Árvores geneticamente manipuladas: a perigosa "solução" da indústria da celulose

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Fabricar papel branco e limpo a partir de árvores é um negócio sujo. Para fabricar celulose kraft branqueada as árvores são transformados em cavacos que, posteriormente, passam por um processo de cozimento sob pressão, lavagem e branqueamento. No processo de cozimento, são usados produtos químicos tóxicos para remover a lignina, uma substância similar à cola que mantém ligadas as células da madeira e faz as árvores serem fortes. Por ser a lignina a causadora do amarelamento do papel, qualquer lignina remanescente deve ser branqueada.

Os cientistas florestais acreditam terem encontrado um modo menos poluidor para a fabricação de papel a partir de árvores. Através da engenharia genética é possivel produzir árvores com reduzidos níveis de lignina ou com lignina que pode ser mais facilmente extraída.

"A etapa custosa do processo de fabricação de celulose e papel, sob uma perspectiva tanto econômica quanto ambiental pode ser atribuída à remoção da lignina. Por esse motivo, é sumamente conveniente que novos meios sejam desenvolvidos com o intuito de reduzir o conteúdo de lignina ou de produzir uma lignina de mais fácil extração", explicaram cientistas florestais da Universidade de Oxford e da Universidade do Estado de Oregon em um documento publicado no Plant Biotechnology Journal em 2003.

David Herod, especialista em Biotecnologia do Departamento da Agricultura dos EUA argumenta que os cientistas têm a situação sob controle. "Nós estamos usando os melhores conhecimentos científicos de que dispomos para garantir que esta tecnologia seja usada com segurança", ele afirmou para a Associated Press em 2001.

Infelizmente, esses melhores conhecimentos científicos disponíveis fazem parte do problema. Os riscos associados às árvores transgênicas com quantidade reduzida de lignina têm a ver com árvores enfraquecidas em sua estrutura e portanto mais vulneráveis a tormentas. As árvores com quantidade reduzida de lignina são mais suscetíveis às infecções virais. A redução de lignina pode, por sua vez, diminuir as defensas das árvores diante do ataque de pragas, o que obrigaria a incrementar o uso de pesticidas. As árvores com baixa quantidade de lignina apodrecerão mais rapidamente, produzindo sérios impactos sobre a estrutura do solo e o ecossistema das florestas.

Se houvesse cruzamento entre árvores transgênicas com baixo conteúdo de lignina e árvores das florestas, esses impactos não se limitariam aos plantios. A presença de árvores que não podem resistir tormentas e que correm o risco de serem atacadas por pragas e infecções virais colocariam em discussão a sobrevivência das florestas naturais.

Malcolm Campbell do Departamento de Botânica da Universidade de Oxford é, no mundo, um dos principais pesquisadores no estudo de árvores transgênicas com baixo conteúdo de lignina. Ele confirma os riscos do "cruzamento à distância" (expressão usada pelos cientistas para o cruzamento de árvores de plantios com árvores florestais). "Como a maioria das árvores [de plantios] tem muitos parentes silvestres ou ferais, se reproduzem através de cruzamento à distância e manifestam um fluxo genético que cobre longos percursos por meio do pólen e, às vezes, das sementes, é provável que exista uma considerável preocupação de ativistas e da opinião pública a respeito do uso em grande escala de árvores manipuladas geneticamente", ele escreveu em 2003.

A solução proposta por Campbell e outros cientistas florestais para o "cruzamento à distância" é outra situação crítica da tecnologia. Eles estão trabalhando em manipulação genética de árvores para impedir que elas floresçam. Contudo, isso coloca dois problemas adicionais. Se as árvores forem, de fato, estéreis isso implica milhares de hectares de árvores sem flores, pólen, frutos ou sementes. Nem os pássaros nem os insetos poderiam viver em tais plantios e a biodiversidade nessa plantação seria ainda menor que nos plantios atuais de monoculturas de árvores. O segundo problema é que as árvores têm ciclos vitais muito longos. A única maneira de ter certeza de que as árvores geneticamente manipuladas para serem estéreis permanecerão nessa condição durante todo seu período de vida é promovendo repetidas experiências que devem durar as centenas de anos de vida das árvores.

Ao se focalizarem na lignina como a causa da poluição provocada pelas plantas de celulose, Campbell e seus colegas podem argumentar que uma solução razoável é reduzir a quantidade de lignina das árvores. Eles não levam em consideração outras soluções possíveis como o uso de outras colheitas por exemplo de cânhamo - planta que tem menores níveis de lignina que as árvores. Em vez de questionarem a natureza da indústria da celulose e do papel para a que eles estão trabalhando, os cientistas florestais estão se perguntado se a modificação genética para a redução de lignina dará bons resultados

Fiz algumas perguntas a Malcolm Campbell a respeito de seu trabalho sobre a modificação genética do conteúdo de lignina das árvores. Perguntei também se ele alguma vez tinha conduzido alguma pesquisa a respeito dos impactos dos plantios de árvores em escala industrial sobre as comunidades locais do Sul e se ele tinha visitado alguma comunidade local sem estar acompanhado por representantes da companhia responsável pelo manejo dos plantios. Campbell se recusou a responder. Em compensação, me convidou para visitar seu laboratório em Oxford, "assim nós podemos discutir largamente a complexidade de suas perguntas".

Desde sua invenção na Europa, em meados do século XVIII, as ciências florestais vêm se dedicando a satisfazer as necessidades da indústria madeireira. As paisagens simplificadas e os vastos plantios de monoculturas de árvores são diretamente decorrentes dessa atividade científica. No processo de simplificação, o uso das paisagens pelas comunidades locais é ignorado ou violentamente suprimido.

A engenharia genética focalizada na redução de lignina das árvores é a última oferta das ciências florestais para incrementar os lucros da indústria do papel e da celulose. Não providenciará benefícios para as comunidades que vivem nas proximidades dos plantios de árvores transgênicas. Em vez de resolver os problemas dos plantios de monoculturas, o remendo genético com o intuito de fazer as árvores se adaptarem às necessidades da indústria da celulose unicamente servirá para piorar a situação.

By: Chris Lang, e-mail: chrislang@t-online.de