Com o apoio de 60 organizações de diversos países do mundo, o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) do Brasil apresentou uma carta às autoridades do Estado do Pará solicitando que, de forma urgente, regularizem as terras de três comunidades camponesas ameaçadas de despejo.
Na carta, entregue em 25 de março, as organizações afirmaram: “Com muita apreensão, tomamos conhecimento da situação das famílias nas comunidades de Virgílio Serrão Sacramento em Moju, de Raiz de Jessé em Santo Antônio do Tauá e de Mocilandia em Maracanã, todas localizadas no estado do Pará, por correrem risco de ser despejadas de suas terras pelas empresas de plantações de monocultura do dendê Brasil Bio Fuels (BBF), Dendê do Pará (Denpasa), e um fazendeiro conhecido na região como o ´Rei do Charque´, respectivamente.”
Eles solicitaram “com urgência, ao governo do estado do Pará, que através de seus órgãos competentes, em especial o ITERPA, tome as medidas urgentes no sentido de realizar as vistorias solicitadas pelas comunidades para que elas possam comprovar a legitimidade de sua ocupação, além de imediatamente prosseguir com a regularização das terras em favor dessas comunidades”.
Leia a carta completa abaixo ou baixe-a em PDF aqui.
Carta de Apoio às Comunidades Camponesas de Virgílio Serrão Sacramento em Moju (PA), Raiz de Jessé em Santo Antônio do Tauá (PA) e Mocilândia em Maracanã (PA)
Ao Governador do Estado do Pará, Sr. Helder Zahluth Barbalho. E-mail: gabinetedogovernador@palacio.pa.gov.br
Ao Presidente do Instituto de Terras do Pará (ITERPA), Sr. Bruno Yoheiji Kono Ramos. E-mails: bruno.ramos@iterpa.pa.gov.br e graca.cavada@iterpa.pa.gov.br
À Ouvidoria do Instituto de Terras do Pará (ITERPA), Sr. Aldenor Gonçalves do Nascimento. E-mail: aldenor.nascimento@iterpa.pa.gov.br
25 de março de 2024
Excelentíssimos Senhores,
Com muita apreensão, tomamos conhecimento da situação das famílias nas comunidades de Virgílio Serrão Sacramento em Moju, de Raiz de Jessé em Santo Antônio do Tauá e de Mocilandia em Maracanã, todas localizadas no estado do Pará, por correrem risco de ser despejadas de suas terras pelas empresas de plantações de monocultura do dendê Brasil Bio Fuels (BBF), Dendê do Pará (Denpasa), e um fazendeiro conhecido na região como o ´Rei do Charque´, respectivamente.
Essas três comunidades ocupam suas terras, com moradias e plantações de produção de alimentos consolidadas há vários anos. Durante todo esse tempo, solicitaram ao governo do Estado do Pará a regularização fundiária na certeza de que estão ocupando terras públicas pertencentes ao estado do Pará. Mas devido a processos judiciais ingressados na Vara Agrária de Castanhal pelas empresas e empresário citados, essas comunidades correm sério risco de serem despejadas. Por isso, torna-se mais do que urgente, uma vistoria do ITERPA para a elaboração de um estudo fundiário que possa comprovar as alegações das comunidades e evitar que elas sejam despejadas de forma ilegítima e com consequências desastrosas para as mesmas.
As 50 famílias da comunidade Virgílio Serrão Sacramento em Moju se juntaram no final de 2015 e reocuparam o território de onde várias delas foram vítimas de grileiros, na certeza que aquela terra era terra pública e para evitar sua apropriação pela empresa Brasil Bio Fuels. A comunidade solicitou em 2016 a regularização do território ao ITERPA. O processo foi iniciado, porém paralisado em 2020, devido ao fato que a BBF tinha recorrido à Justiça, reivindicando a propriedade da área. Em 2023, o Juiz da Vara Agrária de Castanhal, após a audiência de justificação, manteve a liminar de reintegração de posse do imóvel, mesmo diante da manifestação em contrário por parte do Núcleo Agrário e Fundiário do Ministério Público do Pará. Vale ressaltar que a cadeia dominial, bem como outros documentos utilizados na ação foram produzidos pela própria empresa, com o objetivo de obrigar as famílias a desocuparem a área. Diante disso, as famílias demandam uma vistoria d membros da Comissão de Conflitos Fundiários do estado do Pará.
As mais de 20 famílias da comunidade Raiz de Jessé em Santo Antônio do Tauá estão na mesma situação. Elas vivem há 9 anos na área ocupada. Além de também terem suas moradias e plantações consolidadas, as famílias fizeram o registro do Cadastro Ambiental Rural (CAR) coletivo de sua área. Elas enfrentam, desde 2009, uma ação judicial da empresa Dendê do Pará que tenta se passar por proprietária da área. Essa situação ocasiona muitas dificuldades para os moradores, entre as quais a falta de acesso à energia elétrica adequada, e ruas de difícil acesso. Em decorrência da ação judicial movida pela empresa, o poder público está impedido de realizar reparos ou melhorias, e impossibilita o acesso das famílias a políticas públicas da agricultura familiar.
A mesma situação é enfrentada pelas mais de 100 famílias na comunidade de Mocilandia que já estão há 10 anos nas suas terras. A ameaça de despejo coloca em risco tudo a comunidade conquistou e construiu: escola, posto de saúde e acesso a políticas públicas. Além disso, o despejo traria graves problemas sociais ao município e aos moradores locais que dependem dos serviços de saúde e educação fornecidos na comunidade. São centenas de famílias que têm a área como residência e fonte de renda.
É inadmissível que o Estado não tome as medidas cabíveis para defender essas comunidades. Ainda mais porque essa omissão coloca em risco a sobrevivência e futuro de centenas de famílias que produzem e comercializam alimentos saudáveis, gerando renda não só para suas famílias, mas também beneficiando a economia municipal e regional do estado, com produtos como açaí, pupunha, farinha de mandioca, entre outros.
“Nós construímos tudo aqui: nossas casas, nossa criação, nossas roças, nossas hortas, para nossa sobrevivência. Hoje, as famílias vivem de tudo aquilo que foi construído por elas, de forma coletiva, e trabalhando de uma forma carinhosa, cuidando da terra, respeitando o meio ambiente, tudo que vive na natureza. Hoje as famílias precisam muito dessa terra para continuar o seu viver, o seu dia-dia, ajudar sua família, ajudar outras comunidades que precisam do apoio da nossa. Hoje a BBF tenta tirar a terra das famílias através de uma liminar, enquanto há muito indício de grilagem que a BBF vem fazendo no estado do Pará, e através disso ela tenta tirar as famílias de suas terras, e é muito lamentável o que está ocorrendo. A comunidade se encontra dentro de uma terra pública, do Estado, então se a terra é pública onde as famílias moram, o governo do estado precisa apoiar, dar apoio às famílias. A gente deixa aqui nosso repúdio a essa situação; que as autoridades possam vir e nos ajudar para nos mantermos, para poder viver aqui enquanto comunidade.
Fala de membro da comunidade Virgílio Serrão Sacramento, publicada em quatro idiomas no boletim do Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais.
Declaramos toda a nossa solidariedade às famílias de Virgilio Serrão Sacramento, Raiz de Jessé e Mocilândia, e reforçamos seu pedido solicitando, com urgência, ao governo do estado do Pará que através de seus órgãos competentes, em especial o ITERPA, tome as medidas urgentes no sentido de realizar as vistorias solicitadas pelas comunidades para que elas possam comprovar a legitimidade de sua ocupação, além de imediatamente prosseguir com a regularização das terras em favor dessas comunidades.
Atenciosamente,
1. Acción Ecológica, Ecuador
2. Amigos da Terra, Brasil
3. Amigos da Terra/Friends of the Earth, EUA
4. Amigos de la Tierra América Latina y el Caribe (ATALC), Internacional
5. Biofuelwatch, EUA-Grã-Bretanha
6. CEDENMA, Ecuador
7. CENSAT Agua Viva, Colombia
8. COECOCEIBA - Amigos de la Tierra Costa Rica, Costa Rica
9. Colectivo Ecofeminista Dafnias, Uruguay
10. Colectiva ecofeminista Mujeres, Cuerpos y Territorios, Venezuela
11. Consejo de Pueblos Wuxhtaj, Guatemala
12. Coordinadora de Organizaciones Populares del Aguan (COPA), Honduras
13. Corporate Europe Observatory, Belgica
14. Cotidiano Mujer, Uruguay
15. COPACO, Movimento camponês da República Democrática do Congo
16. Corporación Tierra Poderosa, Colombia
17. FASE, Brasil
18. Focus on the Global South, Internacional
19. Forum Carajás, Brasil
20. Friends of the Earth, Inglaterra, País de Gales, Irlanda do Norte
21. Friends of the Earth Internacional - Internacional
22. Fundación Pro Defensa de la Naturaleza y sus Derechos, Ecuador
23. GE Free New Zealand, Nova Zelandia
24. Global Justice Ecology Project, EUA
25. GRAIN, Internacional
26. Guardianes de la Andino-Amazonia, Putumayo, Colombia
27. Health of Mother Earth Foundation (HOMEF), Nigeria
28. Indigenous Perspectives, India
29. Institute of Sustainable Agriculture (ISA), Liberia
30. Jogbar United Women Empowerment and Development Organization (JUWEDO), Liberia
31. Justiça Ambiental, Moçambique
32. JVE, Costa de Marfim
33. La Red Ecuatoriana de Alternativas a la Palma Aceitera, Ecuador
34. Land Watch Thai, Tailândia
35. Margaret Prescod: Women of Color/Global Women’s Strike, EUA
36. MLT, Brasil
37. Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais – WRM, Internacional
38. Mujeres por el Bien Viver, Chile
39. Mujeres por el Bien Viver, Peru
40. Mujeres, Organización y Territorios MOOTS, México
41. Oakland Institute, EUA
42. Observatorio de Ecología Política, Venezuela
43. OLCA, Chile
44. Otros Mundos Chiapas/Amigos de la Tierra, Mexico
45. Pacto Ecosocial e Intercultural del Sur, América Latina
46. Project SEVANA South-East Asia, Internacional
47. PUSAKA, Indonesia
48. l'ONG Muyissi Environnement, Gabão
49. RADD, Camarões
50. Red Latinoamericana de Mujeres Defensoras de los Derechos Sociales y Ambientales, América Latina
51. Red Mesoamericana frente a la Palma Aceitera, Meso-America
52. Rede Alerta contra Desertos Verdes, Brasil
53. REDES-Amigos de la Tierra, Uruguay
54. REFEB, Costa de Marfim
55. Rettet den Regenwald e.V. - Rainforest Rescue, Alemanha, Salva la Selva, Espanha
56. School of Democratic Economics, Indonesia
57. SEFE, Camarões
58. SYNAPARCAM, Camarões
59. The Cornerhouse, Grã Bretanha
60. Walhi Nasional, Indonesia