A mineração é uma das atividades mais lucrativas da Indonésia, mas, ao mesmo tempo, está destruindo recursos naturais de que dependem o sustento e a saúde de dezenas de milhões de indonésios da cidade e do campo. Entre esses recursos, estão as outrora vastas florestas do arquipélago, cuja destruição é hoje muito mais acelerada do que antigamente.
Na Indonésia, os problemas da mineração e a destruição das florestas estão íntima e inevitavelmente ligados, já que grande parte da área continental do país é (ou era) floresta, e que grande parte do subsolo rochoso contém minerais com valor comercial.
Atualmente, as florestas (inclusive as degradadas e fragmentadas) cobrem menos da metade da área continental total do país, cerca de 189 milhões de hectares. Essas florestas foram divididas em: áreas que podem ser exploradas (florestas de produção); aquelas que podem ser convertidas a outros usos, como plantações ou arrozais (florestas de conversão); e aquelas que não devem ser exploradas (para proteger bacias, acolher santuários de fauna, etc.). Este último tipo inclui florestas de proteção (oficialmente, 35 milhões de hectares) e florestas de conservação (19 milhões de hectares).
Por outro lado, as concessões mineiras ocupam uma área de aproximadamente 47 milhões a 67 milhões de hectares, sendo que a área total de florestas com potencial para a mineração foi calculada em 84,7 milhões de hectares. Dentre as concessões existentes, há uma com 11, 4 milhões de hectares que chama poderosamente a atenção, pois se sobrepõe às florestas de proteção e conservação, mormente na Papua Ocidental, Sumatra e Kalimantan.
Desde a aprovação da nova Lei de Exploração Florestal, em 1999, a mineração a céu aberto é proibida nessas florestas, deixando para lá as atividades de exploração e a construção de infra-estrutura mineira de aproximadamente 150 empresas. As ONGs indonésias, lideradas pela rede JATAM de ação contra a mineração, lançaram uma forte campanha para manter a proibição. Mas existe uma forte pressão da indústria mineira, de membros pró-mineração do governo de Jacarta e de governos estrangeiros para contorná-la. Essa questão provocou um importante confronto entre o Ministério de Exploração Florestal, que quer manter a condição de floresta protegida, de um lado, e os outros ministérios, liderados pelo ministro de Energia e Recursos Minerais da Indonésia, Purnomo Yusgiantoro, do outro. Isso fez com que as decisões sobre o destino das concessões mineiras outorgadas antes de 1999 fossem adiadas.
Em abril, o Ministério de Exploração Florestal anunciou de má vontade que seis empresas podiam continuar com suas atividades mineiras; em três dessas áreas, foram modificados os limites das florestas para adequá-los às atividades empresariais. Supunha-se que haveria uma decisão sobre vinte e duas empresas antes do final de junho, mas, no dia 17 de junho, Purnomo anunciou que quinze delas (inclusive três concessões mencionadas pelo Ministério de Exploração Florestal) seriam autorizadas a continuar com suas atividades, sujeitas a autorização presidencial. Ele afirmou que só o investimento das quatro maiores concessões representava 9 bilhões de dólares. As ONGs prevêem que uma decisão a favor da mineração agravará o conflito com as comunidades locais cujas terras serão expropriadas para a mineração, aumentando a poluição nos cursos de água e as enchentes e deslizamentos de terra, com trágicas conseqüências, enquanto se perde cobertura florestal.
Uma decisão contra a proteção das florestas representará, também, a continuação de uma política que data da época do regime do ex-presidente Suharto, quem sempre favoreceu os interesses dos investidores (e a perspectiva de encher o próprio bolso) e não os dos indonésios comuns, que são os que pagaram os custos ocultos produzidos pela mineração em suas formas de sustento, sua economia, sua cultura e sua saúde.
Muitos dos poderosos atores industriais que se beneficiaram na era de Suharto são os mesmos que hoje reclamam contra a proibição de realizar atividades de mineração nas florestas de proteção, contra a falta de certeza legal gerada pelo programa de descentralização da Indonésia e porque o Estado não consegue conter os manifestantes e mineiros ilegais que ameaçam suas atividades. Entre eles estão a Rio Tinto, Freeport MacMoran, BHP-Billiton, Newmont, BP e Inco, grandes empresas multinacionais cujas operações geram conflitos com as comunidades locais e causam dano ambiental em muitos países. O que essas empresas não reconhecem é o papel que desempenharam, de apoio a uma ditadura baseada no saqueio na marra dos recursos naturais e no roubo de terras e florestas da população. Não é de se estranhar que, no breve período pós-Suharto, quando foi necessário fazer concessões a uma população indignada, a indústria mineira tenha perdido alguns dos seus privilégios.
Hoje, a justificação para permitir a mineração em florestas de proteção baseia-se na necessidade de atrair investimentos que ajudem a Indonésia a sair da prolongada crise econômica, uma medida apoiada pelos credores da Indonésia da comunidade internacional. Porém, as ONGs são cépticas em relação a se a receita gerada pela mineração poderia chegar sequer a compensar o estrago ambiental e social a longo prazo causado por essa atividade, inclusive, sem a corrupção que garante que bem poucos benefícios cheguem às comunidades.
É lógico que também tem o lucro como motivação; isso, em especial, diz respeito aos interesses do Exército da Indonésia, porquanto 75% de sua receita vem de "atividades comerciais" extraorçamentárias. O lucro também é responsável por uma sobreposição financeira entre a mineração e as florestas, já que os interesses comerciais militares incluem tanto atividades relacionadas com a extração de madeira quanto com a mineração. Vão de contratos para fazer a segurança de grandes operações mineiras estrangeiras (generosamente pagos pela empresa envolvida), até a participação direta em operações ilegais de mineração e extração de madeira, em parceria com empresários e funcionários do governo local corruptos, os quais não estão nem um pouco preocupados com os impactos que provocam nas florestas e na população local. A polícia especial da Indonésia (Brimob) também está envolvida, em especial, como seguranças dos locais das empresas e enfrentando a oposição. Nas áreas problemáticas de Aceh e Papua Ocidental, onde ricas florestas e recursos minerais oferecem uma infinidade de oportunidades para o lucro, os militares chegaram a provocar conflitos para poder justificar sua presença permanente na região.
Atualmente, aproveitando a agenda do antiterrorismo mundial e a estreita ligação com a Presidenta Megawati, o Exército exerce uma maior influência sobre os políticos indonésios. Isso traz graves conseqüências para todos os indonésios, pois poderiam vivenciar uma volta ao "regime de segurança" da época de Suharto, sob o qual as disputas pela terra e pelos recursos eram resolvidas através de intervenção militar. Para os povos indígenas e demais comunidades que habitam as florestas, cujas terras possuem recursos minerais almejados pelos mercados mundiais, o panorama é funesto. O aumento da influência do Exército implicará mais deslocamentos forçados para dar lugar às minas, maior destruição dos recursos florestais e mais intimidação e violência contra aqueles que reclamam. Também significa uma luta mais dura para garantir o reconhecimento do direito dos povos indígenas à propriedade e manejo de suas florestas.
Por: Carolyn Marr, Down to Earth, International Campaign for Ecological Justice in Indonesia, correio eletrônico: dte@gn.apc.org , http://dte.gn.apc.org . Fonte: Boletins DTE (53-54, 55 e 57 - veja http://dte.gn.apc.org/news.htm ), http://www.jatam.org e fontes da mídia. Para mais informação sobre a campanha contra a mineração e pela proteção e conservação das florestas, visite o sítio Web http://www.jatam.org