A questão das florestas também foi abordada numa das conferências do Fórum Social Mundial, como parte de um tema mais amplo: “O deslocamento induzido pelo desenvolvimento. Perspectivas e estratégias” (1).
Todos os oradores ressaltaram a relação existente entre o chamado desenvolvimento e o deslocamento – forçado ou “voluntário” – dos moradores locais atingidos por projetos de “desenvolvimento”. Atividades como a extração de madeira, barragens, plantações, mineração, áreas protegidas e turismo deram no mesmo resultado: a apropriação de terras e recursos pertencentes às comunidades locais e o deslocamento de milhões de pessoas atingidas por esses projetos.
Esclareceu-se também que os problemas apresentados não eram casos isolados; pelo contrário, repetiam-se na maioria – se não em todos – dos países do Sul: barragens destruindo florestas e formas de sustento de povos locais numa infinidade de países, da Índia ao Brasil; a extração de madeira trazendo os mesmos resultados tanto na África quanto na América Latina e na Ásia; uma mineração igualmente prejudicial na África do Sul e nas Filipinas. Portanto, os países mencionados são apenas “casos” num vasto mar de destruição que abrange todo o Sul.
Dentre os casos apresentados, achamos pertinente salientar os impactos menos conhecidos do turismo em florestas litorâneas e recursos pesqueiros. Um dos oradores (Hare Krishna Devnath, líder do Movimento de Pescadores) começou dizendo que “montanhas, mares e florestas atraem as pessoas” e que os mesmos “são entregues ao turismo para proporcionar prazer a quem dispõe de dinheiro e tempo para curtir”. Contudo, para tornar isso possível, “os pescadores são deslocados desses locais”. Particularmente, nas últimas duas décadas, em “países como a Malásia, a Indonésia, a Tailândia e a Índia, o turismo tem deslocado vários milhares de pescadores de suas florestas, sendo que as terras foram entregues à grande indústria”. Visto que o turismo virou indústria mundial, esse tipo de “desenvolvimento” constitui uma importante ameaça contra numerosas comunidades no mundo todo.
Assim, o chamado “desenvolvimento” é positivo para uns poucos e negativo para a maioria. No caso das florestas, ele implica o deslocamento dos povos que moram nelas, em benefício das empresas que provocam sua destruição.
Foi demonstrado também que a denominada conservação traz graves problemas para as comunidades das florestas – inclusive, o despejo forçado –, além de não abordar as causas verdadeiras do desmatamento, profundamente enraizadas no modelo de desenvolvimento dominante.
Nesse contexto, foi importante contribuir com idéias, a fim de avançar no questionamento tanto do modelo de desenvolvimento dominante quanto da sua “solução” impopular à questão da conservação.
Nessa conferência, pois, foi oficialmente lançada a Iniciativa de Mumbai para as Florestas, como forma simbólica de salientar o aspecto social do desmatamento e a conservação das florestas, cabendo ressaltar o fato dela ter surgido no contexto de um Fórum Social Mundial.
(1) Organizada por: National Alliance of People’s Movements, Índia; Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Brasil; Anti Privatization Forum, África do Sul; Focus on the Global South, Filipinas; Lokayan; National Forum of Forest People and Forest Workers; Mines, Minerals and People; Narmada Bachao Andolan; Delhi Forum, Índia; e Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais. Painelistas: Smithu Kothari de Lokayan, diretor do programa Seeds of Hope and Tribal Self Rule; Trevor Nwane, Anti Privatization Forum, África do Sul; Indu Netam, Mines, Minerals and People, Índia; José Josevaldo de Oliveira, Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Brasil; Hare Krishna Devnath, líder do Movimento de Pescadores; Ricardo Carrere, Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais, Uruguai; Ashok Choudari, National Forum of Forest People and Forest Workers, Índia; Walden Bello, Focus on the Global South, Filipinas; e Medha Patkar, National Alliance of People’s Movements, Índia.