A grilagem de terras no Brasil é um exemplo claro de crime organizado, de roubo de terras das mãos dos pequenos agricultores. Para compreendê-lo, é fundamental ter um olhar histórico. O WRM conversou com um membro da Comissão Pastoral da Terra (CPT) do Amapá sobre a grilagem da empresa AMCEL, com plantações certificadas pelo FSC para exportação de cavacos para a indústria de celulose e produção de energia em Dinamarca.
Uma das supostas soluções apontadas pelo governo Bolsonaro para sair da crise de desmatamento é a regularização fundiária. Mas organizações brasileiras que trabalham em defesa de pequenos agricultores e comunidades tradicionais, como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), alertam para o risco de essa regularização legalizar a chamada grilagem de terras públicas. Um exemplo emblemático de grilagem de terras na Amazônia brasileira é a empresa Amapá Celulose S/A (AMCEL).
A grilagem é a confecção ilegal de títulos de terras públicas, dando-lhes uma aparência de legalidade. A prática começou já na época da colônia, resultando no roubo das terras dos povos indígenas, e continua sendo amplamente usada até hoje pelos representantes dos interesses do grande capital, como fazendeiros, empresas do agronegócio, mineradoras, plantações de monoculturas de árvores e outros. É um mecanismo para se apropriar de terras expulsando pequenos agricultores, impedindo que eles possam usufruir de seu direito de usar a terra para reproduzir seu modo de vida. Uma das mais recentes estratégias do capital para legalizar a grilagem, principalmente na região amazônica brasileira, é o CAR (Cadastro Ambiental Rural), um mecanismo previsto no novo Código Florestal brasileiro para o registro de terras de forma digital. (1)
O resultado do processo histórico da grilagem é que hoje o Brasil tem uma das situações fundiárias mais desiguais do mundo, com 1% dos proprietários de terras concentrando quase metade de toda a área rural do país, enquanto 50% das propriedades ocupam apenas 2,3% dessa área. (2) Outro resultado da incursão dos interesses do capital no campo através da grilagem foi a expulsão, muitas vezes violenta, dos pequenos agricultores, que tiveram que se deslocar para as cidades, onde residem hoje 85% da população brasileira, enfrentando mais problemas, como o desemprego e a violência urbana. Num processo inverso, a luta do MST, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, e outras organizações fez com que o Brasil iniciasse, ainda timidamente, um processo de reforma agrária.
A grilagem no Brasil é um exemplo perfeito de crime organizado, roubo de terras e florestas das mãos dos pequenos agricultores, com a participação de um conjunto de atores que se beneficiam de alguma forma do crime. Primeiramente, instâncias de governo que, a qualquer custo, estimulam a ocupação do território para determinados projetos dispostos a violar a própria lei e, ainda por cima, dar vultosos financiamentos de seus bancos de desenvolvimento a empresas e fazendeiros. Em segundo lugar, as empresas ou fazendeiros que se apropriam das terras. Além disso, há os donos dos cartórios de terras, que produzem as escrituras fraudulentas. E também há os juízes que fazem vista grossa em relação às fraudes, muitas vezes eles mesmo donos de terras com títulos ilegais. Por último, há outros financiadores privados, como fundos de investimentos nacionais e internacionais, que investem nas atividades de empresas, e fazendeiros que fazem uso de terras griladas.
Há, ainda, mais atores que corroboram o crime, como no caso das empresas de plantações de árvores e o sistema de certificação internacional de madeira, o FSC. As empresas de consultoria que realizam a certificação têm sido verdadeiras “advogadas de defesa” das empresas que grilaram terras, declarando que a madeira vem de práticas “socialmente justas”. (3)
A Amapá Celulose (AMCEL) é uma das poucas grandes empresas de plantações de árvores localizadas na Amazônia, uma das regiões mais conflituosos em termos de grilagem de terras no Brasil. A AMCEL é uma empresa com plantações de eucalipto certificadas pelo FSC, usadas para produzir e exportar cavacos de madeira para indústrias de celulose, e também como matéria-prima na produção de energia/eletricidade na Dinamarca.
A AMCEL foi criada em 1976, por uma empresa de mineração, a CAEMI, passando depois pelas mãos da Champion e da International Paper dos EUA. Desde 2007, é controlada pelos grupos japoneses Nippon Paper Industries e NYK – Nippon Yusen Kabushiki Kaisha. (4)
O WRM conversou com o padre Sisto Magro, membro da CPT no Amapá, sobre a grilagem de terras pela AMCEL.
Pergunta: Você poderia fazer um breve histórico da ocupação das terras pelos pequenos agricultores e os problemas que têm enfrentado no estado do Amapá?
Padre Sisto: A história dos pequenos agricultores no estado do Amapá iniciou-se por via fluvial. Ocupavam as beiradas dos rios e do oceano, no chamado arquipélago de Bailique, que pega o rio amazonas, parte do oceano e igarapés. Essas populações viviam da caça, da pesca, do extrativismo de açaí, da bacaba, e da agricultura de subsistência, com destaque para a farinha de mandioca. Estes posseiros também faziam criação de gado e búfalo nas áreas alagadas. É assim que começou a história do povo agrícola do Amapá, além dos povos indígenas que já estavam neste território. Os agricultores tinham uma cultura de subsistência sem ir atrás de riquezas, não tinham cercas, e respeitavam a área do vizinho. Quando vieram as estradas, outras comunidades de pequenos agricultores foram se constituindo na beira dessas estradas.
A partir dos anos 1950, chegaram os grandes projetos na tentativa de ligar o Amapá ao resto do Brasil e do mundo. Primeiro veio o projeto de mineração chamado Icomi, e a partir dos anos 1970, o projeto da Amapá Celulose, e também um porto de exportação. Chega muita gente de fora para trabalhar nesses projetos, e chega também uma outra lógica, que quer transformar o pequeno agricultor em empreendedor, tentando introduzir uma agricultura “moderna” para “desenvolver” o estado. Isso significa tornar a cultura de subsistência desses agricultores numa cultura capitalista, de dinheiro. Essa tentativa não deu certo porque é muito diferente da cultura de subsistência e extrativismo do povo do campo.
Para entender os atuais conflitos de terras, é importante lembrar que, por volta de 1900, quando o Amapá fazia parte do estado do Pará, estado vizinho, o governo do Pará enviava coronéis, dando-lhes títulos sobre amplas áreas através de cartórios – cujo dono às vezes era o próprio coronel –, com o intuito de que eles pudessem distribuir essas terras para pecuaristas e pequenos agricultores. Essa reforma agrária não deu certo, mas resultou numa série de documentos antigos de terras de 1900, 1910, 1920, que hoje, mesmo sendo documentos caducos, são usados por latifundiários para tentar tirar as terras dos pequenos agricultores.
Agora mesmo, há uma tentativa de trazer o pessoal do Sul [do Brasil] que já tem outra visão de agricultura, do campo, de produzir riquezas para exportação, e aumentar o PIB (Produto Interno Bruto). Nosso agricultor não está preocupado em aumentar o PIB de ninguém, mas com produzir para ele comer e, no máximo, escoar a produção para o mercado de Macapá (cidade principal do estado). Ele é mais humilde, e a Amazônia requer essa humildade. E quanto mais você tenta implantar na Amazônia uma mentalidade de capital, de produção e de riqueza, mais você acaba com esse importante bioma, esse importante ecossistema. E nosso agricultor amapaense sabe muito bem disso. Agora, quem não parece entender é o grande capitalista que é entregue à cultura do dinheiro e que não é daqui.
Pergunta: Segundo consta nos relatórios de certificação FSC da empresa, (5) a AMCEL conseguiu se apropriar de quase 400 mil hectares de terras no Amapá. Cerca de 167 mil hectares são certificados, cujos títulos, segundo o FSC, foram reconhecidos pelo INCRA (órgão federal de terras, responsável pela reforma agrária). Outros 119 mil hectares não são certificados, e há ocupações “ilegais” de pequenos agricultores, segundo a empresa. Em 2005, a AMCEL teria devolvido outros 105 mil hectares ao INCRA. Qual é a visão da CPT sobre a legalidade das terras da AMCEL e do seu processo de aquisição dessas terras?
Padre Sisto: Importante dizer primeiro que o projeto da AMCEL é um projeto do próprio governo federal. Ele, na tentativa de modernizar o campo, promoveu uma distribuição de terras públicas no estado do Amapá e também em outros estados da Amazônia, simulando como se fosse uma justa distribuição de terras. No Amapá, numa área que mais interessava à AMCEL e que hoje abrange parte dos municípios de Porto Grande, Ferreira Gomes, Cutias de Araguary e Itabaul, o governo realizou uma licitação de terras onde cada empresa podia concorrer, mas num único lote. A AMCEL pertencia na época ao grupo CAEMI, uma mineradora poderosa do estado de Amapá. Foi a CAEMI que concorreu com seis firmas, algumas delas, empresas fantasmas, porque nunca se teve notícia delas aqui no Amapá. Uma das seis era a AMCEL, mas as outras não tinham nada a ver com plantações para madeira, eram todas ligadas ao setor da mineração. Todas elas concorreram e ganharam a licitação de um lote enorme, de 20 a 25 mil hectares. O contrato da licitação disse que cada empresa tinha que explorar esse lote. No entanto, imediatamente depois de conquistar as áreas, as outras empresas, sem exceção, arrendaram as mesmas para a AMCEL, apesar de que o contrato de licitação não permitia isso. Foi desta forma que a AMCEL começou seu projeto de plantações de árvores, primeiro o pinus.
Um dos elementos do contrato de licitação dizia que a empresa tinha que fazer a topografia e a demarcação da área. Todas as empresas que ganharam a licitação fizeram isso, mas cometeram outra ilegalidade: aumentaram ainda mais as áreas. Por exemplo, áreas que eram de 20 mil se tornaram 27 mil hectares depois da demarcação. Outro elemento do termo de licitação era que a empresa ganhadora teria que excluir da área a ser demarcada áreas onde tivessem moradores, pequenos agricultores. Mas essas empresas não fizeram isso. Ao contrário, a AMCEL começou a promover autênticas expulsões das pessoas que viviam nessas áreas. A maioria foi expulso no início dos anos 1980. Em alguns casos, a AMCEL indenizou o pequeno agricultor pela terra, que é algo que tampouco era permitido, porque o contrato mandava excluir essas áreas de moradores e nada mais além disso. Mas nada disso aconteceu. Depois, entre 1983 e 1985, o INCRA concedeu os títulos à AMCEL e às outras cinco empresas que ganharam a licitação, embora tivesse um monte de agricultores ali dentro das terras. Depois, as outras empresas venderam as terras para a AMCEL. Se isso está bem para a AMCEL, para mim é uma grande fraude, porque a AMCEL e as outras empresas atuaram de forma combinada; elas não obedeceram os termos de licitação.
Hoje tem poucos posseiros, porque a maioria já foi expulsa de suas terras. Mas é interessante que a AMCEL diz que na área de 167 mil hectares não tem conflito, que o conflito estaria nos outros 119 mil hectares. Mas tem conflitos, sim, na área certificada [pelo FSC] também, e que, por sinal, está na Justiça. É fácil ver no site do Tribunal de Justiça do Amapá os processos dentro das áreas que a empresa diz que são legalmente dela. Os posseiros que ainda resistem têm sido e estão sendo expulsos judicialmente porque a AMCEL mostra os títulos das empresas que ganharam a licitação e que agora é parte de um grande único título de 167 mil hectares. Vale acrescentar que no extremo norte desta área, no município de Ferreira Gomes, a empresa ainda excedeu a área do título unificado que ela conseguiu. Isso foi comprovado numa perícia do INCRA a pedido do juiz num dos processos judiciais. Mas o juiz disse que era só um “pouquinho” que ela excedeu, só que este limite tinha 28 km de extensão, então qualquer pequena mudança acaba sendo uma diferença muito grande.
Pergunta: A AMCEL afirma que houve uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das terras públicas na Câmara Federal em Brasília, em 2000/2001, que concluiu pela legalidade do processo de aquisição de terras pela empresa. Você concorda com essa afirmação?
Padre Sisto: E como é possível então que, em 2005, após outra CPI em 2004 sobre as terras públicas, mas esta vez conduzida pela Assembleia Legislativa do estado do Amapá, a AMCEL teve que devolver 105 mil hectares para a União [governo federal]? É um anacronismo gigantesco. Essa CPI de 2004 quase teve um grileiro de terras como relator, que mais tarde foi processado e condenado por grilagem. Mas felizmente, foi possível nomear outro deputado, Ruy Schmidt, sem envolvimento com a grilagem de terras. Essa CPI teve uma participação fundamental da CPT e conseguiu revelar todo o processo ilegal, de grilagem de terras, da AMCEL. Temos toda esta documentação guardada, e como resultado, a AMCEL teve que abrir mão de 105 mil hectares do outro lado do Rio Araguari. Esses 105 mil hectares, na verdade, não tinham nem um único documento, nem um único título das terras! Eram apenas documentos de posse, recibos de compra e venda, um documento fundiário qualquer.
Ainda em relação à situação fundiária da AMCEL, ela tem uma área relativamente pequena com títulos definitivos, terras compradas de pessoas que tinham esses títulos, e são títulos de conhecimento do INCRA e que não podem ser questionados. O restante, porém, são terras que resultam de outro processo criminoso: a chamada grilagem cartorial. Foram tabeliões da comarca do Amapá, e também do município de Tartarugalzinho. Esses dois cartórios acabaram dando escrituras públicas, registradas em cartório, de áreas que na verdade são terras públicas que o INCRA nunca titulou, nunca vendeu e nunca chegou a fazer a regularização fundiária delas. Se você vai ao INCRA e eles vão olhar o mapa deles sobre essas áreas, eles vão dizer que essas áreas são deles, que ainda pertencem à União (governo federal). Por isso, são áreas cuja suposta legalidade, como afirma a AMCEL, nós da CPT contestamos. São áreas matriculadas, mas de forma irregular, ilegal, e são, ao todo, mais de 100 mil hectares. São terras que deveriam também ser devolvidas para a União. Um desembargador e um corregedor da Justiça pediram, já em 2003, aos cartórios no Amapá para corrigir estes registros fraudulentos, inclusive nos cartórios que fizeram essas matrículas das terras da AMCEL. Mas nada aconteceu depois, e os juízes do caso argumentam que a Advocacia Geral da União (AGU) tem que instaurar uma ação judicial para recuperar essas áreas para poder criar assentamentos de reforma agrária, mas a AGU não faz isso. Hoje, uma tática da AMCEL para se desfazer dessas áreas é negociar esses títulos ilegais com o agronegócio da soja.
Pergunta: Quem financiou a AMCEL, mesmo com toda essa grilagem de terras?
Padre Sisto: O FNO (Fundo Constitucional de Financiamento do Norte), dinheiro público brasileiro, financiou boa parte das plantações da AMCEL. É dinheiro que também deveria financiar pequenos agricultores, mas eles não têm acesso porque não têm condições de formular e apresentar o projeto. É a AMCEL e outras empresas e fazendeiros ligados ao agronegócio da soja, por exemplo, que fazem projetos e pegam a grana.
Pergunta: A empresa afirma que estaria “engajada” em resolver os conflitos com os pequenos agricultores através de “diálogo”. Como avalia a relação da empresa com os posseiros?
Padre Sisto: Essa relação não é respeitosa porque ela derruba as casas dos posseiros. Ano passado ela derrubou cinco casas no município de Ferreira Gomes; este ano, ela derrubou uma casa no município de Tartarugalzinho, inclusive com proteção do juiz daquela comarca, porque ela ganhou uma causa contra um pequeno posseiro. Só que essa casa fica no meio do mato. O que a AMCEL fez? O oficial da justiça foi lá, a AMCEL disse que é essa a casa, e o oficial da justiça mandou derrubar a casa do irmão desse posseiro que fica na beira da estrada e o que nem fazia parte do processo! Parece indicar que ela quer ampliar ainda mais sua área, até porque ela perdeu várias causas contra posseiros. Pergunto: por que a AMCEL tem 167 mil hectares, e mesmo perdendo várias causas na justiça, ela continua com os 167 mil hectares? Ou seja, ela provavelmente está querendo recuperar as áreas que ela perdeu legalmente na justiça. E o juiz de Tartarugalzinho, diante do pedido do agricultor de ressarcimento da sua posse, em vez de pedir à AMCEL para reconstruir imediatamente a casa, disse que vai correr um processo e que a primeira audiência será só no ano que vem. Perante isso, o agricultor já se sente intimidado de reconstruir sua própria casa porque a empresa já derrubou uma vez, e ele fica com medo que o juiz vai mandar derrubar de novo.
Pergunta: Mesmo que alguns posseiros tenham ganhado na justiça, na maioria das vezes, a AMCEL saiu vitoriosa. Podemos esperar justiça do poder judiciário no Amapá?
Padre Sisto: Não, por exemplo, as cinco casas que foram derrubadas no município de Ferreira Gomes, o próprio juiz foi acompanhar a derrubada das casas. Segundo o relato dos moradores que estavam lá, ele disse “quero ver essas casas no chão”. O juiz de Tartarugalzinho é pior ainda. Ele, perante uma derrubada de casas de forma irregular, além de não reconhecer o próprio erro, ainda passou por cima dizendo que em fevereiro/março [de 2021] vamos conversar sobre isso. Mas já deixou entendido para a AMCEL que não vai acontecer absolutamente nada. Esse juiz, ele mesmo ocupa uma terra pública. Com juízes do estado, aos quais a AMCEL sempre recorre para expulsar os posseiros, muito dificilmente vai ter uma decisão favorável aos pequenos agricultores.
Pergunta: Qual é o caminho que a CPT – que atua numa perspectiva de justiça social – aponta para resolver o conflito fundiário criado pela AMCEL a partir da década de 1970? E qual é a sua mensagem para o povo da Dinamarca, para onde a AMCEL manda cavacos de madeira certificada pelo FSC?
Padre Sisto: No caso, a Justiça Federal deveria entrar no meio e dizer para os juízes deste estado – o Amapá – para não dar mais decisão nenhuma. A Justiça Federal entrar é diferente porque ela tende muito mais a avaliar o domínio da área e se se trata de uma área da AMCEL ou não. Ela vai avaliar os títulos de terra, se se trata de uma terra pública e, caso seja, mesmo sendo apenas um milímetro de terra pública, a AMCEL vai ter que devolver essa terra grilada. Os juízes do estado, ao contrário, tendem a querer afirmar que as terras são do estado de Amapá e não da União. Vários juízes do estado inclusive participam do projeto do agronegócio. Alguns deles já fizeram programas no rádio junto com representantes do agronegócio. Tem também juízes federais que gostam do agronegócio, mas as decisões deles tendem a ser mais equilibradas. É por isso que a AMCEL sempre procura a justiça estadual, nunca a justiça federal.
Há agora um processo complicado em curso no Amapá, de transferência das terras da União para o estado, e o estado do Amapá quer fazer a regularização das terras para dar ao agronegócio, não aos pequenos agricultores. Ao mesmo tempo, o governo Bolsonaro não libera um centavo para o INCRA, exatamente para não fazer nada. Vivemos um momento muito difícil, em que não tem vontade política para fazer uma regularização fundiária em benefício do pequeno agricultor.
Eu diria para os dinamarqueses que está na hora deles plantarem as árvores lá na Dinamarca e eles colherem essas árvores, em vez de colhê-las aqui. Aqui já estamos num processo de desmatamento e devastação e destruição gravíssimo promovido pelo governo Bolsonaro. É aí que ele se fortalece, quando ele pode dizer que estamos mandando madeira para Dinamarca porque eles estão nos pedindo. Enquanto isso, ele está tocando fogo, incentivando a queima e a destruição da floresta para dar espaço ao boi, à soja, ao agronegócio. E a madeira pode ser uma boa desculpa para ele poder fazer isso. Está mais do que na hora de os próprios países da Europa plantarem a madeira que eles já destruíram no passado, replantar [na Europa], e eles utilizarem a madeira deles e não a madeira da Amazônia, que permite que mais pessoas sejam expulsas e mais crimes ambientais sejam cometidos.
(1) GRAIN, Legalização do grande roubo de terras públicas no Brasil: agronegócio, desmatamento e o caldeirão de futuras pandemias, abril de 2020
(2) OXFAM Brasil, Terras e desigualdade
(3) Boletim 240 do WRM, FSC e RSPO parceiros no crime? A questão fundiária da Jari Florestal e da Agropalma na Amazônia brasileira, 2018
(4) AMCEL - Amapá Florestal e Celulose S.A
(5) Amcel, Relatório de avaliação para certificação de manejo florestal e cadeia de custódia desde a floresta até a saída do produto