conhecer durante a etapa de rascunho ou contarão com o envolvimento dos povos indígenas em sua elaboração ainda permanece pouco claro.
Portanto, a política merecia a espera? Infelizmente, devemos esperar e ver.
Por Vanessa Jiménez,. Advogada Sênior do Programa Legal e de Direitos Humanos do Reino Unido – baseado no Programa Povos das Florestas.
Para obter uma cópia da Política do BID, acesse: http://www.iadb.org/sds/ind/site_401_e.htm (inglês) o http://www.iadb.org/sds/ind/site_401_s.htm (espanhol).