O Uruguai está sob a mira da indústria da celulose. A multinacional finlandesa Metsa Botnia e a espanhola Ence pretendem instalar duas fábricas para a produção de celulose de eucalipto (“ao sulfato”) branqueada com dióxido de cloro (processo ECF), com um volume máximo de produção de 1 milhão de toneladas anuais Botnia, e 500.000 toneladas Ence, para exportação. As fábricas seriam instaladas às margens do rio Uruguai, que é dividido com a Argentina, à altura da localidade de Fray Bentos.
Os projetos têm provocado uma crescente oposição cidadã tanto no Uruguai quanto na Argentina, que teve como máxima expressão um encontro multitudinário de ambos povos sobre a Ponte General San Martín que une os dois territórios (vide boletim Nº 94 do WRM).
As fábricas de celulose sob questão, que em si próprias constituem um alto risco de poluição para o rio e a atmosfera, estão, ainda, ligadas ao modelo de monoculturas florestais em grande escala que as abasteceriam, apesar de seus impactos terem gerado uma importante denúncia (vide boletim Nº 68 do WRM).
A FAO, o Banco Mundial, e a JICA (Agência de Cooperação Internacional do Japão), têm sido os artífices da criação dessa massa florestal para celulose (vide boletim Nº 83 do WRM), nesse país onde, por um lado, as árvores crescem rapidamente, a mão de obra é barata e os controles ambientais são muito fracos, e, por outro, o poder do Estado está condicionado pela dívida externa gerada no decorrer de várias décadas, e mais ainda, durante a ditadura militar instalada entre 1973 e 1984.
Agora, as IFIs começam a agir. Para desenvolver seu negócio, a empresa Metsa Botnia solicitou um empréstimo de US$ 100 milhões à Corporação Financeira Internacional (CFI, instituição integrante do Banco Mundial que promove o investimento no setor privado). Ao mesmo tempo, a CFI também facilitaria um empréstimo de mais US$ 100 milhões dos bancos privados para esse projeto. Também a Ence acaba de solicitar um empréstimo à CFI para a instalação da fábrica que pretende começar a construir em outubro de 2005.
Centenas de organizações do Uruguai, Argentina, e do mundo inteiro encaminharam uma carta à CFI reclamando que não sejam aprovados nem o empréstimo já solicitado pela empresa Metsa Botnia, nem aquele que é sabido vai ser solicitado pela empresa Ence, devido aos sérios impactos para o Uruguai que a instalação das fábricas de celulose vai acarretar. Na carta, as organizações assinantes manifestaram as seguintes preocupações:
"Em primeiro lugar, é importante salientar a escala destes empreendimentos e seus potenciais impactos acumulados se forem efetivamente concretizados
Em segundo lugar, o relatório ambiental da Metsa Botnia foi criticado em forma detalhada por um conjunto de técnicos vinculados ao grupo ambientalista uruguaio Guayubira.
Em terceiro lugar, nem a Metsa Botnia nem a Ence concluiram nenhum estudo sério a respeito dos possíveis impactos sociais negativos de seus empreendimentos, tanto no que se refere a previsíveis perdas de emprego (devidas à poluição produzida pelos efluentes líquidos e as emissões gasosas e com forte cheiro desagradável das plantas de celulose), quanto nos possíveis impactos sobre a saúde da população local. Por outro lado, ambas empresas exageraram quanto ao número de empregos “indiretos” que seriam gerados, com cifras sem fundamento algum.
Em quarto lugar, a instalação de uma ou duas plantas de celulose resultaria no aumento da área atualmente plantada de monoculturas florestais. Correponde ainda indicar que já vêm se constatando graves impactos ambientais e sociais nas plantações de eucaliptos existentes, que se agravariam caso a superfície plantada fosse ampliada.
É também importante assinalar os impactos que uma ou ambas plantas teriam quanto ao uso da infra- estrutura rodoviária do país devido ao trânsito de centenas de caminhões com cargas de 40 ou mais toneladas.
Além disso tudo, existem outros problemas não resolvidos relacionados com a instalação de ambas plantas:
1) Uma disputa internacional ainda não formalizada com a Argentina devida à possível poluição do rio Uruguai que é dividido por ambos países.
2) Um questionamento sobre a legalidade da concessão de uma zona franca a cada uma das duas empresas que pretendem instalar as fábricas de celulose.
3) Um questionamento sobre a legalidade do uso de enormes volumes de água e a possível poluição após ter sido aprovada a reforma constitucional da água nas últimas eleições.
Finalmente, é fundamental salientar a crescente oposição social a esses projetos, no que se refere tanto às plantações de eucaliptos quanto às fábricas de celulose”.
Por estas razões, as organizações assinantes reclamaram perante a Corporação Financeira Internacional que não se envolvesse nos projetos da Metsa Botnia e Ence e que não lhes concedesse crédito, já que a instalação das fábricas de celulose provocaria graves impactos ambientais e sociais que não vão resolver, antes, vão agravar os problemas vividos pelo país e a população.