Em 1998, o escritor Joe Broderick concluiu uma pesquisa sobre a empresa Smurfit Cartón de Colombia, publicando seu livro “O império do papelão: impacto de uma multinacional do papel na Colômbia”. Nele são documentados em detalhe os graves impactos sociais e ambientais resultantes das atividades da filial da transnacional irlandesa Jefferson Smurfit nesse país.
Em novembro deste ano, o WRM foi convidado por organizações colombianas a percorrer a região atingida pelas plantações de pinheiro e eucalipto da Smurfit, podendo assim observar de perto a problemática e ouvir a opinião da população local de forma direta. A visita não só confirmou amplamente a informação fornecida por Broderick, mas, também, mostrou que a empresa não mudou em absoluto a sua política em relação às pessoas e o ambiente, e que seu relacionamento com a sociedade local continua tão problemático quanto na época da publicação desse livro.
Nada disso podia chamar a atenção, pois os impactos provocados na vizinha Venezuela por uma filial dessa mesma empresa já tinham sido inventariados pelo WRM, por ocasião de uma visita similar, em dezembro de 1998, à área de plantações da Smurfit Cartón de Venezuela. Em matéria escrita a partir dessa visita concluímos que “o modelo de ‘desenvolvimento’ implementado pela Smurfit em Portuguesa é insustentável, tanto do ponto de vista social quanto ambiental. Apesar da política de fustigação e repressão, a empresa não perece ter tido sucesso quanto a dobrar a determinação das pessoas de se opor a tais atividades, abrindo-se um grande ponto de interrogação quanto ao tempo que poderão sobreviver suas plantações (mesmo protegidas com arame farpado, cães e homens armados), cercadas como estão por centenas de pessoas que odeiam essas árvores e a empresa que representam. Se normalmente as plantações florestais são insustentáveis, nesse caso, elas parecem ser mais insustentáveis que nunca”.
Coisa similar poder-se-ia dizer dos impactos na Colômbia, onde a empresa tem estado envolvida em processos de desmatamento, provocando impactos na água, na fauna e na flora, e onde tem sido fator-chave na expulsão da população rural das áreas onde se instalou. Todas essas coisas – e muito mais – surgem das entrevistas do WRM com moradores locais, realizadas no mês passado.
A população local disse que “as plantações acabaram com a água”, que “a fumigação estraga tudo quanto existe no solo”, que “quase não existe mais fauna”, que antigamente havia “nuvens de pássaros” e que “agora só no verão aparece algum, mas, no inverno, não”, e que “o peixe também acabou”.
Quanto ao serviço, eles informaram que “o trabalho todo é feito de empreitada” (por empreiteiros) e que “o contrato é para trabalhar como duas pessoas, mas recebendo como uma”. Como acontece na selva, ali apenas sobrevive o mais forte: “se a gente não atinge o rendimento, é mandado embora, a pessoa não pode ter mais de 40 anos de idade e todos devem ser fortes para alcançar esse rendimento”. No que diz respeito à organização dos trabalhadores, não só não existe sindicato, mas, também, “quem espernear está fora” e “aqui não se fala mais nisso”.
Com esse histórico, ninguém poderia achar que a empresa estivesse interessada na questão da certificação de madeira produzida de forma social e ambientalmente responsável. Os seus mais de 60 mil hectares plantados com monocultura de árvores não estão certificados, e duvidamos que isso venha a acontecer. Portanto, chama poderosamente a atenção que a Smurfit faça parte do próprio Conselho Diretor do FSC (Forest Stewardship Council), considerado mundialmente um dos sistemas de certificação mais críveis. A página Web do FSC informa que o Sr. Victor Giraldo representa essa empresa no Conselho do FSC.
Pouco bem faz ao FSC a sua presença, e alguém deveria começar a fazer as perguntas do caso. Da nossa parte, estamos à disposição do FSC para ampliar a informação que possuímos sobre a empresa.
Artigo baseado em informação de: Carrere, R. “Relatório de viagem às áreas da Colômbia com plantações da Smurfit, 31/10/03-7/11/03” (relatório interno); página Web do FSC: http://www.fscoax.org/html/5-1-1.html ; Broderick, J. “El imperio de cartón: impacto de una multinacional papelera en Colombia”. Bogotá: Planeta, 1998; Carrere, R. “Smurfit Cartón de Venezuela: as plantações da discórdia” http://www.revistadelsur.org.uy/revista.087-088/WRM.html ).