Gana: Banco Mundial por trás do cenário do ouro

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Décadas de desmatamento e degradação fizeram com que só restassem incólumes menos de 2% das florestas nativas de Gana. Essas florestas são fonte de sustento para os povos que delas dependem, pois fornecem lenha, carvão, material de construção, forragem, frutos, nozes, mel, remédios e pigmentos. Ao mesmo tempo, cumprem uma importante função na prevenção da erosão do solo, na proteção das bacias, na fertilidade e sombra para o solo, na proteção contra o vento, na prevenção de enchentes e deslizamentos de terra, na retenção da água e na conservação da pureza da água. Além disso, constituem o lar de 2.100 espécies de plantas, mais de 200 espécies de mamíferos (incluindo o búfalo, o leopardo, o gato dourado, o chimpanzé, o elefante e o hipopótamo pigmeu), 200 espécies de aves (entre elas, o periquito cinza africano) e borboletas, todas elas reconhecidas internacionalmente como espécies em perigo de extinção, o que fez com que essas florestas fossem tombadas como Áreas de Proteção Biológica Especial e Áreas com Biodiversidade de Relevância Mundial.

Em 1994, alguns esforços voltados para a proteção dos remanentes de savana e florestas tropicais úmidas deram lugar à elaboração de um rascunho de Política de Florestas e Vida Silvestre. No entanto, a teoria econômica dominante, que sentencia os países do Sul ao esgotamento dos recursos naturais com vistas ao seu desenvolvimento – um caminho que causa contaminação, deslocamento de comunidades, miséria e fome para a maioria, e enormes lucros para um punhado de empresas e elites locais –, faz forte pressão através de seus instrumentos multilaterais de poder (o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional).

No caso de Gana, a extração de ouro foi por eles definida como o destino do país (veja o boletim 68 do WRM). Gana é o segundo produtor de ouro da África, lugar conquistado a expensas da natureza e dos direitos humanos (veja os boletins 41 e 54 do WRM). Nesse país, a mineração é responsável pelo deslocamento – sem indenização justa – de 50 mil moradores indígenas, pelo emprego de menos de 20 mil ganenses (devido à dependência dos trabalhadores estrangeiros), pela queima de aldeias, a prisão ilegal de ativistas, o estupro de mulheres e a rejeição permanente da cultura local. Porém, trata-se de um modelo bem estabelecido e comum a quase todas as comunidades mineiras.

No instante em que o preço internacional do ouro atingia o nível mais alto dos últimos seis anos, devido à precaução dos investidores face à iminente guerra contra o Iraque, o governo anunciou que estava prestes a abrir a floresta protegida à mineração, dessa forma entregando a riqueza biológica do país. A Newmont – uma empresa produtora de ouro e líder em tecnologia de extração e processamento, com sede em Denver, Colorado, Estados Unidos – e outras empresas de mineração tinham feito ameaças veladas com processos judiciais ou fechamento total e transferência para a Tanzânia, para “convencer” o governo de manter as licenças após o início da exploração.

A mineração em ecossistemas de floresta prístina vai disparar o desmatamento em massa e a degradação ambiental do país, além de contaminar com cianeto e arsênico frágeis ecossistemas de água doce e o solo superficial. “Basta olhar para o patrimônio florestal deste país. A gente tinha cerca de 8,3 milhões de hectares, e agora só resta 1,2 milhão. E a gente ainda quer entregar mais alguns para a mineração, quando sabemos perfeitamente que, depois dela, não haverá mais florestas”, afirmou Abraham Baffoe, da organização Amigos da Terra. “Os nossos povoados já foram vorazmente desmatados pela mineração, e a saúde e qualidade das florestas que ainda restam continuam em queda. Agora, eles pedem para a gente entregar as reservas de floresta. Será que eles acham que os ganenses somos tolos? Por favor, escreva o que eu acabei de dizer e fale para as autoridades que fui eu quem falou”, afirmou Akosua Birago, um agricultor de 62 anos de idade, de Abekoase, oeste de Gana.

Apesar da ministra das Minas, Cecília Bannerman, ter negado a entrega de licenças a empresas de mineração para extração em reservas de floresta, o Presidente garantiu à Newmont que o seu governo estava disposto a apoiar a empresa, para que ela pudesse operar sem problema no país.

No dia 14 de janeiro de 2004, a Coalizão Nacional da Sociedade Civil e Grupos Comunitários de Gana (Ghana National Coalition of Civil Society and Community Groups) contra a mineração em reservas de floresta, que reúne mais de 17 ONGs e grupos comunitários, enviou uma segunda carta ao presidente do Grupo do Banco Mundial (GBM), James Wolfensohn. Na carta, a Coalizão lembrava o presidente do abaixo-assinado enviado no ano anterior, exigindo do governo de Gana o cancelamento de toda licença de extração de minerais nas reservas de floresta do país e exortando o GBM a dizer às claras que não concordava e não pretendia apoiar a autorização de atividades mineradoras nas reservas de floresta de Gana, além de solicitar uma resposta formal do Banco Mundial ao pedido da Coalizão (veja o boletim 71 do WRM). Até a presente data, a Coalizão não recebeu uma resposta do Banco Mundial.

Pelo contrário, as empresas de mineração continuam com os preparativos para a extração de metais em algumas reservas de floresta. Em dezembro de 2003, o governo de Gana e a Newmont Mining assinaram um contrato de investimento. No mês de janeiro de 2004, a Agência Ganesa de Proteção ao Meio Ambiente divulgou a Avaliação de Impacto Ambiental (AIA) do projeto da empresa Chirano Gold Mines na reserva de floresta de Tano-Sraw, no oeste de Gana. Também em 2004, a empresa canadense de extração de diamantes PMI Ventures anunciou o início da seguinte fase de sondagem para a extração de diamantes em nove concessões, além de pedidos de exploração mineira, incluindo a mina de ouro Ashanti II, localizada no sudoeste de Gana.

As entidades sociais acham que o GBM está sabendo disso e que apoia totalmente o governo e as empresas, fato que explica o longo silêncio e a evidente indiferença em relação à carta. O GBM tem uma longa história de envolvimento com o setor da mineração e a exploração florestal em Gana, fornecendo assistência técnica em matéria de reforma de políticas e instituições, bem como investimentos e apoio às atividades do setor.

Isso acontece num momento em que o GBM está estudando a sua resposta ao relatório da Revisão das Indústrias Extrativistas (EIR, em inglês), que recomendou a busca sem trégua da boa gestão, o respeito pelos direitos das comunidades nos projetos de mineração e a plena implementação da Política de Hábitats Naturais, como base para uma clara definição das áreas de acesso proibido.

Portanto, o silêncio do Banco Mundial é uma clara evidência de sua vontade de apoiar as empresas de mineração na destruição das florestas que ainda restam no país; é sinal de que continuará apoiando a destruição da base de sustento dos moradores locais e de que não está preocupado com o destino de nenhuma espécie ameaçada.

Artigo baseado em informação de: “Newmont Meets Media”, Isaac Essel, Accra Mail, http://allafrica.com/stories/200403030502.html ; “Newmont Moves In to Open Ghana’s Closed Forest Reserves”, Charity Bowles, quem trabalhou com a Amigos da Terra-Gana, na National Coalition on Mining, enviado por Mike Anane, correio eletrônico: lejcec@ghana.com ; “Newmont Boss Presents Straight-Faced Joke to Ghana’s President”, Allan Lassey, Third World Network, http://twnafrica.org/event_detail.asp?twnID=438 ; “Canadian explorer starts drilling at Ghana gold project”, Creamer Media (Pty) Ltd, http://www.engineeringnews.co.za/eng/utilities/search/?show=46618