Jordan Ryan, diretor, no Vietnã, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), está muito interessado no desenvolvimento sustentável. Em maio de 2002, foi lançada publicamente uma parceria entre agências de ajuda, ONGs e ministérios do governo, para proteger o meio ambiente no Vietnã. Nessa ocasião, Ryan anunciou que: “Se formos bem-sucedidos, um dia se dirá desta nova parceria que ‘fez do desenvolvimento sustentável uma realidade no Vietnã’”.
Poucas semanas depois, desta vez, durante a assinatura de um projeto de 2 milhões de dólares denominado Vietnã Agenda 21, Ryan declarou: “O desafio é tornar real o desenvolvimento sustentável no Vietnã”.
Um dos projetos do PNUD no Vietnã chama-se Conservação dos Recursos das Áreas Protegidas (PARC, em inglês). O projeto tem financiamento conjunto do Fundo para o Meio Ambiente Mundial (FMAM, ou GEF em inglês) e abrange três áreas protegidas, entre elas, a Reserva Natural de Na Hang, no norte do Vietnã. A reserva foi tombada pelo governo vietnamita em 1994, para proteger o hábitat da maior população de Rhinopithecus avunculus (Pygathrix a.), uma espécie de macaco seriamente ameaçada e que somente pode ser achada em quatro lugares, sendo Na Hang um deles (ver o boletim 55 do WRM).
No começo de junho de 2002, a empresa Song Da Construction Corporation ofereceu uma festa em Na Hang, para comemorar o início das obras de construção da hidrelétrica de Na Hang. A represa de 342 MW inundará uma das áreas ribeirinhas mais belas da Reserva Natural de Na Hang, em especial, a floresta prístina adjacente à área onde habita o Rhinopithecus avunculus (Pygathrix a.), um macaco muito sensível a qualquer tipo de alteração.
No fim do ano passado, a Song Da Construction Corporation já tinha removido mais de dois milhões de metros cúbicos de terra e rocha no local da construção. Hoje, uma ponte de concreto atravessa o rio Gam, sendo que já foi despejada a primeira das 3.300 famílias que serão transferidas para ceder lugar ao lago artificial atrás da barragem.
A consultora Scott Wilson Asia-Pacific ganhou do PARC o contrato para gerir a Reserva Natural de Na Hang. Numa avaliação ambiental preliminar da barragem, realizada no marco do projeto PARC, a Scott Wilson escreveu que: “Uma barragem em Na Hang tem potencial para provocar importantes impactos nos recursos naturais da região, bem como na população local, tanto aquela que será reassentada quanto a que ficará no local”.
No entanto, na página Web do PARC, não é feita menção alguma da barragem de Na Hang. Ali somente são enumeradas as ameaças que enfrenta a reserva natural e mencionadas a “agricultura e a conversão da terra... a extração de madeira, a caça de fauna selvagem e a produção insustentável de produtos florestais menores”.
De forma similar, alguns dos proponentes da barragem não fazem menção alguma da Reserva Natural de Na Hang ao analisarem a barragem de Na Hang. Em abril de 1999, um consórcio de firmas consultoras deu início a um Estudo de Plano Hidrelétrico Nacional no Vietnã, com financiamento dos governos da Suécia e da Noruega. A barragem de Na Hang figura na relação de barragens que os consultores aconselharam construir. Em suas recomendações, os consultores, a SWECO Internacional (da Suécia), a Statkraft Engineering e a Norplan (da Noruega), não fazem nenhuma referência à Reserva Natural de Na Hang.
No rascunho de um relatório preliminar elaborado em 1999, os consultores escreviam o seguinte: “Não existem espécies raras registradas especificamente no local do projeto e, aparentemente, as áreas protegidas não ficam muito perto”. E acrescentavam: “Será preciso checar isso. Não é possível prevê-lo nesta fase”. Os consultores escreveram isso cinco anos depois do governo vietnamita ter tombado a Reserva Natural de Na Hang.
Embora a construção da barragem tenha sido iniciada, o financiamento do projeto ainda é incerto. A empresa estatal Electricity of Vietnam (EVN) terá de desembolsar 43 milhões de dólares, para cobrir os custos do projeto. O governo já pagou à EVN 85 milhões de dólares, para as operações de remoção de terra e reassentamento.
A EVN está tentando conseguir 260 milhões de dólares, através de empréstimos comerciais de bancos vietnamitas. Serão necessários mais 80 milhões de dólares para pagar o equipamento técnico.
Porém, ao que parece, os bancos vietnamitas estão com um pé atrás quanto ao financiamento do projeto. Um alto executivo do Banco Industrial e Comercial do Vietnã declarou à publicação Vietnam Investment Review que: “O difícil é que [os bancos vietnamitas] já tiveram participação em vários projetos energéticos de grande porte no ano 2002”. Um outro alto executivo do Vietcombank comentou que era pouco provável que esse banco financiasse, ele só, o projeto. “Teríamos que trabalhar com outros [bancos] para oferecer empréstimos em conjunto”, ele disse.
Em fevereiro do ano 2003, Dinh Quang Tri, subgerente geral da EVN, disse que a EVN estava analisando a possibilidade de pedir a fornecedores estrangeiros de equipamento que os ajudassem a financiar o projeto. “Faríamos uma licitação onde o investidor estrangeiro fornecedor de equipamento pudesse cobrir também o financiamento, ou, então, a EVN poderia utilizar o método de pagamento diferido”, declarou Tri.
Foi informado que a empresa Song Da Construction Corporation está trabalhando com várias firmas internacionais, entre elas, a Alstom (da Suíça), a Shanghai Electric Corporation, o Grupo DongFang e o Grupo Harbin (da China), a Energomachexport e a Technopgomexport (da Rússia), a Siemens (da Alemanha) e a VA Tech (da Áustria).
Em novembro do ano passado, o jornal Vietnam Economic Times informou que o governo da França tinha topado fazer uma doação para o projeto hidrelétrico de Na Hang. A notícia foi divulgada pouco depois de o Presidente do Vietnã, Tran Duc Luang, ter feito uma visita à França.
Quando do lançamento do projeto Vietnã Agenda 21, Jordan Ryan, do PNUD, comentou que: “Para ter um desenvolvimento sustentável, é necessário que o Vietnã responda a perguntas incômodas e faça escolhas difíceis”. No entanto, os “especialistas” internacionais altamente remunerados, que trabalham para o PNUD, o FMAM, a Scott Wilson, a SWECO Internacional, a Statkraft Engineering e a Norplan, sequer formularam perguntas incômodas a respeito da barragem de Na Hang e de seu impacto nas florestas, na população e na flora e fauna da Reserva Natural de Na Hang.
Por: Chris Lang, correio eletrônico: chrislang@t-online.de