No Equador, as florestas de Esmeraldas fazem parte do último remanescente de florestas tropicais do litoral do Pacífico na América. Essas florestas fazem parte da região biogeográfica do Chocó, um dos dez "pontos de aquecimento" do planeta, que vai do sul do Panamá até o norte de Esmeraldas. Nessa área, existem cerca de 10 mil espécies de plantas, sendo que aproximadamente 2.500 são endêmicas. Esse é o lar das nações Awá, Chachi e Tsachila, bem como de comunidades afro-equatorianas que conservam formas de vida tradicionais.
Não obstante, essas florestas estão sendo destruídas num ritmo impressionante, devido ao desmatamento provocado pela monocultura do dendezeiro e a indústria madeireira, a qual, até hoje, conta com a cumplicidade do governo nacional.
No dia 8 de agosto de 2002, o Presidente equatoriano Gustavo Noboa promulgou o decreto executivo 2691, elaborado em parceria pelos ministérios do Ambiente, da Agricultura e de Relações Exteriores. Esse decreto destina para uso agrícola um polígono de 50 mil hectares, no Cantão São Lourenço, na província de Esmeraldas. Do total dessa área, 5 mil hectares são Patrimônio Florestal do Estado equatoriano, mais de 5 mil hectares são terras ancestrais afro-americanas, e mais de mil hectares são terras dos índios Awá. Constitucional e legalmente, as terras comunitárias são indivisíveis e intransferíveis. O objetivo não declarado desse decreto é legitimar a expropriação sistemática de terras ancestrais e do Patrimônio Florestal do Estado, praticada há alguns anos pelas empresas palmicultoras no norte de Esmeraldas. As palmicultoras têm tirado a terra das comunidades através de compras ilegais e deslocamentos compulsórios das famílias ancestrais. Esse decreto é dedicado especialmente aos empresários palmicultores, entre os quais há parentes do Presidente em fim de mandato Gustavo Noboa Bejarano.
No contexto dessa política de espoliação, está sendo aproveitada a conjuntura gerada pelo Plano Colômbia na fronteira norte do país. Para mitigar os efeitos do conflito, foi criada a Unidade de Desenvolvimento do Norte (UDENOR), com recursos para apoiar as comunidades localizadas perto da fronteira com a Colômbia. Porém, esses recursos estão sendo usurpados pelos próprios empresários palmicultores, acobertados pelo mencionado decreto, não chegando às mãos das comunidades atingidas.
A constitucionalidade do decreto foi questionada pela CONAIE, a Ação Ecológica e outras organizações locais e ambientais, através da abertura de um processo por inconstitucionalidade perante o Tribunal Constitucional.
Por outro lado, o Ministério do Ambiente não está cumprindo a sua obrigação de monitorar o processo de desmatamento no Patrimônio Florestal do Estado e a concessão ilegal dessas terras, por parte do INDA (Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário), às empresas madeireiras ENDESA e BOTROSA, parte do Grupo Peña Durini, um dos mais poderosos do país. Durante investigações na fazenda Pambilar, no Bloco 10 do Patrimônio Florestal do Estado (uma das muitas fazendas questionadas), realizadas pelo Ministério do Ambiente no ano 2000, foi constatado e comprovado que os 2.800 hectares da fazenda em questão tinham sido ilegalmente entregues pelo INDA à empresa BOTROSA. A partir desse caso, a Comissão de Controle Cívico da Corrupção demonstrou que pelo menos mais 18 mil hectares de floresta tinham sido ilegalmente outorgados. O relatório da Comissão de Controle Cívico da Corrupção resultou na intervenção da Vedoria Geral do Estado, que, em julho de 2002, iniciou uma investigação especial no Ministério do Ambiente e no INDA, para identificar o estado das concessões das propriedades localizadas no Patrimônio Florestal e estabelecer as responsabilidades administrativas civis e indícios de responsabilidade penal tanto dos funcionários quanto dos atores diretamente envolvidos.
Nesse processo todo, a ministra do Ambiente, Lourdes Luque, parente, também, do Presidente Noboa, deixa rolar e age em ritmo de tartaruga, beneficiando, assim, as empresas palmicultoras e madeireiras.
Em outubro de 2002, o Tribunal Constitucional emitiu uma sentença a favor de um amparo constitucional apresentado por camponeses da região, desapossados de suas terras, exigindo a punição dos funcionários envolvidos nessas concessões ilegais, bem como a devolução das terras e indenização dos atingidos pelas empresas madeireiras ENDESA e BOTROSA.
A floresta tropical equatoriana, albergue de uma enorme diversidade cultural e biológica, está prestes a sumir. Nesse processo, não cabe apelar para o conceito de exploração florestal certificada, como pretendem as empresas madeireiras ENDESA e BOTROSA, que apresentaram perante a SMARTWOOD e o FSC um pedido de certificação de sua exploração. Também não cabe achar que plantações ou projetos de reflorestamento podem substituir a floresta primária original.
Nesse cenário, o novo governo do Coronel Lucio Gutiérrez enfrenta um grande desafio para conservar o pouco que ainda resta da floresta primária. Talvez, a única coisa que possa salvar a floresta seja a declaração de uma moratória indeterminada da exploração comercial da floresta.
Por: Ivonne Ramos, Ação Ecológica, correio eletrônico: creativo@uio.satnet.net